As Formigas
Por: Juninhoojrs • 15/5/2018 • Dissertação • 1.061 Palavras (5 Páginas) • 213 Visualizações
Você já brincou de matar formigas?
Acordei numa manha e estava escovando os dentes enquanto repassava alguns pensamentos, cedendo a uma checagem perfeccionista. Minha mente trouxe-me algo que fica oculto em minhas memórias, mas que eventualmente é trazido a tona. Algo doloroso. Como todos nós que temos em nosso passado coisas que nos chateiam profundamente e a simples lembrança é suficiente para causar um mal estar.
Esse meu “algo doloroso” diz respeito a um cão (vira-lata) que eu tive durante 13 ou 14 anos, não lembro exatamente. O nome dele era Maradona. Meu pai o pegou, pequenininho, em um beco próximo a uma caixa d'água e o trouxe para casa, dentro de uma sacola com bananas que havia acabado de comprar em um supermercado próximo. Eu devia ter 7 anos, e lembro da alegria de chegar da escola e ver aquela criaturinha branca com manchas pretas se coçando em cima de uma cadeira.
Maradona morreu em 2015, devido a um câncer que se alastrou. Depois de sua morte, comecei a sentir culpa por momentos, durante esses 13 ou 14 anos de convivência, no qual negligenciei ele. Não pense mal, Maradona foi um cachorro muito bem tratado, a sua longevidade fala por si só. Porem houve momentos específicos em que ele foi negligenciado por mim e por minha família. O que mais dói é presumir a solidão dele. Havia um terraço atrás da minha casa, um espaço grande, onde ele ficava. Passou a maioria dos seus dias ali, sendo solto apenas na parte da noite para o terraço da frente. Apesar de espaçoso, eu imagino que em muitas circunstâncias aquele terreno tenha se tornado pequeno para ele, devido ao tempo que passava sozinho.
Outras vezes, que penso esperançosamente terem se tratado de poucas, esquecemos de banhar, colocar comida duas vezes por dia, e até limpar seu terraço de excrementos. Novamente, isso nunca foi feito com intencionalidade, já que eu e minha família sempre fomos apaixonados por animais. Mas como seres humanos – erramos e agimos mal – em um mundo onde a profusão de preocupações e correrias, também influi. O conforto é saber que sempre que percebíamos nossos erros em relação ao cachorro, tomávamos providências para saná-los.
Orando sobre o assunto, pedindo perdão, considerei algumas relações entre a Lei de Deus e a Lei dos Homens. Tenho a plena certeza de que o senhor Jesus perdoa os nossos pecados e nos purifica de toda injustiça quando nos arrependemos (1 João 1:9). Somos então encorajados a seguir em frente (2 Cor 5:17; Fp 3: 13-14). Isso nada tem a ver, graças a Deus, com sentirmos que estamos perdoados, é algo externo, que não necessita da nossa instável percepção, antes, está nas promessas daquele em que não há mudança nem sombra de mudança. Porém, creio que há alguns pecados em que a presença de cristo é vista através do cumprimento da justiça humana além da confissão perante Deus. Por exemplo, se um assassino um dia se converte, nunca tendo sido pego por crimes do passado, ele tem a obrigação de ir na delegacia se entregar e cumprir a pena relativa ao seu país. Deve pagar por seus crimes e acertar, se possível, todas as pontas soltas em sua vida e na vida das pessoas que atingiu. Nesse sentido, considerei Maradona.
No Brasil, o artigo 32 da lei 9605/98 versa o seguinte: “Praticar ato de abuso, maus-tratos, ferir ou mutilar animais silvestres, domésticos ou domesticados, nativos ou exóticos: pena detenção, de três meses a um ano…”. Deveria eu, além de pedir perdão ao Senhor, ir na delegacia e falar que por muitas vezes maltratei meu cão negligenciando cuidados a ele? Segui com as dúvidas permeadas de obsessão. Nesse caso, não podendo simplesmente ignorá-las, antes tentei, como requerido nos confrontos com as obsessões, analisá-las quanto sua racionalidade ou irracionalidade. Foi ai que me ocorreu a questão que deu título a este texto e a ideia de escrevê-lo para me ajudar a pensar.
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