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Estado E Regulação

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Por:   •  27/5/2014  •  3.543 Palavras (15 Páginas)  •  607 Visualizações

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ESTADO E REGULAÇÃO: FUNDAMENTOS TEÓRICOS

REGULAÇÃO DE MERCADOS: A REGULAÇÃO MODERNA

Para chegar ao Estado regulador, o Estado passou pelo Programa Nacional de Desestatização, por Reformas Constitucionais e por privatizações.

Busca-se trilhar novos caminhos no Brasil, no fim dos anos 80 e durante a década de 90, num processo de "desestatização", sendo esta a retirada do Estado de alguns setores, deixando-se para a iniciativa privada atuar, na exploração de alguns serviços e atividades. Este afastamento do Estado pode se desenvolver de várias formas, e a privatização é apenas uma delas (Cf. Mattos, 2006).

Em geral, a atividade regulatória ocorre de dois modos: diretamente, por meio do provimento de bens e serviços públicos pelo próprio Estado, via empresas estatais que atuam em setores de monopólios naturais ou não; ou a partir de sua própria estrutura tradicional, como ministérios ou órgãos a eles subordinados. Até o início dos anos 1990 predominou na Europa e na América Latina a primeira opção.

O Estado Regulador, com suas instituições características expressas por agências independentes especializadas, criadas em substituição à propriedade privada, teve origem nos Estados Unidos, o que causou grande impacto na vida política americana com a transformação das relações entre as organizações do governo e o sistema de espólio das empresas privadas, além da difusão de valores e ideias de profissionalismo, especialização técnica e científica, competência e neutralidade administrativa e observação de eficiência tanto na atuação do governo quanto no desempenho do mercado.

Os principais objetivos da regulação são: o bem-estar do consumidor (realiza-se o maior volume de transações econômicas, com a geração de maior renda agregada possível); distributiva (definida como a capacidade de redução, da apropriação de excedentes econômicos por parte do produtor) e produtiva (entendida como a utilização da planta instalada com máximo rendimento e menor custo, dada a estrutura de mercado da indústria, universalização e a qualidade dos serviços); a interconexão entre os diferentes provedores (rede pública); a segurança; e a produção ambiental (Giambiagi, 2000).

Para a eficiência do sistema regulatório são necessários:

• Uma política tarifária definida e estável.

• A existência de marcos reguladores definidos, que detalhem as relações entre os diversos atores de cada setor, seus direitos e obrigações.

• Um mecanismo ágil e eficiente para a solução de divergências e conflitos.

• Um certo grau de garantia contra os riscos econômicos e políticos.

• A criação de um órgão regulador do setor, dotado de especialidade, imparcialidade e autonomia nas decisões.

Vários atores políticos e econômicos do mundo todo adotaram essas novas estruturas de governança, o que para esses autores somente a partir daí é que um país poderia se inserir no círculo de países dotados de sistema regulatório moderno.

A mobilização de alguns setores sociais juntamente com o governo brasileiro nesse sentido foi notável nos anos 1990. Com afiada construção retórica fundamentada no ideal de sociedade capitalista moderna e dotada de aparato regulatório moderno, o Brasil viu-se em meio a reformas afinadas com as propostas de desregulamentação.

A proposta de reforma regulatória da OCDE (Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico) influenciou amplamente os países latinos, entre eles o Brasil. A partir do âmbito de atuação do Estado, essa proposta apresenta três categorias da atividade regulatória:

• Regulação Econômica – caracteriza-se pela intervenção direta nas decisões de mercado, tais como definição de preços, competição, entrada e saída de novos agentes nos mercados. Para a OCDE, nessa categoria a reforma deve se propor a aumentar a eficiência econômica por meio da redução de barreiras à competição e à inovação, utilizando a desregulamentação, a privatização e fornecendo estrutura para o funcionamento e a supervisão das atividades do mercado.

• Regulação Social – destina-se a proteger o interesse público nas áreas de saúde, segurança, meio ambiente e em questões nacionais. Segundo a OCDE, cabe nesse plano da reforma aferir a necessidade de intervir em decisões relativas à provisão de bens públicos e à proteção social, reduzindo os efeitos das externalidades geradas por outros agentes sobre a sociedade.

