As Relações Entre Religião E Cultura No Pensamentode Paul Tillich
Monografias: As Relações Entre Religião E Cultura No Pensamentode Paul Tillich. Pesquise 862.000+ trabalhos acadêmicosPor: Janethy • 24/4/2014 • 6.813 Palavras (28 Páginas) • 361 Visualizações
Partimos de uma reflexão do professor Antonio Mendonça sobre a relação entre pro-testantismo e cultura no pensamento de Paul Tillich. Na base do pressuposto de Til-lich, que considera o protestantismo como religião – pelo menos na sua forma con-creta –, ampliamos a perspectiva até abranger sinteticamente o espectro inteiro das concepções de Tillich sobre religião, cultura e suas mútuas relações. Pensamos, deste modo, oferecer maiores subsídios para fundamentar uma crítica do intelectualismo no protestantismo histórico, especialmente no Brasil, e uma aproximação ecumênica mais decidida entre as igrejas protestantes e o catolicismo. A comum participação da mesma estrutura (Gestalt) de graça, dialeticamente equilibrada pelo princípio pro-testante, só poderá resultar numa melhor integração na diversificada cultura local e no substrato religioso constantemente enriquecido por novos elementos, desde os tempos coloniais até os nossos dias.
Palavras-chave: Paul Tillich, cultura, religião, protestantismo, ecumenismo, Gestalt de graça.
Introdução
O professor Antonio Mendonça [2] tratou da relação entre protestantismo e cultura na reflexão de Paul Tillich no capítulo 3 da obra: Protestantes, Pentecostais e Ecumênicos. [3] A intenção do capítulo é de analisar as relações entre protestantismo e cultura no contexto do fim anunciado da religião pela teologia da secularização e do surgimento de novas formas de religião.
A respeito de Tillich, Mendonça observa, em primeiro lugar, que o teólogo germano-americano começa por uma crítica severa da religião, dirigida em particular ao protestan-tismo, considerado por ele como uma religião ou, melhor, uma corrente da religião cristã. [4] Efetivamente, a religião consagrou o status quo de todos os sistemas de organização soci-al e de exploração no decorrer da história do Ocidente. Por isso, a ordem sacerdotal deve ser submetida à denúncia da palavra profética. O sentido da existência e da história humana resulta da dialética entre a linha vertical – a linha do eterno e do místico, da “reserva religi-osa” – e do “apesar de”, e a linha horizontal – a linha da realização temporal e da obriga-ção religiosa. As instituições religiosas, em especial as igrejas protestantes históricas, es-queceram-se da linha vertical e deram ênfase apenas às exigências morais e políticas. Isso provocou a volta do misticismo. Para Tillich, não se pode absolutizar nem o ativismo da linha horizontal, nem o misticismo da linha vertical. O resultado é, de um lado, o oportu-nismo, do outro lado, o utopismo. Ambos precisam ser transcendidos pela esperança, que é a reserva religiosa.
O protestantismo foi capaz de configurar uma civilização, mas sacrificou a reserva religiosa. Enquanto isso, a Igreja Católica conserva uma substância espiritual mais viva, mas paga o preço da heteronomia, fundada na tradição e na autoridade. O elemento protes-tante subsiste na situação-limite da vida humana, situação da angústia e do desespero, aonde nos leva a nossa liberdade determinada pelo destino. A nossa existência está constantemente ameaçada pelo risco de não-ser. Nenhuma instituição, igreja, doutrina ou sacramento pode nos libertar do “corpo desta morte”. “Religião e Igreja nunca poderão ser garantias para os protestantes” (101). A Igreja protestante recusa toda substância religiosa, que possa ame-nizar o peso da situação-limite e rejeita em bloco sacramentos, misticismo, atos sacerdotais, autoridade eclesiástica e culto extático. Sua função e seu poder específicos residem na cruz, na qual a humanidade sentiu a situação-limite de maneira única. Frente à situação-limite, culturas e religiões perdem o seu caráter supremo e final. Só o sim incondicional de Deus afasta a ameaça à existência humana.
A função do princípio protestante é de insistir na experiência radical da situação-limite, de proclamar a insegurança como segurança e a posse da verdade na ausência da verdade, e de dar testemunho do “novo ser” manifestado em Jesus, o Cristo. No desempe-nho dessa tarefa, o princípio protestante transcende as diferenças de cultura e religião, po-dendo ser proclamado por movimentos pertencentes tanto ao domínio religioso quanto ao secular, independentemente das igrejas protestantes oficiais. “O princípio protestante é o juiz de qualquer realidade religiosa e cultural, incluindo a religião e a cultura chamadas ‘protestantes’” (110). Contudo, enquanto o protestantismo é a atitude de protesto contra as formas, o seu protesto só pode existir em relação a certa Gestalt à qual pertence. Caso contrário, destruiria o seu próprio fundamento. O mesmo consiste na Gestalt *ou realidade da graça, ou ainda, “estrutura divina da realidade”, cujo lugar é a fé. “Assim, o pressuposto do poder formativo do protestantismo encontra-se na união do protesto com a forma na *Gestalt da graça” (105).
Segundo o ponto de vista protestante, a graça se manifesta através de uma Gestalt, sem mudar a natureza da mesma, seja ela a humanidade de Cristo, a Igreja histórica ou a materialidade do sacramento. As coisas finitas que veiculam a graça não podem identificar-se com ela, sob pena de tornarem-se demoníacas. Ninguém pode apropriar-se da graça sa-cramental. A Igreja e o santo devem apenas tornar-se transparentes à Gestalt de graça, só acessível à fé. Em conseqüência, o elemento religioso deve sempre se relacionar com o ele-mento secular, através do qual a graça se faz presente: é o “secularismo protestante”. “O poder formativo do protestantismo age sempre quando a realidade é interpretada em relação com o seu fundamento e o seu sentido último” (106). “O poder formativo do protestantismo expressa-se não somente na dimensão religiosa, mas na totalidade da existência pessoal, social e intelectual da civilização ou da cultura” (107). Assim, o princípio protestante exerce influência silenciosa sobre a cultura, cujas formas autônomas se tornam portadoras do senti-do último, isto é, se tornam religiosas.
O problema é que o protestantismo – em particular na teologia e no culto – não en-controu maneiras de se relacionar com o mundo contemporâneo. Aparece como uma religi-ão altamente intelectual, ao passo que as massas desintegradas querem autoridades sacra-mentais: sacerdotes, bispos, monarcas, autoridades de origem carismáticas; elas necessitam de coisas objetivas como ritos e símbolos (Bíblia, dogma, história etc.). A racionalização da doutrina dissolveu o mistério religioso. Por isso, o protestantismo nunca conseguiu reinte-grar as massas, nem ser uma religião de massas. Para realizar esse objetivo,
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