TrabalhosGratuitos.com - Trabalhos, Monografias, Artigos, Exames, Resumos de livros, Dissertações
Pesquisar

O PRECEDENTE VINCULANTE NA COMMON LAW NORTE AMERICANA

Por:   •  29/3/2021  •  Seminário  •  1.815 Palavras (8 Páginas)  •  235 Visualizações

Página 1 de 8

O PRECEDENTE VINCULANTE NA COMMON LAW NORTE AMERICANA

Matheus Martins Alves Pereira

Thales Duarte Souza Lucena

Com o CPC de 2015 e a criação de um “micro sistema de precedentes”, como chamado por alguns autores na doutrina, o sistema civil law brasileiro importou algumas técnicas do sistema common law. O novo código de processo avançou significativamente em um caminho que a legislação processual vinha percorrendo timidamente há vários anos. Fato é que estas mudanças são realidade, portanto precisamos nos adaptar e tirar o melhor proveito da técnica de precedentes vinculantes da common law. Ademais, este fenômeno ocorre em diversos países da civil law e em casos como na Suécia já existe um sistema híbrido.

A proposta deste trabalho é levantar os fundamentos dos precedentes vinculantes na common law, a fim de viabilizar ao leitor a interpretação e aplicação da técnica importada. Dos diversos países que adotam o sistema da common law, neste trabalho será usado como paradigma o sistema dos Estados Unidos.

Na cultura jurídica dos Estados Unidos quando uma Corte Recursal, estadual ou federal, em um julgamento colegiado, decide um caso concreto é estabelecido um precedente. Desde ponto em diante a Corte e os juízes daquela circunscrição aplicarão aquele precedente aos casos futuros em que os fatos relevantes sejam semelhantes. A vinculação criada pelo precedente da Corte é chamada de doutrina do Stare decisis.

No sistema common law norte americano a vinculação está ligada ao precedente. Basta um único julgado para vincular todas as demais futuras decisões. Quanto à jurisprudência, esta tem função de lapidar o precedente, ajuda a entendê-lo melhor e coloca limites para seu alcance como veremos adiante. A doutrina do Stare decisis preconiza que casos iguais devem ser decididos da mesma maneira. A expressão vem da frase em latim “stare decisis et non quieta movere”, que significa: “deixar quieto o que já foi decidido e não alterá-lo”. Este princípio compõe natureza da vinculação dos juízes ao precedente criado pela Corte a qual estão subordinados ou da qual fazem parte. O sistema se fundamenta na noção básica de justiça de que casos iguais devem receber o mesmo tratamento e casos diferentes, tratamento diferente.

Para a aplicação do precedente é fundamental que se extraia da decisão a regra aplicada ao caso e que será repetida nos casos futuros. A seguir serão analisados os princípios essenciais para extração de uma norma do precedente a ser aplicada em casos futuros. Para tanto, imagine-se que certo dia o gerente de um shopping center que se deparou com um incidente. O cachorro de um cliente comeu o lanche e derrubou o prato e bebida de outro cliente na praça de alimentação. Diante do fato, o gerente instruiu os seguranças que dali em diante que era proibido a entrada de cachorros na praça de alimentação. Dias depois, veio uma cliente com um gato na praça de alimentação. Os seguranças, na tentativa de evitar um novo incidente, impediram-na de permanecer ali, ainda que não se tratasse exatamente de um cachorro, o que foi avalizado pelo gerente. Em outro momento entrou no shopping um cego utilizando um cão guia e após conversar com o gerente foi liberado para usar a praça de alimentação junto com seu cachorro. Para explicar a situação aos seguranças o gerente afirmou que aquele tipo de cachorro recebe um treinamento especial e que o direito de locomoção do cego, neste caso, deveria prevalecer sobre a regra do estabelecimento.

A norma extraída do caso concreto é chamada de holding ou ratio decidendi. Essa questão é uma das mais importantes para se entender o funcionamento de um sistema common law, afinal é a compreensão e delimitação do holding que vai determinar os rumos do direito naquela matéria. Uma das técnicas mais simples para verificar se determinada questão é essencial a solução do caso compõe-se do seguinte exercício: inicialmente, inverte-se o significado da referida questão. Caso a inversão enseje a alteração do resultado do julgamento trata-se de um ponto essencial a solução do caso. Do contrário, trata-se um uma questão marginal e por consequência não vinculante.

No common law o magistrado deve preocupar-se em trazer justiça para o caso presente, contudo, deve ainda utilizar uma argumentação capaz de ser aplicada a casos futuros. Há um senso de que se a mesma lógica da decisão atual não puder ser aplicada a casos futuros esta não pode ser considerada uma decisão justa. A fim de evitar decisões arbitrárias a common law credita menos valor às singularidades de cada caso e mais valor a isonomia e coerência. De fato, no sistema civil law brasileiro experimentamos o oposto, com diversas decisões do STF reiterando que aquela argumentação é estrita àquele caso, de que se trata de um caso único ou de uma exceção. Tal disposição não faria o menor sentido para um jurista norte americano principalmente quando pronunciada por uma suprema corte.

Uma das hipóteses para não aplicar determinado precedente a um caso é o uso do distinguishing. Tenta-se mostrar que os fatos em análise são diferentes dos fatos do precedente e por isso deve ser aplicado outro precedente ou outra lei. Não é qualquer fato ou detalhe que autoriza a aplicação do distinguishing. Apenas fatos relevantes e centrais para a decisão são capazes de afastar um precedente.

É importante destacar que um precedente, geralmente, é lapidado por casos futuros com fatos semelhantes. Estes novos casos acabam por ampliar ou restringir o alcance do holding. Por mais clara e determinada que uma regra seja, ela pode se revelar restritiva demais. De volta ao exemplo, seria razoável que a proibição de cachorros no estabelecimento se estendesse também a gatos e demais animais de estimação. Restringir o precedente apenas a cachorros e não aos demais animais seria uma afronta aos motivos centrais da decisão. Fica claro que se a regra fosse aplicada de modo restritivo perderia sua força argumentativa, justamente por lhe faltar coerência com seus fundamentos basilares.

De modo contrário, há situações em que a ampliação do alcance do precedente produz um confronto do holding com sua finalidade. É a hipótese de aplicar a proibição de animais para animais de pelúcia. Quando a abrangência do termo “animais” alcança animais de pelúcia, toda a argumentação de garantir a higiene e o conforto na praça de alimentação do shopping perde o sentido. Então, neste tipo de situação, o distinguishing deve ser usado e o alcance do precedente deve ser reduzido sob pena da regra se tornar incoerente com seu fundamento e, consequentemente, injusta.

Ademais,

...

Baixar como (para membros premium)  txt (11.6 Kb)   pdf (54.6 Kb)   docx (11.9 Kb)  
Continuar por mais 7 páginas »
Disponível apenas no TrabalhosGratuitos.com