• Regulação Administrativa – destina-se a estabelecer os procedimentos administrativos por meio dos quais o governo intervém nas decisões econômicas, os chamados red-tapes. Esses instrumentos burocráticos podem gerar impactos substanciais sobre o desempenho do setor privado. De acordo com a OCDE, para evitar esse efeito, os governos devem buscar em suas reformas regulatórias eliminar as formalidades desnecessárias, simplificar aquelas que são necessárias e melhorar sua transparência e aplicação.

Com intervenções como essa se ampliou na região a percepção de que com a adoção de tais medidas e do aparato regulatório apropriado ter-se-ia, enfim, regulação moderna capaz de conduzir cada país que a adotasse rumo ao desenvolvimento esperado.

No tocante a desestatização, esta foi desenvolvida no Brasil, basicamente, de quatro formas distintas que podem ser classificadas como: concessão, permissão, privatização e terceirização. Todas elas passam por uma quinta forma, mais abrangente, intitulada de desregulamentação. Foram criadas agências, que objetivam regular os setores desestatizados. Cita-se a ANEEL no setor de energia elétrica, a ANATEL nas telecomunicações, a ANP no de petróleo, entre outras (Mattos, 2006).

Para Paulo Mattos, o modelo de agência reguladora aplicada no Brasil, é baseado no modelo norte-americano, quando as agências atingiram seu maior grau de poder naquele país. A criação de uma burocracia estatal para regulação de mercados, especialmente centralizada no modelo de agências reguladoras independentes, marcou uma redefinição dos canais de circulação de poder político para a formulação de políticas públicas para setores estratégicos da economia, tais como os de telecomunicações, energia elétrica, gás e petróleo, transportes, água e saneamento, saúde e medicamentos, seguros, etc. (Mattos, 2006).

Jordana e Levi Faur (2004) consideram útil esclarecer sobre os cinco significados que podem assumir a regulação na literatura contemporânea. Partem do pressuposto de que como o pensamento regulatório está alinhado à agenda neoliberal, isso implica que regulação e competição sejam indissociáveis. No entanto, o padrão de interação pode variar indicando a direção das reformas. Os autores consideram que desregulação, re-regulação, regulação da competição, regulação por competição e metarregulação trazem distintas e algumas vezes até mesmo dimensões conflitantes do amplo fenômeno da reforma regulatória e da liberalização.

A desregulação é para esses autores a redução econômica, política e social das restrições sobre o comportamento dos atores sociais, especialmente daqueles que atuam no mercado.

Já a noção de re-regulação é utilizada com frequência significando que reforma regulatória e liberalização em geral resultam em novo cenário de regulação antes que em desregulação. Por sua vez, os autores apontam vantagens no uso da regulação da competição e da regulação por competição sobre a noção de re-regulação, porque elas refletem relação positiva entre regulação e competição. A diferença entre regulação da competição e regulação por competição está no grau de interferência do Estado e na sua capacidade de monitorar e reforçar a competição. Enquanto ambas requerem o estabelecimento e o fortalecimento da estrutura de governança, regulação por competição requer estrutura menos invasiva.

A metarregulação da competição, finalmente, implica que, ao se adicionar a regulação direta sobre as ações dos indivíduos e das corporações, o processo de regulação torne-se ele mesmo regulado. No que tange à interferência do Estado, esse tipo de regulação pode ser julgado tão invasivo quanto a regulação por competição.

TIPO DE COMPETIÇÃO TIPO DE REGULAÇÃO AUTORIDADE REGULATÓRIA EXEMPLOS

Desregulado Mercados autorregulados Sem regulação (recuo do Estado) Vai da certificação a leis de responsabilidade para proteger o consumidor.

Regulado Regulação da competição Autoridades de competição nacional Prevenção da concentração por meio da regulação de fusões, incorporações, reestruturações acionárias etc.

