CONCEPÇÕES E PRÁTICAS DE ORGANIZAÇÃO E GESTÃO DA ESCOLA: CONSIDERAÇÕES INTRODUTÓRIAS PARA UM EXAME CRÍTICO DA DISCUSSÃO ATUAL NO BRASIL
Por: Juviano Bellé • 22/10/2015 • Trabalho acadêmico • 17.564 Palavras (71 Páginas) • 624 Visualizações
CONCEPÇÕES E PRÁTICAS DE ORGANIZAÇÃO E GESTÃO DA ESCOLA: CONSIDERAÇÕES INTRODUTÓRIAS PARA UM EXAME CRÍTICO DA DISCUSSÃO ATUAL NO BRASIL ([1]∗)
José Carlos Libâneo ([2]∗)
Resumo
As escolas têm como tarefas a educação, o ensino e a aprendizagem dos alunos em relação a conhecimentos, procedimentos, valores, tarefas que se cumprem pelas atividades pedagógicas, curriculares e docentes. Os meios e condições de consecução desse propósito são assegurados pelas formas de organização escolar e de gestão, elas próprias também portadoras de influxos educativos. Objetivos e funções da escola e formas de organização e de gestão são, pois, interdependentes. Entretanto, do ponto de vista teórico, são dois âmbitos da atividade escolar que resultam em campos de investigação com distintos objetos de estudo. Em geral, as diferentes concepções pedagógicas têm como suposto que as escolas são instituições sociais que, para cumprirem seus objetivos, necessitam condições e meios de funcionamento. Divergem, no entanto, em relação à escolha e à operacionalização desses meios. Neste artigo, são apresentados elementos para um exame crítico das concepções de organização e gestão de escolas no Brasil, numa perspectiva ao mesmo tempo histórica e teórica. Busca-se compreender a trajetória das disciplinas Administração Escolar ou Organização e Gestão e as modalidades de exercício profissional conexas, a relação entre as mudanças políticas e o desenvolvimento das concepções de Organização e Gestão, a relação entre funções e objetivos da escola e a adoção de práticas de organização e gestão. O artigo termina com a apresentação de conclusões parciais e a discussão de alguns dilemas sócio-pedagógicos implicados nos estudos da escola hoje.
Introdução
As escolas existem para promover o desenvolvimento das potencialidades físicas, cognitivas e afetivas dos alunos por meio da aprendizagem de saberes e modos de ação, para que se transformem em cidadãos participativos na sociedade em que vivem. Seu objetivo primordial, portanto, é o ensino e a aprendizagem, que se cumpre pelas atividades pedagógicas, curriculares e docentes, estas, por sua vez, viabilizadas pelas formas de organização escolar e de gestão. Constituem-se, assim, dois campos de investigação, de práticas e de exercício profissional, articulados entre si pela correlação, numa instituição, entre fins e meios.
O exame das variadas concepções pedagógicas e, nelas, a visão de escola, permite deduzir que nenhuma delas nega o fato de que as escolas são instituições sociais que, para cumprirem seus objetivos, precisam ser, de alguma forma, administradas ou geridas. No entanto, apresentam posições diferentes e, frequentemente, conflitantes em relação ao objetivo social das escolas e às formas organizacionais. O que está sendo proposto neste artigo é um balanço crítico dessas posições no contexto educacional brasileiro, especialmente, buscando entender que papel tais concepções reservam às formas de organização e gestão na efetivação da qualidade de ensino e da aprendizagem. A organização e gestão estariam tendo um papel reconhecido, por parte dos governos e dos intelectuais da educação, no provimento de condições para se atingir objetivos da escola? Admitida a necessidade da gestão, como estariam sendo formados diretores de escola, gestores escolares, coordenadores pedagógicos? Em que grau diferenças na visão do objetivo das escolas estariam se projetando em diferentes visões do lugar das práticas de gestão no funcionamento das escolas?
A linha norteadora da discussão visa mostrar que o papel das formas de organização e gestão da escola para a qualidade de ensino depende da identificação de diferenças na concepção de sociedade e nos objetivos propostos para a escola em função dessa concepção. Com efeito, admitida a necessidade social de que as escolas disponham de meios organizacionais (de alguma natureza) para alcançar seus objetivos, algumas questões antecedem essa afirmação. Para qual modelo de sociedade os alunos são educados e ensinados? Que significa aprender em relação a essa visão de sociedade? Em que consistem, precisamente, as aprendizagens escolares? O que a comunidade, as famílias e os próprios alunos esperam de uma escola? Que características de uma escola fazem diferença no que diz respeito ao nível da qualidade de ensino e de reputação na comunidade? Mas, por outro lado, o que se entende por qualidade de ensino? Poder-se-ia, por exemplo, afirmar que uma escola bem organizada e gerida é aquela que cria e assegura condições organizacionais, operacionais e pedagógico-didáticas para o bom desempenho de professores e alunos em sala de aula, de modo a se obter sucesso na aprendizagem. Há, de fato, estudos que comprovam a efetividade das características organizacionais no sucesso escolar dos alunos (Nóvoa, 1995; Barroso, 1996; Luck, 1998). Entretanto, há concepções de escola que, embora estejam interessadas em resultados escolares positivos, desdenham da importância dessas características por entenderem que representam formas de controle do trabalho típicas da administração empresarial capitalista. Outras concebem as escolas muito mais como lugares de convivência e socialização do que de aprendizagem de conteúdos ou de promotoras do desenvolvimento mental, dispensando formas mais estruturadas de organização do trabalho escolar. Há ainda propostas que, assentadas no principio da autonomia, imaginam poder operar as escolas sem vínculos institucionais com outras instâncias da sociedade e do sistema escolar. Em cada um desses casos, surgem concepções peculiares acerca do papel das práticas de organização e gestão em relação a objetivos desejados.
É precisamente em torno destas questões que se move este texto, tendo por base a observação da realidade das escolas e o suporte da produção bibliográfica disponível. Embora o tema permita ligações com as políticas e diretrizes educacionais, a organização do sistema de ensino, as formas específicas de organização do currículo como os ciclos de escolarização[3] e modalidades de avaliação, as relações entre o público e o privado, os critérios de qualidade de ensino, etc., o que se abordará aqui refere-se mais diretamente às concepções e práticas de organização e gestão da escola, tomadas no sentido estrito.
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