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CARTAS PSICOGRAFADAS NO TRIBUNAL DO JÚRI

Por:   •  15/5/2018  •  Artigo  •  5.402 Palavras (22 Páginas)  •  306 Visualizações

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A (I) LEGITIMIDADE DO USO DAS CARTAS PSICOGRAFADAS COMO MEIO DE PROVA NOS PROCESSOS DO TRIBUNAL DO JÚRI

CAMBRUSSI, Paulo Anacléto.[1]

FEISTLER, Ricardo Pinto.[2]

RESUMO

O presente artigo dedica-se a discussão acerca da (i) legitimidade do uso das cartas psicografadas como meio de prova nos processos do tribunal do júri, tendo em vista que com a propagação da doutrina espírita no Brasil, as cartas psicografadas ficaram vastamente conhecidas, especialmente através do médium e filantropo Francisco Cândido Xavier, mais conhecido como Chico Xavier, que difundiu as histórias, em tese, vindas do além. Como consequência, no âmbito do Direito Processual Penal, as cartas psicografadas passaram a ser utilizadas como meio de prova nos crimes dolosos contra a vida, razão pela qual tem gerado controvérsias no mundo jurídico, indagando se a utilização das cartas psicografadas encontra respaldo legal, bem como se as garantias constitucionais não estão sendo violadas, haja vista vivermos em um estado democrático de direito, onde se deve preservar o tratamento igualitário entre as religiões, a fim de que uma crença não seja privilegiada em detrimento de outra, assegurando a garantia do contraditório, da plenitude de defesa e o da igualdade das partes nos processos judiciais.

PALAVRAS-CHAVE: Tribunal do Júri, Cartas Psicografadas, Plenitude de Defesa.

THE (IL) LEGITIMACY OF THE USE OF PSYCHOGRAPHIC LETTER AS A MEANS OF PROOF IN JURY COURT PROCEEDINGS

ABSTRACT:

This article deals with the (il) legitimacy of the use of psychographic letters as a means of proof in jury court proceedings, given that with the propagation of the spiritist doctrine in Brazil, the psychographical letters became widely known, especially through the medium and philanthropist Francisco Cândido Xavier, better known as Chico Xavier, who spread the stories, in theory, from the beyond. As a consequence, in the scope of Criminal Procedural Law, psychographical letters have been used as evidence in intentional crimes against life, which is why it has generated controversies in the juridical world, asking whether the use of psychographed letters finds legal support, as well as If constitutional guarantees are not being violated, given that we live in a democratic state of law, where equal treatment between religions must be preserved, so that one belief is not privileged to the detriment of another, ensuring the guarantee of the adversary, Fullness of defense and equality of the parties to judicial proceedings.

KEYWORDS: Jury Court, Psychographic Letters, Fullness of Defense.

1. INTRODUÇÃO

A população que professa a fé espírita no Brasil tem aumentado consideravelmente, de acordo com o Censo 2010, realizado pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), o espiritismo foi uma das religiões que apresentou maior crescimento, cerca de 65% (sessenta e cinco por cento) em relação ao Censo 2000, passando de 1,3% (um vírgula três por cento) da população para 2% (dois por cento), o que equivale a 3,8 (três vírgula oito) milhões de pessoas (IBGE, 2010).

Contudo, não é somente nas estatísticas sociais que o espiritismo tem se destacado. Nos últimos anos, o espiritismo vem tendo grande visibilidade também no âmbito do Direito Processual Penal. São vários os casos em que as cartas, supostamente, psicografadas por vítimas de crimes dolosos contra a vida, foram aceitas como meio de prova, auxiliando na defesa dos acusados.

Um caso recente é o julgamento do réu Juarez Guide Veiga e sua companheira, acusados de serem os autores do homicídio de João Euripedes Rosa em junho de 1992. Na data de 20 de março de 2014, os réus foram absolvidos do crime de homicídio pelo Tribunal do Júri de Uberaba/MG, com o auxílio de uma carta psicografada pela vítima, a qual atesta que quem deu motivo para o crime foi a própria vítima, por ódio, ciúmes e ignorância. O próprio membro do Ministério Público reconheceu a tese defensiva e pleiteou a absolvição do acusado (GLOBO, 2014).

Por conta disso, este trabalho tem a finalidade de analisar, tecnicamente, a problemática da inserção de cartas psicografadas no âmbito jurídico, verificando se são legítimas para serem utilizadas nos casos penais ou se são proibidas pela legislação.

2. REFERENCIAL TEÓRICO/DESENVOLVIMENTO

2.1. O ESPIRITISMO

A doutrina espírita assegura a comunicação entre pessoas vivas (espíritos encarnados) e as pessoas mortas (espíritos desencarnados), através da técnica conhecida como mediunidade. Assim, os espíritos desencarnados teriam o poder de agir sobre nós, os encarnados, sendo que essa ação é quase restrita ao pensamento, de modo a transmitir a comunicação, seja por meio da psicofania (fala), da psicografia (escrita) e da tiptologia (batidas) (LAURENTI, s. a.).

O espiritismo surgiu no século XIX, por volta do ano de 1850, sendo que suas raízes encontram-se nos princípios do cristianismo, doutrina implantada por Jesus e seus seguidores, há quase dois mil anos (KARDEC, 2008).

No Brasil, foi através do médium e filantropo Chico Xavier que o espiritismo consolidou seus dogmas, mais especificamente por meio de seus livros psicografados. Todavia, a divulgação e o crescimento da doutrina espírita no Brasil não se ativeram apenas ao âmbito religioso, eis que a técnica mediúnica passou a ser utilizada, não raras vezes, no âmbito jurídico-penal, principalmente pela defesa, a fim de motivar a decisão do conselho de sentença nos julgamentos dos processos do tribunal do júri, julgamentos estes que ficaram marcados na história do Direito Processual Penal Brasileiro, conforme demonstrado no tópico seguinte.

Para Allan Kardec:

A ciência espírita progrediu, como todas as outras ciências, e até mais rapidamente. Pois apenas alguns anos nos separam desses meios primitivos e incompletos que, trivialmente eram chamados mesas falantes e já temos a possibilidade de nos comunicarmos com os espíritos tão fácil e rapidamente quanto os homens entre si. E isto por dois meios: a escrita e a palavra. A escrita, sobretudo, tem a vantagem de acusar de um modo mais material a intervenção de uma força oculta e de deixar traços que podem ser conservados, como fazemos com a nossa própria correspondência (2008, p. 132).

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