Regulado Regulação por competição Autoridades em setores específicos e autoridades de competição nacional Regimes de interconexão em telecomunicações, compartilhamento de redes.

Metarregulado Reforço da autorregulação das regras de competição Autoridades em setores específicos e autoridades de competição nacional Institucionalização de mecanismos internos de autorregulação que correspondam às exigências legais de competição em geral e ao regime regulatório em particular.

Nota-se, pela análise dos focos da regulação e ainda pela relação entre competição e regulação, diversidade de ambientes regulatórios, uns mais outros menos competitivos, que contam com menor ou maior participação do Estado nas decisões de mercado. Porém, uma imagem destaca-se: a nova governança é sem dúvida característica genuína do Estado Regulador.

DELEGAÇÃO, CREDIBILIDADE E COMPROMETIMENTO: ALGUMAS MOTIVAÇÕES BÁSICAS.

A delegação de poderes para as agências reguladoras, assim como a necessidade de elevar o grau de comprometimento do poder público com a manutenção de decisões, leis e normas que afetam diretamente os agentes do mercado, são os fatores-chave que motivaram a criação dessas instituições.

Para autores como Majone (1997) o fracasso da regulação por meio da propriedade estatal explica toda a mudança para um modo alternativo de controle, no qual serviços e setores inteiros, considerados importantes para o interesse público, são deixados em mãos privadas, mas sujeitos a regras desenvolvidas e aplicadas por agências especializadas.

Os manuais de economia identificam falhas de governo, citadas por Majone, com a teoria da escolha pública. Aqui são descritos alguns desses problemas recorrentes que caracterizam as restrições da atuação do governo na economia:

• Rent-seeking – ocorre quando grupos de interesse se envolvem com a política, visando a obter vantagens sobre os demais grupos.

• Captura – ocorre quando os organismos regulatórios se encontram muito próximos dos regulados, favorecendo o aumento dos riscos de interferência de interesses particulares nas decisões públicas, consequentemente afetando a independência e a qualidade da regulação.

No caso das agências reguladoras independentes, Macgowan e Seabright (1996) notam que há outras formas de se desviar os interesses da agência do interesse público. A captura também pode ocorrer quando o governo propriamente faz que a agência assuma posições que reforçam sua política para determinado setor. Além disso, existe ainda a captura burocrática, que ocorre quando os objetivos da agência passam a refletir os interesses de seu staff.

• Falhas institucionais – ocorre quando o governo intervém em decisões sobre a alocação de recursos, de modo a atingir objetivos de equidade e distribuição de renda.

• Patronagem – caracteriza-se precisamente pela distribuição de cargos e é um dos recursos do clientelismo. A atividade regulatória tende a ser complexa e muito específica. Um quadro de pessoal qualificado para efetuar serviços em regulação seria então um requisito. Todavia, no lugar de preencher os cargos disponíveis por meio de recrutamento de pessoal qualificado, os governos tendem muitas vezes a ver a criação das novas organizações como oportunidade para trocar apoio ou pagar favores políticos, comprometendo por vezes o quadro de pessoal das agências.

Segundo Levy e Spiller (1996), as instituições de um país influenciam tanto a confiança dos investidores quanto o desempenho dos serviços públicos. No entanto, para que tenham a habilidade de restringir a ação administrativa discricionária, as instituições políticas e sociais devem ter efeito independente sob cada tipo de regulação e equilíbrio adequado entre o comprometimento com um sistema regulatório e a flexibilidade para responder às mudanças tecnológicas.

Além disso, para eles, o compromisso com o sistema regulatório deve ser cultivado sempre, mesmo quando o ambiente parece o mais problemático possível, pois sem o comprometimento de longo prazo não há como manter os investimentos. Porém, ao mesmo tempo, os autores parecem considerar, em último caso, as peculiaridades institucionais de cada país e reconhecem que alcançar um nível de comprometimento pode requerer regime de inflexibilidade regulatória em alguns casos e, em outros, só mesmo a propriedade pública dos serviços é possível.

