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A COZINHA DOS SENTIDOS

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Por:   •  3/6/2014  •  608 Palavras (3 Páginas)  •  1.194 Visualizações

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A COZINHA DOS SENTIDOS

Roland Barthes

Uma roupa, um carro, uma iguaria, um gesto, um filme, uma música, uma imagem publicitária, uma mobília, uma manchete de jornal, eis ai, aparentemente, objetos completamente heterogêneos.

Que podem ter em comum? Pelo menos o seguinte: todos são signos. Quando me movimento na rua – ou na vida – e encontro esses objetos, aplico a todos, às vezes sem me dar conta, uma mesma atividade, que é a de certa leitura: o homem moderno, o homem das cidades, passa o tempo a ler. Lê primeiro e principalmente imagens, gestos, comportamentos: tal carro me diz o status social do proprietário, tal roupa me diz exatamente a dose de conformismo ou de excentricidade do seu portador, tal aperitivo (uísque ou vinho branco com cassis) o estilo de vida do meu hóspede. Mesmo quando se trata de um texto escrito, é-nos continuamente proposta uma mensagem nas entrelinhas da primeira: se leio, em manchete com letras garrafais: Paulo VI tem medo, isso quer dizer também: se você ler a continuação saberá por quê.

Todas essas “leituras” são importantes demais na nossa vida, implicam demasiados valores sociais, morais, ideológicos, para que uma reflexão sistemática não tente assumi-las: é essa reflexão que, por enquanto, pelo menos, chamamos de semiologia. Ciência das mensagens sociais? Das mensagens culturais? Das informações segundas? Apanhado de tudo que é “teatro” no mundo, da pomba eclesiástica à cabeleira dos Beatles. Do pijama de gala aos certames da política internacional? Pouco importa, no momento, a diversidade ou a flutuação das definições.

O que conta é poder submeter uma massa enorme de fatos aparentemente anárquicos a um princípio de classificação, e é a significação que fornece esse princípio: ao lado das diversas determinações (econômicas, históricas, psicológicas), será preciso doravante prever uma nova qualidade do fato: o sentido.

O mundo está cheio de signos, mas esses signos não têm todos a bela simplicidade das letras do alfabeto, das tabuletas do código de trânsito ou dos uniformes militares: são infinitamente mais complicados. Na maioria das vezes, nós os vemos como se fossem informações “naturais”; encontrou-se uma metralhadora tcheca nas mãos dos rebeldes congoleses: aí está uma informação incontestável; entretanto, na medida mesmo em que não se faz menção, ao mesmo, do número de armas americanas em uso entre os governistas, a informação se torna um signo segundo, ela patenteia uma escolha política.

Decifrar os signos do mundo sempre quer dizer lutar com certa inocência dos objetos. Todos nós, franceses, entendemos tão “naturalmente” o francês que nunca nos vem à cabeça a idéia de que a língua francesa é um sistema complicadíssimo e muito pouco “natural” de signos e de regras: da mesma maneira, é necessária uma constante sacudida da observação para ajustar o foco não sobre o conteúdo das mensagens, mas sobre a sua feitura: enfim, o semiólogo, como o lingüista, deve entrar na “cozinha do sentido”.

Isso constitui uma empreitada imensa. Por que? Porque um sentido nunca se pode analisar de modo isolado. Se estabeleço que o blue-jeans é o signo de certo estilo adolescente, ou o cozido fotografado por determinada revista de luxo, o de uma rusticidade bastante

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