Chesnais - A “nova economia”: uma conjuntura própria à potência econômica estadunidense
Por: Isabella Vieira • 24/9/2019 • Resenha • 3.350 Palavras (14 Páginas) • 163 Visualizações
3.3 - Chesnais
A “nova economia”: uma conjuntura própria à potência econômica estadunidense CHESNAIS (2003)
O termo “nova economia” foi inventado nos EUA e se refere somente a ele (por estudos da OCDE), mas sua definição de fato é muito pouco precisa. Este foi criado no momento em que as cotações de Wall Street estavam associadas a uma “exuberância irracional”. Isso se dava principalmente devido à aceleração da difusão de tecnologias de informação e comunicação (TI). E também à retomada do crescimento da produtividade do trabalho, bem como da produtividade total dos fatores.
Assim, alguns definem a nova economia como um “termo utilizado para designar um setor efervescente, que relacionado às indústrias de TI geram uma nova maneira de apreender a economia em seu conjunto”. Os mesmos estudos da OCDE permitem dizer que a nova economia poderia anunciar um crescimento tendencial mais forte, uma vez que as TI promovem modos de gestão mais eficazes das empresas e um crescimento mais forte da produtividade multifatorial. Ela poderia ter modificado o ciclo econômico. A única certeza que a OCDE tem é que ela modificou os setores que promovem crescimento, gerando uma interpretação tranquilizadora sobre a situação econômica dos EUA.
Este artigo parte das mudanças estruturais maiores da economia capitalista mundial, das duas décadas anteriores a ele escrito, e o Chesnais procurou entender utilizando-se da noção de regime de acumulação com dominância financeira, a situação norte-americana. Algumas dessas mudanças, principalmente o lugar dominante que os mercados e operadores financeiros adquiriram, são caracterizadas por uma grande fragilidade sistêmica e são, portanto, reversíveis. Elas tem como ponto de partida e como base principal o países capitalistas avançados.
Outro termo importante para a discussão é o da globalização, que exige que a economia mundial seja apreendida, de acordo com Trotsky, “não como uma mera adição de suas unidades nacionais, mas como uma poderosa realidade independente criada pela divisão do trabalho e pelo mercado mundial que domina todos os mercados mundiais”.
Regime de Acumulação com Dominância Financeira
O “regime de acumulação com dominância financeira” designa, em uma relação estreita com a mundialização do capital, uma etapa particular do estágio do imperialismo, compreendido como a dominação interna e internacional do capital financeiro. A hipótese de regime de acumulação submetido a uma finança que se poderia construir como uma potência econômica e social “autônoma”, frente à classe operária, como também a todas as outras frações do capital, foi vislumbrada por Marx.
Esta dominação já assumiu várias configurações sob o efeito conjunto de mudanças nas relações entre os estados e as frações do capital e nas relações políticas entre capital e trabalho. Recorrer à noção de abre “regimes de acumulação” significa reconhecer que, no contexto de diferentes tipos de relações políticas entre o capital e o trabalho, as burguesias dedicaram-se a buscar diferentes maneiras de estabilizar o movimento de reprodução e de valorização do capital e, portanto, de assentar sua dominação. Incorporar as mudanças institucionais e políticas dos governos e dos bancos centrais à análise do movimento do capital permite melhor apreender suas forças e fraquezas, bem como situar os pontos de emergência e as contradições.
O termo “regime de acumulação” é preferível a “regime de crescimento” por duas razões: 1) porque o primeiro termo remete explicitamente a noção “capital”. Este é compreendido como valor (massa de dinheiro) que busca crescer por intermédio de um processo de valorização. 2) porque o termo exprime a possibilidade teórica da existência de configurações político-econômicas nas quais a importância assumida pela forma D.. D’, e pela formação de importantes camadas sociais que dependem de retiradas financeiras.
No centro do regime de acumulação, que tenta impor-se mundialmente, situam-se as novas formas de concentração do capital-dinheiro, os mecanismos de captação e de centralização de frações de valor e de mais-valia a sua disposição e, enfim, as instituições que garantem segurança política, mas também financeira, das operações de investimento financeiro. Isso tudo permite à finança desfrutar daquilo que designa com o termo “autonomia da finança”, com imenso poder social que essa autonomia lhe confere.
A primeira fase do “poder da finança” foi “ditatura dos credores”, que foi fruto de uma forma de golpe de estado, decorrente do aumento da taxa de juros reais sobre o bônus do tesouro dos EUA nos anos 1980. Este passo foi decisivo rumo à reconstituição do poder da finança concentrada, que tinha sido paralisada nos EUA a partir do New Deal. Este poder se manifesta frente aos outros governos resultando numa capacidade de modificar a repartição de renda e de influenciar o ritmo e a orientação do investimento em todos os países em que o setor público é importante.
Os investidores financeiros receberam como presente dos governos, a começar pelos dos EUA, um recurso importante para o financiamento dos déficits orçamentários. O sistema lhes ofereceu taxas de juros elevadas e uma grande segurança de rendas relacionada aos empréstimos. Recursos financeiros imensos permaneceram reféns da finança e conduziram à acumulação de ativos financeiros muito elevados pelas instituições financeiras não bancárias, como os fundos de pensão e de investimento financeiro. O “big bang” dos mercados de ação e, em seguida, a liberalização dos mercados financeiros emergentes, terminaram o trabalho conduzido de forma concentrada pelos bancos centrais, por aqueles que “fazem” o mercado e pelos grandes investidores dos mercados situados no coração do sistema.
Corporate Governance e Maximização da Mais-Valia e do Lucro
A plena restituição da liquidez enquanto instituição concluiu a emergência do regime de acumulação com dominância financeira. As consequências de uma nova forma de relação entre os acionistas, os dirigentes das empresas e os assalariados somaram-se aos efeitos da influência da finança sob os governos. Os dividendos tornaram-se, ao lado dos rendimentos dos títulos da dívida pública, um mecanismo determinante de apropriação do valor e da mais-valia, e os mercados de ação passaram a ser uma instituição absolutamente decisiva na regulação do regime de acumulação. A pressão “impessoal” exercida pelos mercados financeiros sobre os grupos industriais através do nível comparado da taxa de juros sobre os títulos da dívida e sobre o nível de lucros industriais deu lugar a formas novas de interpenetração entre finança e indústria. A entrada de fundos de pensão e de investimentos financeiros no capital de grupos conduziu a mudanças importantes nas formas de relação e nas modalidades de entrelaçamento entre finança e indústria.
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