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Torres De Santa Tereza

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Por:   •  28/11/2014  •  1.767 Palavras (8 Páginas)  •  422 Visualizações

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Torres de Santa Teresa: o direito à moradia e o acesso à própria casa

“Foi naquele lá, olha. Naquele. Tá vendo?” Eles apontavam para o apartamento do 7o andar, onde houve o incêndio. A mancha preta ao redor de uma janela evidenciava o ocorrido. Mais abaixo, logo ali no 4o, Anastasia, Aécio e Itamar sorriam amarelo.

A chegada de Raquel Rolnik, Relatora Especial do Conselho de Direitos Humanos da ONU para o Direito à Moradia Adequada, envolvia grandes expectativas. Pequenos grupos se formavam enquanto a polícia marcava, ostensiva, o território. O incêndio queimou um apartamento do edifício de número 100 da rua Clorita, nas chamadas Torres Gêmeas, no Bairro Santa Tereza, em Belo Horizonte. Ocorreu há cerca de um mês. Desde então, os mais de 300 moradores estão vivendo em abrigos, barracas, ou em casas de familiares e amigos. Aguardam, em sua ansiedade passiva, um laudo da prefeitura, enquanto policiais do batalhão de choque da polícia militar, munidos de metralhadoras e outras armas menores, guardam as entradas do prédio.

As Torres Gêmeas foram ocupadas em 1995 depois de vendidas mas abandonadas pela construtora.1 Em 2004, a Associação de moradores foi habilitada no Edital do Programa de Crédito Solidário da CAIXA, gerido pelo Ministério das Cidades. O projeto previa financiamento dos custos de desapropriação e da reforma do prédio. O custo por família da reforma seria de menos de 20 mil reais – consideravelmente inferior ao valor médio gasto na construção de habitações populares pela prefeitura de Belo Horizonte. A reforma ainda minimizaria impactos sociais, já que os moradores poderiam permanecer na região onde trabalham e onde estudam seus filhos.

Os projetos não foram levados adiante. Os moradores continuaram ali. Como é de praxe, com poucas garantias e nenhum apoio dos órgãos públicos que existem, teoricamente, para protegê-los. Até o momento, a prefeitura atuou pelo descaso. “Mas agora, já viu né? Tem a copa do Mundo”, e “Agora construíram o shopping”, afirmam os moradores, conscientes (e conformados) dos interesses que movem a política local e de seu papel num jogo social histórico: obedecer e agradecer.

O incêndio foi a ocasião que muitos esperavam para despejar as famílias. O shopping tem sua inauguração prevista para os próximos dias. A copa do mundo, no que diz respeito à especulação imobiliária, já começou, com vencedores e perdedores. Por enquanto, só perdedores. Os moradores das torres muito dificilmente conseguirão permanecer ali, ou até mesmo nas proximidades. As Torres Gêmeas são o exemplo concreto de um modelo político-social que persevera, robusto. Interesses econômicos são dissimulados em discursos de segurança e violência. Ideais de limpeza higienista e progresso prevalecem sobre o civismo mais elementar.

A intolerância aniquila as possibilidades de compartilharmos a cidade. Continuamos a patinar no atraso.

Márcio Lacerda, prefeito de Belo Horizonte, no entanto, entrará para a história como o prefeito que “resolveu o problema” das torres. Os atuais moradores serão facilmente esquecidos – assim como os Piores de Belô e os muitos outros que estiverem no caminho modernizante que a prefeitura vem abrindo com ímpeto autoritário de trator.

Rolnik relatou a posição impassível do prefeito e re-afirmou aos moradores seus direitos. Mas não trouxe novidades:

“(…) Vim aqui fazer essa visita, vim a Belo Horizonte, não como relatora, [mas] porque fui convidada a fazer uma palestra na universidade. Mas o pessoal me convidou para conhecer as ocupações em Belo Horizonte, visitar Dandara, as Torres Gêmeas, ouvir e ver como está a situação. Aí eu falei, quero sim.

Pedi também, antes de vir para cá, pedi para conversar com o prefeito de Belo Horizonte porque queria ouvir, eu, da boca dele, o que ele tinha a dizer sobre a situação. Eu sabia que vinha aqui, então eu queria ouvir também, porque é uma postura que a gente tem, de sempre ouvir os vários lados, não sair com a impressão só de um lado. Então fui ouvir o prefeito e o que ele tem a dizer sobre essa situação que vocês estão vivendo; e vim fazer esta visita.

Estou absolutamente chocada e preocupada com que estou vendo aqui, estou vendo na cara de todo mundo que está aqui olhando para mim uma angustia muito grande, uma angustia de não saber o que vai acontecer, como vai ser amanhã, vou ter ou não onde morar e onde será isso, vou poder ficar aqui, não vou poder ficar. E acho que esta angustia que estou vendo aqui e esta situação é uma situação que contraria e que nega a moradia como um direito humano, porque não é certo, não é justo, que as pessoas vivam em uma situação de angustia e de precariedade como vocês estão vivendo aqui. Infelizmente minha expectativa quando fui conversar com o prefeito era de poder depois vir aqui e lá no Dandara tentar dar uma boa notícia. Falei bom, quem sabe eu, como relatora da ONU, [vou] lá conversar com o prefeito, e depois eu vou lá, vou conversar com o pessoal, e vou poder oferecer alguma esperança, alguma saída, alguma solução.

Infelizmente não foi o que eu ouvi hoje da boca do prefeito.

O prefeito não apresentou, para mim pelo menos, nenhuma proposta, de saída, de solução, para a situação que está sendo vivida aqui. Ouvi da boca dele que a prefeitura considera que aqui, isso não pode ser transformado em uma política de moradia de reforma com crédito solidário, etc. Essa é a posição do prefeito, essa é a posição dele.

Mas de qualquer maneira eu disse a ele, e vou repetir aqui o que disse a ele: que eu tenho uma absoluta convicção e certeza, seja reformando este prédio neste lugar, ou seja em outro lugar, não é possível, não é possível, que tenha qualquer tipo de despejo ou de desocupação sem que uma alternativa seja apresentada, e alternativa tem que ser uma alternativa de moradia digna, duradoura, não provisória.

E nesse sentido, o abrigo não é uma alternativa, porque o abrigo é uma situação provisória, não é uma situação de moradia, é uma situação de apoio, é uma situação de emergência, de quem está na rua, e num dia frio precisa ter um teto, precisa ter um cobertor, precisa ter um banho. Abrigo não é uma situação para uma família, não é uma situação permanente, não é uma solução de moradia realmente permanente. Outras soluções tem que acontecer. Não necessariamente (eu quero deixar isso muito claro, porque essa é minha posição), não necessariamente cada família ser dona

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