De acordo com a abordagem de Levy e Spiller para se entender a capacidade de um país em comprometer-se com determinado sistema regulatório e suas instituições, deve-se estar atento ao desenho regulatório que possui dois componentes: a governança e os incentivos. A estrutura de governança incorpora os mecanismos sociais úteis para restringir a ação discricionária do regulador e solucionar os conflitos que essas restrições venham suscitar. Já a estrutura de incentivos compreende as regras governamentais que definem preços, subsídios, competição e a entrada de novos competidores, as interconexões. Eles sustentam que a ênfase apenas nos incentivos regulatórios é um equívoco, pois, embora os incentivos afetem o desempenho, o maior impacto é sentido apenas se a estrutura de governança tiver seu lugar.

A estrutura e a organização dos Poderes Legislativo, Executivo e Judiciário, os costumes e outras normas informais amplamente aceitas, as características da competição de interesses na sociedade e a capacidade administrativa de cada país compõe um conjunto de critérios que segundo os autores determina e influencia as opções regulatórias em cada país.

Essa determinação e influência ocorrem na medida em que essas instituições endógenas restringem as ações arbitrárias do governo. Ao analisar empiricamente alguns países, os autores demonstram que cada país resolve seus conflitos regulatórios de um modo. O que explica essa variação é a diferença entre o desenho institucional de cada país. Isso significa que, se um país dispõe de instituições que se mostrem mais capazes de conter a ação discricionária do regulador do que outro, esse país provavelmente irá dispor de mais credibilidade e, por essa razão, poderá contar com mecanismos regulatórios que outro país com menos credibilidade não teria sucesso se o adotasse.

Fabrizio Gilardi (2003), ao elaborar roteiro de avaliação das agências reguladoras, enumera mais detalhadamente alguns argumentos que, segundo ele, explicam a rationale por trás da criação das agências reguladoras. Os argumentos são diferenciados como positivos ou normativos, sendo que os primeiros têm por objetivo explicar os padrões observados para o estabelecimento das agências e os normativos se caracterizam como prescrições.

• Expertise – as agências reguladoras estão mais próximas dos setores regulados do que outros núcleos burocráticos e, desse modo, podem mais facilmente obter informações relevantes. Sua estrutura organizacional mais flexível também constitui ambiente de trabalho mais atraente para especialistas, tornando-os, desse modo, mais dispostos a trabalhar em agências do que em núcleos burocráticos tradicionais.

• Flexibilidade – agências reguladoras autônomas mostram-se mais capazes de flexibilizar suas decisões adotando ajustes regulatórios.

• Compromisso com credibilidade – as agências reguladoras são insuladas das influências políticas e das pressões eleitorais rotineiras. Seus dirigentes, tendo mandatos mais longos, têm também a possibilidade de trabalhar com perspectivas de longo prazo, ao contrário dos políticos. Desse modo, as agências adquirem credibilidade junto ao mercado e às comissões governamentais voltadas para a busca de uma regulação justa.

• Estabilidade – as agências reguladoras favorecem estável e previsível ambiente regulatório. Por estar contida no desenho das agências, faz que o mercado não tema mudança inesperada das regras. A estabilidade apenas cria ambiente amigável ao investidor, assegurando-lhe que os mecanismos regulatórios não sofrerão mudanças súbitas.

• Eficácia e eficiência – como resultado dos fatores citados anteriormente, as agências reguladoras conduzem a um melhor resultado regulatório, que pode ser traduzido em melhor desempenho dos mercados.

• Participação pública e transparência – o processo decisório das agências reguladoras é mais aberto e transparente que outros núcleos burocráticos e, assim, é mais sensível aos interesses sociais difusos, como os dos consumidores. Abertura e transparência no processo decisório não são apenas meio, mas fim em si mesmo e estão relacionadas ao accountability.

• Custos da tomada de decisão – a delegação para as agências reguladoras reduz os custos da tomada de decisão, como pode ser observado na presença de desacordos sobre determinadas políticas, nas quais maiorias são mais facilmente formadas para “deixar alguém mais decidir”, especialmente se perdas e ganhos não são muito claros.

