Resenha Artigo Ativismo Jurisdicional e o Supremo Tribunal Federal” de Vanice do Valle
Por: Rafaela196t • 16/6/2023 • Resenha • 2.017 Palavras (9 Páginas) • 100 Visualizações
Uma perspectiva hodierna de “Ativismo Jurisdicional e o Supremo Tribunal Federal” de Vanice do Valle
O livro “Ativismo Jurisdicional e o Supremo Tribunal Federal” é a continuação de um projeto de pesquisa publicado em 2009 e republicado em 2012 pela editora Juruá, de coordenação de Vanice Lírio do Valle, jurista brasileira experiente no Direito público, sobretudo, acerca de direitos fundamentais e jurisdição constitucional, professora da Universidade Estácio de Sá, Doutora em Direito Pela Universidade Gama Filho, Mestra em Direito Pela Universidade Estácio de Sá. Juntamente com uma equipe de sete profissionais do direito, dentre eles dois doutorandos, três doutores, um mestre e um revisor, pós-graduandos em direito, membros do Laboratório de Análise Jurisprudencial (LAJ) do Rio de Janeiro.
O objetivo do grupo era analisar o desenvolvimento e expansão da jurisdição constitucional, a partir da verificação da atuação do Supremo Tribunal Federal (STF), dando ênfase ao período pós Emenda nº 45 - a Reforma do Judiciário - de 08 de dezembro de 2004, juntamente ao início do governo Lula, de 2002 a 2006, ainda na primeira década do século XXI, quando houve a troca de Ministros da instância máxima do judiciário, em decorrência da aposentadoria dos anteriores. As novas vagas foram preenchidas por nomeação do, até então, presidente Luiz Inácio Lula da Silva, como estabelece o parágrafo único do Art. 101 da Constituição Federal. Segundo o livro, para a escolha foram considerados critérios ideológicos, de raça e de gênero, fundamentais para uma Justiça equitativa.
A obra é composta por 152 páginas, seccionadas em introdução, 4 capítulos e conclusão, contudo, a referente resenha crítica se limitará a analisar apenas a introdução e o primeiro capítulo, dispostos entre a página 15 até a 39, os quais discorrem acerca do ativismo judicial, sua conceituação, raízes na Common Law e desdobramentos na Civil Law, a partir de uma perspectiva histórica do Direito europeu e estadunidense, até alcançar a realidade brasileira.
Em síntese, a primeira perspectiva abordada é sobre o campo semântico da palavra “ativismo”, construída a partir do Direito Norte-americano. Pois afinal, o que é “ativismo judicial”? Cita-se a definição de dois dicionários jurídicos, o “Dictionary of Law” e o “Black’s Law Dictionary”, o primeiro define como um compromisso de expansão dos direitos fundamentais, já o segundo como um mecanismo de utilização de valores pessoais em decisões judiciais. Historicamente, a primeira menção da expressão ocorreu em uma revista estadunidense, quando o jornalista Arthur Schlesinger Jr publicou o artigo “The Supreme Court: 1947” e identificou e classificou a atuação de cada juiz da Suprema Corte Norte-americana da época, dentre eles, os “ativistas judiciais”.
A partir de então, a expressão tornou-se popular e tomou forma de crítica para alguns juristas conservadores, que defendem a correta leitura do texto constitucional. No sistema jurídico utilizado nos Estado Unidos da Common Law, a base doutrinária está na “stare decisis”, do latim "stare decisis et non quieta movere", ou seja, “mantenha-se a decisão e não ofenda o que foi decidido”. Assim, as decisões da Suprema Corte devem ser seguidas e usadas como parâmetro para as instâncias jurídicas inferiores, como também, para futuros casos semelhantes. Quando há desvios à regra, infringindo as decisões emanadas pela corte superior e partilhadas por toda comunidade de interpretes, a hierarquização judicial não é respeitada na Common Law, logo, há ativismo judicial.
Nesse debate acerca do constitucionalismo estadunidense e a Common Law, o livro destaca a postura de dois ex-juízes da Suprema Corte americana, porém, na época da publicação ainda eram membros, são eles Antonin Scalia, defensor do “originalismo” e da interpretação literal e “correta” da Constituição, sob a mesma ótica utilizada desde a sua criação, como também Stephen Breyer, que defende que a Constituição dos EUA é viva, assim como a sociedade, principalmente quando há ambuiguidade de interpretação e desconexões com a atual realidade social.
No sistema de Common Law é mais comum que haja a presença de ativismo, uma vez que, é estruturado por uma Constituição sintética (mais concisa e reduzida), consequentemente, torna-se mais flexível, por não abarcar tantos tópicos sociais. Enquanto isso, na esfera da Civil Law, mesmo com Constituições analíticas (extensas, com muitas normas e limitações), o ativismo judicial vem ganhando destaque, sobretudo, fortemente influenciado pela corrente neoconstitucionalista e as novas técnicas de interpretação constitucional: ponderação, proporcionalidade, razoabilidade, além do uso de cláusulas gerais e o reconhecimento de princípios como normas constitucionais. Todos esses fatores acarretam ao que o texto chama de “juízes legisladores”, ou seja, juízes que detém poder superior ao de sua função de solucionar conflitos revelando o sentido implícito do texto legal, exercendo também, a função de resolver conflitos criando “novas normas”.
Após as concepções Norte-americanas, a professora Vanice aborda uma visão do direito europeu, através de uma passagem mais breve, para demonstrar que o fenômeno do ativismo ultrapassa as fronteiras estadunidenses. Destaca países como a Alemanha (um dos países que melhor relaciona a dualidade entre ativismo e o regimento constitucional), a Itália (onde destaca-se a doutrina do “diritto vivente”, em português o “direito vivo”, uma concepção consolidada de uma norma especifica, que delimita o ativismo) e a Espanha (onde o ativismo consegue ter papel fundamental e decisório, devido à baixa densidade normativa do direito).
Um dos importantes autores mencionados no livro é Ran Hirschl, um cientista político canadense, o qual tem empenhado esforços em acrescentar importantes contribuições aos estudos sobre o fenômeno de ascensão da jurisdição constitucional. Ele postulou três problemáticas decorrentes de tal fenômeno: a primeira envolve a transferência de poderes do legislativo ao judiciário, já a segunda sobre a inevitável inclinação e favorecimento a determinados grupos sociais perante aos outros, enquanto na terceira, Hirschl expõe que os agentes políticos, econômicos e jurídicos tendem a agir estrategicamente a apoiar a consolidação de estruturas institucionais que beneficiarão seus próprios interesses particulares ou corporativos.
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