Lições Preliminares de Direito - Reale, Miguel
Tese: Lições Preliminares de Direito - Reale, Miguel. Pesquise 862.000+ trabalhos acadêmicosPor: isaac2 • 21/11/2013 • Tese • 3.475 Palavras (14 Páginas) • 520 Visualizações
Lições Preliminares de Direito – Reale, Miguel
LIÇÕES PRELIMINARES DE DIREITO – Reale, Miguel
CAPÍTULO I
OBJETO E FINALIDADE DA INTRODUÇÃO AO ESTUDO DO DIREITO
SUMÁRIO: Noção elementar de Direito. Multiplicidade e unidade do
Direito. Complementaridade do Direito. Linguagem do Direito. O Direito
no mundo da cultura. O Método no Direito. Natureza da Introdução ao
Estudo do Direito.
NOÇÃO ELEMENTAR DE DIREITO
Como poderíamos começar a discorrer sobre o Direito sem admitirmos,
como pressuposto de nosso diálogo, uma noção elementar e provisória da
realidade de que vamos falar?
Um grande pensador contemporâneo, Martin Heidegger, afirma com razão
que toda pergunta já envolve, de certa forma, uma intuição do perguntado. Não se
pode, com efeito, estudar um assunto sem se ter dele uma noção preliminar,
assim como o cientista, para realizar uma pesquisa, avança uma hipótese,
conjetura uma solução provável, sujeitando-a a posterior verificação.
No caso das ciências humanas, talvez o caminho mais aconselhável seja
aceitar, a título provisório, ou para princípio de conversa, uma noção corrente
consagrada pelo uso. Ora, aos olhos do homem comum o Direito é lei e ordem,
isto é, um conjunto de regras obrigatórias que garante a convivência social graças
ao estabelecimento de limites à ação de cada um de seus membros. Assim sendo,
quem age de conformidade com essas regras comporta-se direito; quem não o
faz, age torto.
Direção, ligação e obrigatoriedade de um comportamento, para que possa
ser considerado lícito, parece ser a raiz intuitiva do conceito de Direito. A palavra
lei, segundo a sua etimologia mais provável, refere-se a ligação, liame, laço,
relação, o que se completa com o sentido nuclear de jus, que invoca a idéia de
jungir, unir, ordenar, coordenar.
Podemos, pois, dizer, sem maiores indagações, que o Direito corresponde
à exigência essencial e indeclinável de uma convivência ordenada, pois nenhuma
sociedade poderia subsistir sem um mínimo de ordem, de direção e solidariedade.
É a razão pela qual um grande jurista contemporâneo, Santi Romano, cansado de
ver o Direito concebido apenas como regra ou comando, concebeu-o antes como
“realização de convivência ordenada”.
De “experiência jurídica”, em verdade, só podemos falar onde e quando se
formam relações entre os homens, por isso denominadas relações intersubjetivas,
por envolverem sempre dois ou mais sujeitos. Daí a sempre nova lição de um
antigo brocardo: ubi societas, ibi jus (onde está a sociedade está o Direito). A
recíproca também é verdadeira: ubi jus, ibi societas, não se podendo conceber
qualquer atividade social desprovida de forma e garantia jurídicas, nem qualquer
regra jurídica que não se refira à sociedade.
O Direito é, por conseguinte, um fato ou fenômeno social; não existe senão
na sociedade e não pode ser concebido fora dela. Uma das características da
realidade jurídica é, como se vê, a sua socialidade, a sua qualidade de ser social.
Admitido que as formas mais rudimentares e toscas de vida social já
implicam um esboço de ordem jurídica, é necessário desde logo observar que
durante milênios o homem viveu ou cumpriu o Direito, sem se propor o problema
de seu significado lógico ou moral. É somente num estágio bem maduro da
civilização que as regras jurídicas adquirem estrutura e valor próprios,
independente das normas religiosas ou costumeiras e, por via de conseqüência, é
só então que a humanidade passa a considerar o Direito como algo merecedor de
estudos autônomos.
Essa tomada de consciência do Direito assinala um momento crucial e
decisivo na história da espécie humana, podendo-se dizer que a conscientização
do Direito é a semente da Ciência do Direito.
Não é necessário enfatizar a alta significação dessa conversão de um fato
(e, de início, o fato da lei ligava-se, como veremos, ao fado, ao destino, a um
mandamento divino) em um fato teórico, isto é, elevado ao plano da consciência
dos respectivos problemas.
Não é demais salientar essa correlação essencial entre o Direito como fato
social e o Direito como ciência, a tal ponto que, ainda hoje, a mesma palavra serve
para designar a realidade jurídica e a respectiva ordem de conhecimentos. Tem
razão Giambattista Vico, pensador italiano do início do século XVIII, quando nos
ensina que verum ac factum convertuntur, o verdadeiro e o fato se convertem.
É difícil, com efeito, separar a
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