• Transparência de responsabilidades – as agências reguladoras permitem aos políticos evitar responsabilidades quando ocorrem falhas ou quando decisões impopulares são tomadas. Esse comportamento é adotado pelo desejo de transferir responsabilidade nos casos em que os problemas tendem a atingir maiores proporções e os custos políticos podem pesar mais que os benefícios.

• Incertezas políticas – as instituições são menos facilmente mutáveis que as políticas e as agências reguladoras constituem um meio de os políticos fixarem políticas que irão perdurar além de seus mandatos.

Gilardi (2004), por sua vez, observando as razões que motivaram a criação das agências reguladoras, nota agora por outro prisma sua criação e difusão. Ele classifica as motivações básicas por trás da criação das agências a partir das três ramificações do neoinstitucionalismo: a escolha racional, o institucionalismo sociológico e o histórico.

ACCOUNTABILITY E TRANSPARÊNCIA

O termo accountability refere-se a ideia de responsabilização, refere-se ao controle e à fiscalização dos agentes públicos. Porém ainda não possuímos um consenso em relação ao seu conceito. Alguns autores defendem a noção menos abrangente do termo, que não compreende em seus limites as relações informais de fiscalização e controle, não considerando assim como agentes de accountability, a imprensa e organizações da sociedade civil que comumente se incumbem de monitorar e denunciar abusos e condutas sem ética de agentes públicos no exercício do poder. Outros autores admitam um rol de relações bem mais abrangente, estipulando que tais relações devem necessariamente incluir a capacidade de sanção aos agentes públicos.

Na tentativa de interpretar o termo, em que se pese, accountability implica não apenas responsabilização do governante ou burocrata, mas também a capacidade de o agente fiscalizador demandar justificação do governante ou burocrata por seus atos ou omissões. Entende-se que accountability significa manter indivíduos e organizações passíveis de serem responsabilizadas pelo seu desempenho, sendo, portanto, um conjunto de abordagens, mecanismos e práticas usados pelos atores interessados em garantir um nível e um tipo desejados de desempenho dos serviços públicos.

No fim dos anos 1980 as ciências sociais passaram a incorporar em suas análises a necessidade de desenvolvimento de instrumentos de accountability e transparência das decisões públicas como tarefa inadiável das novas democracias. Cidadania, sociedade organizada, engajamento cívico, interesses, representação, prestação de contas, controle, punição, boa governança e poder.

Com o crescimento da ideia de Estado Regulador, atualmente os conceitos de accountability e transparência assumem papéis centrais, tendo em vista o deslocamento de poder que se observa nessa nova ordem pós-reformas. Hoje ambos são cruciais para manter o regime regulatório em um subsistema de resultados e políticas.

A moderna reforma regulatória traz em seu bojo arcabouço teórico que sustenta que agências reguladoras autônomas representam importante inovação institucional no que tange à democratização da tomada de decisão. Isso ocorre porque essa modalidade de reforma tem como substrato ideológico uma doutrina ou um conjunto de interpretações administrativas, o New Public Management, que incorpora a introdução de novos conceitos como o de “cidadão consumidor” e “boa governança”, por exemplo. Além disso, essa ideologia incorpora presunção da necessidade do predomínio da razão sobre a política, fundamentada na superioridade da especialização técnica e em detrimento da representação de interesses. Em ambiente regulatório com as características citadas, accountability e transparência seriam favorecidos e ocorreriam quase que naturalmente. Porém, na prática, essa naturalização não se observa e a introdução de mecanismos de controle é quase sempre acompanhada de fortes resistências.

A percepção dos limites de accountability e transparência nos regimes regulatórios têm sido um dos principais pontos de crítica pela mídia, pela opinião pública, pelos investidores e os chamados grupos de interesses, segundo Lodge (2004). O debate compreende desde a questão dos reguladores serem continuamente obrigados a se reportar às comissões do parlamento, até quão transparentes devem ser as decisões públicas tomadas no âmbito das agências em relação a outros departamentos do governo, à indústria ligada ao setor, aos investidores e mais amplamente aos cidadãos.

