Porra Nunheuma
Dissertações: Porra Nunheuma. Pesquise 862.000+ trabalhos acadêmicosPor: danieleamo • 30/9/2014 • 3.852 Palavras (16 Páginas) • 340 Visualizações
que, embora correlacionados com o tema, com ele não se confundem. São eles: o abuso de poder e o excesso de poder.
Primeiramente, deve-se destacar a importante referência feita pelo Professor Hely Lopes Meirelles acerca do assunto. Para este Autor,
“O uso do poder é prerrogativa da autoridade. Mas o poder há que ser usado normalmente, sem abuso. Usar normalmente do Poder é empregá-lo segundo as normas legais, a moral da instituição, a finalidade do ato e as suas exigências do interesse público. Abusar do poder é empregá-lo fora da lei, sem utilidade pública. O poder é confiado ao administrador público para ser usado em benefício da coletividade administrativa, mas usado nos justos limites que o bem-estar social exigir. A utilização desproporcional do poder, o emprego arbitrário da força, a violência contra o administrado, constituem formas de uso do poder estatal, não toleradas pelo Direito e nulificadoras dos atos que as encerram (...)”4.
Logo, qualquer subversão à estrutura legal, isto é, uma manifestação em desacordo com a lei ou sua finalidade, ensejará a ilegalidade, a qual pode se manifestar de diferentes maneiras. A uma, pela falta de competência legal (excesso de poder); a duas, pelo não atendimento do interesse público (desvio de poder).
No excesso de poder, o agente público atua sem competência, seja por sua total ausência, seja por extrapolar os limites da competência que lhe foi legalmente atribuída, exorbitando, assim, suas faculdades administrativas e, consequentemente, incorrendo em ofensa formal à lei.
Já no desvio de poder, a autoridade age dentro dos limites da sua competência, mas o ato não atende o interesse público enunciado na norma que lhe atribuiu competência para agir, ferindo, portanto, os objetivos por ela colimados, razão pela qual incorre em violação ideológica da lei.
Embora aparente semelhança com o desvio de finalidade, com ele não se confunde. No desvio de finalidade o ato administrativo é ilegal, portanto nulo. No excesso de poder o ato praticado não é nulo por inteiro, prevalece naquilo que não exceder.
Em síntese, pode-se dizer que o abuso de poder é gênero enquanto o desvio e o excesso de poder são espécies desse gênero.
3 - Raízes Históricas do Desvio de Poder
O termo “desvio de poder” ou “détournement de pouvoir” tem origem no Conselho de Estado francês. A teoria do desvio de poder (ou de finalidade) é fruto de construção da jurisprudência do Conseil d´Etat francês (contencioso administrativo) como um limite à ação estatal, um freio ao transbordamento da competência legal. Buscou-se, pois, reprimir ou fazer cessar os abusos inerentes à natureza humana e egoísmo dos agentes públicos.
Embora não tenha sido o primeiro caso a respeito do tema, a situação apontada pela doutrina como de maior repercussão ocorreu em 1964. Trata-se do caso “Lesbats”, que passou a informar o Direito Administrativo francês como um todo a respeito da teoria em comento.
No mencionado “leading-case”, o Prefeito da cidade francesa de Fontanebleau proibiu um motorista de estacionar o seu ônibus no pátio interno da Estação Ferroviária daquela cidade. O objetivo da proibição seria assegurar o cumprimento de contrato celebrado entre a empresa ferroviária e outro proprietário de ônibus, por meio do qual somente este último teria o direito de estacionar e desembarcar seus passageiros. Texto de lei anterior previa poderes à autoridade pública de regular o estacionamento e a circulação de veículos. Entretanto, o Conselho de Estado anulou a decisão do Prefeito, por entender que este não poderia exercer seus poderes de polícia para fins estranhos à manutenção da ordem e a organização do trânsito. Posteriormente, o Prefeito editou nova regulamentação, ainda restritiva, que foi anulada com fundamento no desvio de poder pelo mesmo contencioso administrativo segundo relata o professor Cretella Junior14.
A respeito do caso, comenta o mestre:
“(...) Cumpre, assim, assinalar com precisão este caso que, levando o Conselho de Estado a manifestar-se, deu como conseqüência, a acolhida do desvio de poder (détournement de pouvoir) como vício do ato administrativo bastante para permitir fosse invocado o remedium júris anulatório competente – o recurso por excesso de poder (recours por excès de pouvoir) para fulminar, irremediavelmente, o ato viciado (...). No caso citado, o Prefeito a quem o texto legal anterior conferira poderes para regulamentar o estacionamento e a circulação de veículos públicos e particulares, destinados ao transporte de pessoas e mercadorias, nos pátios anexos a estações rodoviárias, com fins de polícia e com finalidades de manter a boa ordem nos lugares destinados a uso público passou a usar abusivamente de tais poderes, a fim de assegurar o monopólio dos transportes de empresa particular. Tal determinação foi anulada pelo Conselho de Estado, por excesso de poder, já que o Prefeito usara da autoridade de que era detentor para fim diverso daquele que a lei tivera em mira (cf. Oreste Ranelletti, Teoria degli Atti Amministrativi Speciali, 7ª ed.1945, p.81)”
No ordenamento jurídico brasileiro a teoria foi acolhida de maneira diversa, já que a teoria do desvio de finalidade aqui foi admitida primeiramente pela doutrina pátria. A inserção da mesma nos tribunais ocorreu em momento posterior.
É relevante ressaltar que nunca houve no ordenamento pátrio uma legislação específica que tratasse especificamente do desvio de poder, o que não significa que o direito brasileiro não tenha acolhido a teoria do desvio de finalidade. Pelo contrário. Conforme demonstrado alhures, a tendência atual é que a teoria seja aplicada mais frequentemente nos Tribunais pátrios.
Ela incorporou-se de fato dentro de nossos Tribunais a partir de um acórdão do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte, tendo como relator Seabra Fagundes (que a posteriori veio a se tornar Ministro da Justiça), em 1948, ao apreciar a Apelação Cível 1.422[1], que possuiu a seguinte ementa citada por Galba Velloso, verbis:
“PODER DISCRICIONÁRIO DA ADMINISTRAÇÃO – ABUSO DESSE PODER – MANDADO DE SEGURANÇA – DIREITO LÍQUIDO E CERTO – No que concerne à competência, à finalidade e à forma, o ato discricionário está tão sujeito aos textos legais como qualquer outro. O ato que, encobrindo fins de interesse público, deixe à mostra finalidades pessoais poderá cair na apreciação do Poder Judiciário,
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