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Consolidação Da Paz Numa Perspetiva Crítica: O Caso De Timor-Leste

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Por:   •  19/11/2014  •  6.189 Palavras (25 Páginas)  •  300 Visualizações

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Os processos de intervenção externa em contextos de violência e/ou pós‑violência têm sido analisados sob perspetivas diferenciadas. Em termos teóricos, as abordagens mais tradicionais de resolução de conflitos, centradas em modelos problem‑solving e com uma componente neoliberal e institucional forte, assente em lógicas top‑down, têm‑se confrontado com as perspetivas mais críticas, numa lógica mais interpretativa e de questionamento das bases do modelo neoliberal, dando maior atenção às práticas locais numa lógica de articulação e diferenciação entre o tradicional top‑down e o menos consensual bottom‑up. A intervenção de organizações internacionais, como as Nações Unidas (NU), ou mesmo organizações de caráter regional, que se associam ao modelo onusiano, em que encontram legitimidade, tem permitido a perpetuação de um modelo de intervenção muito centrado no desenvolvimento de projetos a nível institucional, nem sempre dando a devida atenção a outras áreas de atuação. Esta abordagem favorece a promoção de uma ‘paz institucional’, que não integra muitas vezes como dimensões centrais da sua consolidação e sustentabilidade o desenvolvimento de cultura e práticas políticas democráticas, por exemplo, em contextos onde estas são muitas vezes inexistentes. Além do mais, esta abordagem à paz descura em grande medida a articulação com o nível local, limitando‑a a contactos com as elites, que muitas vez traduzem a lógica do mandato e acabam por contribuir para a reprodução de práticas sociais ao nível dessas elites numa lógica imitativa, evitando desse modo o desenvolvimento de dinâmicas integradas entre atores e práticas externas e contextos e agentes locais, informadas por dinâmicas de inclusão e cariz emancipatório.

2Partindo do debate sobre intervencionismo e em particular discutindo a abordagem das Nações Unidas em termos de manutenção e construção da paz, este artigo introdutório ao número especial sobre ‘Consolidação da paz em Timor‑Leste’ adota uma leitura crítica de ações e reações, discurso e prática, bem como de terminologias adotadas e praticadas, sem consensualização quanto a conteúdos. O artigo analisa em particular a intervenção das Nações Unidas em Timor‑Leste, procurando identificar os principais contributos e limites da organização na promoção da paz, segurança e estabilidade no país como contexto dos números que se seguem. O texto conclui com o entendimento de que é necessário procurar equilíbrios na gestão destes processos complexos de intervenção, partindo do reconhecimento do contributo que estas presenças externas pode efetivamente significar em termos de consolidação da paz, embora questionando abordagens, e sugerindo uma melhor articulação entre instrumentos e práticas na operacionalização de mandatos.

3Entendendo que a doutrina onusiana em matéria de intervenção evoluiu consideravelmente nos últimos anos no sentido de incluir dimensões menos tradicionais na agenda, como o reconhecimento de que práticas de consolidação da paz devem acompanhar os instrumentos de manutenção da mesma numa lógica integrada; de que o envolvimento da dimensão local nas suas diversas facetas deve ser tido em especial consideração, evitando sentimentos de alienação e promovendo corresponsabilização nos processos (ver Tschirgi, neste volume); e de que apesar dos muitos instrumentos à disposição das NU nem sempre a sua utilização revela uma dinâmica pragmática de resposta às necessidades efetivas, este texto analisa o caso específico de Timor‑Leste como ilustrativo de alguns destes desajustes e de como, através de posturas de maior ou menor resistência e acomodação, os contextos locais refletem esta necessidade de uma resposta integrada para a construção de uma paz também ela integrada.

Intervenção externa: manutenção e construção da paz

4Os debates em torno do intervencionismo global têm ganho novo dinamismo face aos desafios crescentes que surgem resultantes de novos contextos, de novos atores, e mesmo de novas práticas doutrinárias. Apesar da abrangência que estes debates têm assumido, e não pretendendo uma identificação exaustiva dos mesmos, assinalamos aqui três ordens de ideias que nos parecem fundamentais para esta reflexão. Primeiro, em termos teóricos, e como referido acima, as abordagens mais tradicionais de resolução de conflitos, assentes em pressupostos neoliberais como a matriz dominante caraterizadora das intervenções e face à qual os resultados devem ser mensurados, bem como prosseguindo pressupostos teóricos do realismo onde as dinâmicas de poder dominam os debates (Doyle e Sambanis, 2006), têm sido desafiadas por perspetivas mais críticas, assentes em quadros de análise mais inclusivos e que interpretam lógicas de poder não apenas numa ótica de soma nula e de ganhos relativos no posicionamento internacional, mas nas suas implicações mais profundas ao nível das configurações sociais e políticas em ambos os planos interno e externo (ver Tschirgi, neste volume). Quadros de emancipação, políticas de equidade, práticas inclusivas e abordagens estruturais às questões centrais são algumas das linhas diferenciadoras destas abordagens. O distanciamento do quadro neoliberal dominante é, deste modo, prosseguido, trazendo a discussão a necessidade de reformulação de matrizes orientadoras dos processos de intervenção, para que lógicas de dominação deem lugar a lógicas de inclusão, e políticas de imposição deem lugar a políticas emancipatórias. Este quadro normativo reflete‑se no debate sobre estratégias marcadamente top‑down, cujo centro de atuação são os decisores e as elites políticas, e outras de natureza bottom‑up, incidindo essencialmente em atores locais e no seu contributo para dinâmicas de construção da paz (Paris, 1997; Bellamy e Williams, 2004; Paris e Sisk, 2009), entendendo estes como agentes por excelência destes processos dado o historial associado à emergência da violência, às formas tradicionais de lidar com esta e a um conhecimento mais profundo de procedimentos e práticas relativos a especificidades locais em matéria diversa – política, económica, social e cultural –, que são cruciais a uma resposta mais adequada às necessidades, bem como às expetativas.

5Segundo, em termos concetuais, os debates têm apontado para o significado dos ‘rótulos’ associados às intervenções, classificando‑as, entre outros, como de manutenção da paz, construção da paz, consolidação da paz, promoção da paz, quanto aos seus objetivos; definindo esta paz como positiva ou negativa por relação à forma como estes objetivos são operacionalizados; classificando os contextos da intervenção como falhados

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