Além das mudanças na estrutura formal de decisão, transferindo poder a agências independentes, a reforma regulatória propiciou também variedade de novos atores atuando nos mais diversos níveis decisórios, envolvendo departamentos de governo, políticos, população-alvo, firmas, investidores e um grande público. Na medida em que todos esses atores passam a formular suas demandas, entre elas está também a inclusão de transparência nos processos e maior prestação de contas por parte dos decisores. Assim, a própria mudança política passa a requerer dinâmica decisória mais accountable e transparente.

Contudo, é possível notar que a reforma regulatória ao mesmo tempo em que favoreceu a demanda por accountablity e transparência com a ampliação dos atores envolvidos favoreceu também a deterioração, a literatura vem reforçando a ideia de supervisão das agências independentes pelo parlamento (LIMA; BOSCHI, 2004; LODGE, 2004; SCOTT, 2000) e via mecanismos verticais de controle (CRUZ, 2006).

Accountability e transparência nos regimes regulatórios

FIDUCIARY

TRUSTEESHIP CONSUMER

SOVEREIGNTY CITIZEN

EEMPOWERMENT

Processo decisório voltado para a fixação de normas Legislativo e processo decisório tecnocrático Competição entre um conjunto de regras e escolha individual Retórica da inclusão de distintos pontos de vista

Transparência das regras a serem seguidas Padrões profissionais e legalidade Obrigações contratuais e leis de competição Publicidade das normas e acesso às regras procedimentais

Accountability e transparência das atividades reguladas Supervisão por meio do controle dos especialistas, competição política, representação dos consumidores Competição e critérios definidos, revelação das informações exigidas, foco no indivíduo Supervisão por meio das leis de participação

Accountability e transparência dos controles sobre as atividades reguladas Informação das responsabilidades e legalismo Competição entre normas e entre agências, mecanismos de escolha, revelação de informações e correção legal Envolvimento, supervisão de mandato, envolvimento de grupos de interesse

Accountability e transparência na avaliação dos processos Revisão por especialistas (comissões e força tarefa) Evolução da ordem competitiva, ajuste mútuo por meio dos processos de descoberta Participação imediata, inclusão de bases afetadas

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Ante o exposto, essa análise conclui que o que propõem os reformadores, com base em todas as teses sobre reforma regulatória, bem como a defesa de seus méritos é, em grande medida, fruto da interpretação que esse grupo tem da política propriamente. Embora discordem e possam negar veementemente, os governos reformadores que levam a cabo a reforma regulatória dos anos 1980 e 1990 na Europa e na América Latina possuem a mesma fonte ideológica – o liberalismo -, a partir do qual se explica a crença inabalável no desempenho do mercado. Além disso, nota-se que esses atores veem a política não como disputa ou arena de conflitos de interesses, mas como busca por instituições ideais e regras para regulação da vida social.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

• http://octalberto.no.sapo.pt/regulamnetacao_do_mercado.htm

• http://academico.direito_rio.fgv.br/wiki/O_Direito_Administrativo_na_atual_ordem_econ%C3%B4mica_constitucional:_O_Estado_regulador,_o_Programa_Nacional_de_Desestatiza%C3%A7%C3%A3o,_as_reformas_constitucionais_e_as_privatiza%C3%A7%C3%B5es

• http://www.ebah.com.br/content/ABAAABdSYAF/estado-regulador

• GIAMBIAGI, Fábio & ALÉM, Ana Cláudia de. Finanças Públicas: teoria e prática no Brasil. 7 ed. Rio: Campos, 2000.p.401-421.

• MATTOS, Paulo Todescan Lessa. O Novo Estado Regulador no Brasil: Eficiência e Legitimidade. São Paulo: Catavento, 2007.

• GILARDI, Fabrizio. Institutional change in regulatory policies: regulating through independent agencies and the three new institutionalisms. In: JORDANA, Jacint; LEVI-FAUR, David. The politics of regulation: institutions and regulatory reforms for the age of governance. Northampton, MA: Edward Elgar, 2004.

• http://pt.scribd.com/doc/216637066/Estado-e-Regulacao-Veronica-Cruz

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