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Formação Geral

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Por:   •  26/3/2015  •  1.463 Palavras (6 Páginas)  •  191 Visualizações

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O ATO DE LER E A FORMAÇÃO DO LEITOR CRÍTICO

O ato de ler é um processo abrangente e complexo; é um processo de compreensão, de intelecção de mundo que envolve uma característica essencial e singular ao homem: a sua capacidade simbólica e de interação com o outro pela mediação da palavra. Da palavra enquanto signo, variável e flexível, marcado pela mobilidade que lhe confere o contexto. Contexto entendido não só no sentido mais restrito de situação imediata de produção do discurso, mas naquele sentido que enraíza histórica. E socialmente o homem. É tendo no horizonte essa concepção de palavra enquanto signo vivo, dialético, voltado para o outro, que nossas preocupações sobre a leitura têm sido suscitadas.

Nesse sentido, a recepção de um texto nunca poderá ser entendida como um ato passivo, pois quem escreve o faz pressupondo o outro, o leitor, quer seja ele empírico, real, quer seja ele virtual. É isso que leva Eco a afirmar:

"Um texto é emitido para que alguém o atualize mesmo quantia não se espera (ou não se deseja) que esse alguém exista concreta e empiricamente". Assim, um texto só se completa com o ato de leitura na medida em que é atualizado, é operado linguística e tematicamente por um leitor. Lembrando de novo Eco (op. cit.), "um texto quer alguém que

o ajude a funcionar".

Se um texto é marcado por sua incompletude e só se completa no ato de leitura; se o leitor é aquele que vai fazer "funcionar" o texto, na medida em que o opera através da leitura, o ato de ler não pode se caracterizar como uma atividade passiva. Ao contrário, para essa concepção de leitura, o leitor é um elemento ativo no processo.

A interação leitor-texto se faz presente desde a origem do texto: "operar um texto significa atuar segundo uma estratégia que inclui as previsões dos movimentos do outro". Um texto bem-formado, entendendo-se por bem-formado não apenas aquele que leva em consideração os aspectos linguísticos (níveis morfológico, sintático) e semânticos (nível da significação), mas também pragmáticos (relação texto-contexto, condições de produção), traz em seu bojo, desde o momento inicial de sua concepção/produção, uma preocupação com o seu destinatário: "Um texto postula o próprio destinatário como condição indispensável não só da sua própria capacidade comunicativa concreta, como também da própria potencialidade significativa".

Traduzindo as palavras de Eco e ampliando seu horizonte com as colocações de Bakhtin, podemos afirmar que o leitor se institui no texto em duas instâncias:

- no nível pragmático, o texto enquanto objeto veiculador de uma mensagem está atento em relação ao seu destinatário, mobilizando estratégias que tornem possível e facilitem a comunicação. Na perspectiva bakhtiniana, o outro, na figura do destinatário, se instala no próprio movimento de produção do texto na medida em que o autor orienta a sua fala tendo em vista o público-alvo selecionado. Tem-se, ainda, o outro na figura do interdiscurso, do diálogo que todo texto trava com outros textos. Cabe ao leitor mobilizar seu universo de conhecimento para dar sentido, resgatar essa interdiscursividade, a fonte enunciativa desses outros discursos que atravessaram o texto;

- no nível linguístico-semântico, o texto é uma "potencialidade significativa" que se atualiza no ato da leitura, levado a efeito por um leitor instituído no próprio texto, capaz de reconstruir o universo representado a partir das indicações, pistas gramaticais, que lhe são fornecidas. É o movimento da leitura, o trabalho de elaboração de sentidos que dá concretude ao texto.

O texto, na sua superfície linguística, não diz tudo objetivamente. Em graus diferentes de complexidade, um texto é sempre lacunar, reticente. Segundo ISER, apresenta "vazios" - implícitos, pressupostos, subentendidos - que, enquanto espaço disponível para o outro, devem ser preenchidos pelo leitor.

A operação do leitor para pôr em funcionamento o texto é uma atividade cooperativa de recriação do que é omitido, de preenchimento de lacunas, de desvendamento do que se oculta nos interstícios do tecido textual. Esse trabalho de recriação, entretanto, se faz dentro de determinados limites, sendo balizado por uma série de elementos, tais como:

. a existência de uma base textual que supõe um sistema linguístico de domínio comum ao do locutor;

. a necessidade de conhecimentos relevantes partilhados com os que o texto trabalha;

. a pressuposição de que uma coerência temática preside a construção do texto;

. a necessidade da presença mínima ou suficiente de contextos situacionais de espaço e de tempo.

É um trabalho de atribuição de sentidos assentado na colaboração mútua em que a interação leitor-texto se faz através de contratos e negociações bilaterais. O texto se transforma, então, numa proposta de sentido com múltiplas possibilidades de interpretação, colocando-se o locutor entre dois movimentos:

- um movimento de expansão: por ser lacunar, o texto permite a proliferação de sentidos;

- um movimento de filtragem: o locutor restringe essa proliferação, seleciona a interpretação pertinente.

O leitor situa-se, portanto, num espaço ambíguo entre a disseminação de sentidos possíveis e as restrições inscritas nos artefatos que organizam o texto. Ou ainda, para usar a linguagem de Eco, todo trabalho de leitura pressupõe estar atento à dialética entre forma e abertura, entre obra e intérprete.

Dialetizando também a relação leitor-texto, Maingueneau faz a seguinte observação sobre a obra literária, que pode ser estendida a qualquer outro tipo de texto: "toda obra verdadeira, no curso do seu processo enunciativo, ‘forma’ seu leitor". Se no processo enunciativo um texto "forma" o seu próprio leitor, indica-lhe os processos de leitura, de outro

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