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DROGAS

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Por:   •  10/3/2015  •  7.083 Palavras (29 Páginas)  •  180 Visualizações

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Legalização de drogas e a saúde pública

 

Ronaldo Laranjeira

 

RESUMO

O objetivo deste artigo para debate é: (1) avaliar a racionalidade e a oportunidade desse debate; (2) tentar estabelecer pontes com drogas lícitas; (3) avaliar os dados disponíveis sobre o efeito da legalização de uma droga; (4) propor uma alternativa de política de drogas baseada em objetivos claros a serem alcançados; e (5) descrever como a Suécia está lidando com o tema de restrição às drogas como cuidado social. Metodologicamente, o texto constitui uma síntese das leituras e elaborações do próprio autor, colocada de forma a provocar discussão. Conclui-se que quatro aspectos precisam ser levados em conta quando se analisa a política de drogas de um país: (1) fatores externos influenciam a política: tratados internacionais, políticas de saúde e de assistência social, direitos individuais, autoridade e autonomia dos médicos e outros profissionais; (2) os objetivos estabelecidos influenciam as políticas formais e sua implementação; (3) a influência simbólica que transcende à implementação - pessoas influentes fazem declarações que atingem fortemente a legitimidade e a adesão às ações; (4) as políticas formais e sua implementação recebem influência direta dos danos percebidos socialmente pelo uso de drogas, o que pode ser independente do nível real do seu uso em determinada sociedade.

Palavras-chave: Drogas e saúde pública, Drogas e sociedade, Políticas sobre drogas

Introdução

A intensidade do debate sobre legalização de drogas no Brasil mostra que o assunto "drogas" produz efeitos nas pessoas, que se sentem levadas a ter muitas certezas e a ficar de um lado ou de outro da questão. Mostra também que o debate é profundamente ideológico e que após ouvirmos o lado favorável à legalização e o lado da proibição pura e simples, não ficamos mais esclarecidos a respeito da melhor política a ser seguida. Quando somente um dos aspectos de uma política de drogas, como a que discute apenas o status legal de uma delas, se torna o assunto principal do debate, é como se o rabo estivesse abanando o cachorro e não o contrário.

O objetivo deste artigo para debate é: (1) avaliar a racionalidade e a oportunidade desse debate; (2) tentar estabelecer pontes com drogas lícitas; (3) avaliar os dados disponíveis sobre o efeito da legalização; (4) propor uma alternativa de política de drogas que seja baseada em objetivos claros a serem alcançados; (5) descrever o exemplo da Suécia: restrição às drogas como cuidado social; e (6) algumas conclusões.

 

Racionalidade da legalização de uma droga

Com a intensidade que o debate sobre as drogas gera, poderíamos imaginar que a sociedade sempre tenha reagido de forma eficiente ao tema, ao longo do tempo. Entretanto, historicamente, a sociedade não tem avaliado muito bem os riscos do uso de uma nova droga ou uma nova forma de uso de uma velha droga. Por exemplo, a partir do começo do século XX, inovações tecnológicas tornaram a produção de cigarros mais fácil, tornando a absorção da nicotina muito mais eficaz do que ocorria anteriormente. Além disso, o preço do cigarro caiu dramaticamente. Progressivamente, houve aumento no número de fumantes em todo o mundo e, por muitos anos, os danos físicos associados ao cigarro não foram identificados. Muitos governos chegaram a estimular o consumo, pelos ganhos com impostos. Levou-se mais de quarenta anos para que os países desenvolvidos identificassem os males causados pelo fumo e outros vinte anos para que implementassem políticas de reversão da situação. Essa lentidão em reconhecer danos em algumas situações sociais faz que mudanças no status de qualquer droga, e principalmente quando um aumento de consumo é uma das possibilidades, sejam encaradas com cuidado.

Um dos motivos que dificulta a ação da sociedade é o excesso de retórica sobre o problema: cada droga produz sua própria retórica. Por exemplo, no caso recente da maconha, no Brasil tem sido comum utilizar-se uma retórica na qual o uso da substância estaria relacionado com a liberdade e os direitos do cidadão. Já o cigarro inspira outro tipo de retórica, que busca estimular uma ação estatal para controlar o abuso das companhias produtoras. A retórica pode mudar de país para país, de acordo com o momento histórico.

Tanto a intensidade do debate quanto o clima ideológico sobre as drogas advém do fato de quase não haver informação objetiva para avaliar as políticas que tratam da questão. Nesse sentido, é importante ter alguns referenciais teóricos que ajudem na tomada de decisões. A Figura 1 mostra os três modelos que, de forma explícita ou não, acabam prevalecendo. Os que defendem a proibição total do uso de drogas acreditam que a curva a-b representa o controle ideal, significando que a proibição total é a melhor opção, pois não causa nenhum dano social. Ao contrário, os que estão do lado b da curva, ou seja, da legalização das drogas, consideram que, com a proibição, o dano social aumenta. O argumento geralmente usado é a histórica Lei Seca americana, que produziu aumento considerável da violência promovida pelo crime organizado. Muito tem sido escrito sobre este período e os autores, em geral, enfatizam seu custo social. No entanto, do ponto de vista do consumo de álcool, a lei foi um sucesso, pois diminuiu consideravelmente o consumo global. Entretanto, houve aumento do consumo de álcool de péssima qualidade e um número considerável de pessoas teve problemas sérios de saúde. De qualquer forma, uma simples análise de custo-benefício mostra que essa foi uma experiência que nenhum país ocidental quer repetir, embora os islâmicos ainda adotem tal controle rígido.

Há pessoas que defendem a legalização total das drogas. A curva c-d ilustra este modelo, em que a proibição total levaria a elevado nível de dano, principalmente pelo crime que estaria associado com seu uso ilegal, maior corrupção social, nível mais impuro da substância no mercado negro e dificuldade das pessoas buscarem ajuda para se tratar da adicção. O argumento é que a proibição total causa mais dano do que a legalização total. A grande fraqueza desse tipo de raciocínio é que não leva em consideração que a legalização produz maior oferta e, portanto, expõe um número maior de pessoas ao consumo e a suas complicações. Esses defensores enfatizam em demasia o comportamento individual e não consideram o nível agregado

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