PROSTITUIÇÃO MASCULINA E DA HOMOSSEXUALIDADE NAS MEMÓRIAS BLOGUEIRAS
Por: Alexandre Ribeiro • 11/4/2017 • Projeto de pesquisa • 5.762 Palavras (24 Páginas) • 394 Visualizações
DISCURSO, CORPO E HISTÓRIA: UMA ANÁLISE SEMIOLÓGICA DA PROSTITUIÇÃO MASCULINA E DA HOMOSSEXUALIDADE NAS MEMÓRIAS BLOGUEIRAS DE UM EX-GAROTO DE PROGRAMA
Danilo Vizibeli
RESUMO
Com o advento das redes sociais, as maneiras de expressar a sexualidade e o trabalho com o corpo (seja no sentido do cuidar-se no viés da saúde e qualidade de vida, seja do cuidar-se no sentido da estética) foram ressignificadas e remodeladas. A prática da prostituição até então destinada aos subúrbios ou então escondida e mascarada pelos mecanismos de poder no seio da sociedade, passou a ser visível, acessível a qualquer momento. Em jargão popular: basta um clique para praticar o sexo. Dentro desse cenário, objetivou-se analisar o jogo de imagens e discursos apresentados nas memórias blogueiras de um ex-garoto de programa – Tony Maya – em sua página na internet (http://censuradotonymaya.blogspot.com). O arcabouço teórico é ancorado na Análise de Discurso Francesa (AD), mais precisamente nos pressupostos de Michel Foucault que versa sobre o poder, o saber e o discurso enquanto dispositivo, e ainda em Jean-Jacques Courtine que trabalha o corpo como objeto discursivo e apresenta o conceito de Semiologia Histórica. Procurou-se compreender a constituição do sujeito Tony Maya e o movimento discursivo realizado em seu blog que apresenta um hibridismo dos gêneros discursivos e textuais “confissão” e “conto erótico”. Os resultados apontam para formações discursivas da liberdade, da contradição, do querer ser e não ser garoto de programa e ainda a culpa e ao mesmo tempo o êxtase, na visitação de regiões interditadas pela ordem do discurso que é a região da identidade homossexual.
Palavras-chave: Discurso. Semiologia. Corpo. Homossexualidade.
Entre a censura e a liberdade: um sujeito que escreve, um sujeito que se marca
Em toda cidade, nos redutos ou até mesmo nas zonas centrais, é possível ver mulheres, em sua maioria, mas também homens que andam de um lado e andam de outro. Seus corpos são “perfeitos”, a carne é exuberante ao mostrar o que se quer: sexo. Mas se quer sexo pelo dinheiro. São garotas e garotos de programa, prostitutas e prostitutos. Até aí são sujeitos anônimos, seres humanos, identidades desconhecidas. Um carro para, a porta se abre e o profissional do sexo entra; daí ele se constitui em um sujeito, enviesado por determinado discurso e dominado por um poder que o submete, o reduz e o coloca na periferia da sociedade, excluindo-o da ordem considerada natural dos seres sociais.
Por muito tempo foi assim. Hoje, com o advento da internet e das redes sociais, não é preciso sair de casa e perambular pelas periferias para se conseguir um profissional do sexo. O que antes era escondido e velado, hoje é exposto nas páginas da web. O objeto de estudo deste artigo é o garoto de programa masculino. O corpus do estudo é o blog “Censurado Tony Maya” (http://censuradotonymaya.blogspot.com) que se constitui como um relato em forma de diário das aventuras de um garoto de programa na Europa, intitulado Tony Maya, mais precisamente na Espanha e arredores. Conheceu-se o material de pesquisa por acaso, ao fazer a leitura de notícias gerais em sites comuns de portais noticiosos, o que chamou a atenção foi o diário que estava em construção e no qual a cada semana o autor postava um trecho ou uma nova aventura em forma de capítulos e assim aconteceu até o capítulo 36, quando não mais houve nenhuma postagem até o término da escrita deste trabalho. Posteriormente, apareceu no blog um anúncio de uma página que comercializa garotos de programas, talvez mantida pelo autor do blog e seus colaboradores.
Tony Maya descreve-se como brasileiro, nascido em Belo Horizonte (MG); morou por dez anos na Europa onde trabalhou como garoto de programa. Ainda em sua apresentação no blog escreve: “Passei por experiências que nunca esperei passar, coisas boas, coisas ruins. Algumas serviram de aprendizado, pois me fizeram crescer. Outras, prefiro esquecer. Decidi compartilhar minha história como um meio de desabafar e como forma de mostrar a realidade desse meio”.
Foram os últimos enunciados que serviram de motivação para a escrita deste texto. No primeiro – “Decidi compartilhar minha história como um meio de desabafar” – percebemos um sujeito que se utiliza do gênero confissão para se constituir como sujeito discursivo. No decorrer das narrativas do blog, percebe-se, porém, que os textos muito se assemelham a um conto erótico, carregados de sensualidade, e com outros propósitos que não só o desabafo. No segundo enunciado – “e como forma de mostrar a realidade desse meio” – o material traz uma carga de registro histórico, um viés jornalístico, e que pode ser estudado dentro da semiologia histórica, como constituição de um discurso.
Sendo assim, o objetivo principal é compreender a constituição do sujeito Tony Maya e o movimento discursivo em sua escrita que apresenta um hibridismo dos gêneros discursivos e textuais “confissão” e “conto erótico”. A análise foi feita tomando as imagens que acompanham os diversos posts que apresentam, conforme define Courtine (2013), uma semiologia do olhar, bem como alguns enunciados que acompanham tais imagens. A tentativa foi de descrever e interpretar discursivamente e semiologicamente um corpo que escreve e se inscreve numa ordem discursiva de um sujeito que se marca. O referencial teórico principal é a Análise de Discurso, utilizando as reflexões de Michel Foucault, o qual toma o discurso da sexualidade e do corpo como mecanismo de poder e saber, e versam, sobretudo, acerca do sujeito. Ainda são trazidos os estudos do corpo e da imagem, dentro da semiologia histórica praticada por Jean-Jacques Courtine. Em um momento das análises foi preciso questionar qual a tônica dos textos de Tony Maya: um viés pornográfico, trata-se de um site erótico? Qual a diferença entre erotismo e pornografia? E para promover uma segurança maior em torno do que se propunha fazer em termos de estudos, buscou-se uma consideração acerca da leitura pornográfica em uma trajetória histórica traçada por Jean-Marie Goulemot.
A partir desse referencial teórico e bibliográfico, surgiram diversas indagações para a constituição da problemática do estudo: que poder tem a imagem ao dar voz a um sujeito em sua mais ampla intimidade e que expõe e veicula suas memórias em público na internet? Como o corpo tomado como discurso é o elemento pelo qual o sujeito se inscreve na ordem discursiva? Que imagem da prostituição (e no caso da prostituição masculina) está na memória discursiva da sociedade e quais efeitos tal
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