Redes de movimentos sociais na América Latina - caminhos para uma política emancipatória
Por: alysson312 • 29/9/2015 • Resenha • 1.804 Palavras (8 Páginas) • 620 Visualizações
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UNIVERSIDADE FEDERAL DE PELOTAS
CENTRO DE INTEGRAÇÃO DO MERCOSUL
CURSO DE RELAÇÕES INTERNACIONAIS
DISCIPLINA DE CONFLITOS E MOVIMENTOS SOCIAIS NA AMÉRICA LATINA
SCHERER-WARREN, Ilse. Redes de movimentos sociais na América Latina – caminhos para uma política emancipatória? CADERNO CRH, Salvador, v. 21, n. 54, p. 505-517, Set./Dez. 2008
INTRODUÇÃO - alguns elementos sobre a trajetória dos movimentos sociais na América Latina
A luta emancipatória na América Latina tem suas raízes em ações de resistência e reivindicativas, contra sistemas de exclusão e rejeição, como sistemas oligárquicos e autoritários, desde o período colonial com movimentos messiânicos, separatistas, formação de quilombos e resistência indígena. Os primeiros direitos adquiridos através dos movimentos foram de caráter social, apenas em meados do século XX que se iniciam movimentos de caráter politizado, com crítica e autonomia em relação ao estado, exercendo pressão política para transformações na estrutura social, como as Ligas Camponesas e os movimentos comunitários ligados à teologia da libertação e já nas décadas de 1970-1980, o novo sindicalismo e vários "novos movimentos sociais" na América Latina.
Com as ditaduras militares que ocorreram na segunda metade do século XX, dois principais tipos de manifestações de resistência emergem. As organizações clandestinas, guerrilhas e partidos de viés socialista ou comunista e manifestações cívicas públicas contra o poder autoritário e a restrição de direitos civis e políticos. Com a redemocratização, surge um movimento cidadão que vai lutar pela regulamentação ou criação de novos direitos civis, políticos, sociais, culturais, étnicos, de gênero e ambientais.
Ao o final do século XX e o início do novo milênio, as organizações da sociedade civil e os movimentos sociais passam a valorizar a participação institucional, ou seja, a participação através de audiências públicas, assembleias, conferencias políticas, fóruns etc. Tais organizações percebem a oportunidade do exercício do “controle social pela cidadania” um meio político legitimo para expansão da democracia. Paralelamente, alguns dos movimentos preferem uma resistência política mais ativa, como ocupações, bloqueios e outras formas de intervenção que obtenham um impacto político maior.
É importante entender que independente das formas de reivindicação, as diferentes organizações e tendências dos movimentos sociais se encontram e negociam ações políticas. Os movimentos sociais atuam cada vez mais em forma de rede, ora focando em suas especificidades e ora focando na busca pelo espaço político.
DEMANDAS MATERIAIS E SIMBÓLICAS DOS MOVIMENTOS SOCIAIS
As demandas materiais têm como objetivo contemplar as necessidades dos sujeitos-base das lutas, nessa direção, é possível nomear alguns dos movimentos sociais mais expressivos atualmente na América Latina, sem-terra, sem-teto, indígenas, quilombolas, negros, mulheres, entre outros. Essas demandas se tornam símbolo de luta e em consequência surgem os movimentos sociais específicos. É necessário buscar os nexos construídos entre as privações no cotidiano e o sentido subjetivo essas privações, traduzidos em pautas políticas partilhadas entre várias organizações, criando identidades coletivas que tornam possível a articulação dos movimentos específicos numa rede de movimentos sociais.
Na luta contra a exclusão, é preciso traduzir as demandas especificas e particulares em ideários politicamente mais amplos, porém suficientemente inclusivos em relação as desigualdades e discriminações históricas diferenciadas. Nesse processo, a forma da relação intergrupal tem que ser considerada, há de ter um reconhecimento recíproco sobre a vivencia da exclusão ou discriminação de sujeitos, a tradução dessa vivencia em novos valores coletivos para os grupos, como esse processo age na construção de pautas para as políticas emancipatórias que conectam as várias particularidades dos indivíduos em redes normativas mais abrangentes.
REFERÊNCIAS NORMATIVAS E INTERSUBJETIVIDADE NAS REDES
O potencial antissistêmico ou contra-hegemônico de qualquer movimento social reside na sua capacidade de articulação com outros movimentos, com as suas formas de organização e os seus objetivos, assim como sua inteligibilidade, para que tal articulação seja possível. Dessa forma, pode-se fazer uma “tradução” dos movimentos, ou seja, a análise de o que une e o que separa um movimento do outro, de modo a determinar as possibilidades e os limites de articulação entre eles.
A Via Campesina, por exemplo, tornou-se um elo dentre os movimentos sociais a partir das pautas antissistêmicas do modelo atual de agronegócio. A “Campanha das Sementes”, que preza melhor produção e, por conseguinte, melhor qualidade de vida, acabou por influenciar não só movimentos camponeses, como o MST, mas também o movimento feminista e dos jovens. Essa questão então específica, obteve novas interpretações nesses dois movimentos, sendo agora empregada com uma visão de mundo mais justa, saudável e igualitária, já que os recursos genéticos estão associados a direitos humanos, trabalho, meio ambiente, saúde, consumo, etc. A Via Campesina realizou em 2004, aqui no Brasil, a “IV Conferência Internacional da Rede”, voltada a pautas específicas do movimento, com a presença de mais de 80 países, mas que acabou gerando outros dois fóruns: a "II Assembléia de Mulheres da Via Campesina" e a "I Assembléia de Jovens Camponeses da Via Campesina". Esses encontros também trabalharam o mote dos indígenas que perderam suas terras para empresas, especialmente os indígenas do Espírito Santo, destacando ainda mais o processo de formação das redes, uma vez que movimentos trabalham outros assuntos além dos seus.
É a partir de uma nova lógica associativa que a diversidade dos movimentos sociais latino-americanos vem se articulando em redes políticas. conforme afirma Touraine – sociólogo francês que dedica sua vida ao estudo de movimentos sociais -, “opera-se uma dialética em que não apenas o sujeito torna-se ator, mas em que o ator, através dos movimentos, vai se transformando em sujeito político, o que, para as camadas subalternas na América Latina, é um acontecimento político relevante, em termos sociais e culturais”. Segundo Jorge Alberto Machado – professor da Escola de Artes da USP -, "os interesses dos indivíduos que os ligam em redes são cada vez mais cruzados, diversos e, frequentemente, tênues. Luta-se cada vez mais em torno de códigos culturais, valores e interesses diversos. Essa luta se dá, cada vez menos, a partir dos indivíduos e mais sobre a construção de sujeitos sociais.”
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