A Cultura de Busca do Google: o Trabalho como Vida
Por: Renato Nagasako • 7/5/2020 • Artigo • 4.376 Palavras (18 Páginas) • 202 Visualizações
A Cultura de Busca do Google: o Trabalho como Vida[1]
Renato Santiago Nagasako[2]
Professor Doutor Eugenio Menezes[3]
Faculdade Cásper Líbero, São Paulo, SP
RESUMO
O artigo propõe um diálogo entre o objeto de estudo, o Google, com os conceitos presentes no livro ‘O Trabalho como Vida’, de Dietmar Kamper. A proposta é entender o impacto dessa associação, a partir da classificação do Google como um veículo de comunicação com grande impacto e alcance, embasada por dados mercadológicos e apoiada em conceitos expressos no livro ‘Teoria da Cultura de Massa’, de Luiz Costa Lima, para identificar a epistemologia da massificação do trabalho como vida aplicada aos usuários do Google.
Para entender a conversa entre os autores e o objeto de estudo, são utilizados também ideias e conceitos de Martha Gabriel e Norval Baitello Junior para caracterizar a relação entre a cultura da busca e a sua abertura à sociedade contemporânea à cultura que transforma os ditos de Kamper em uma realidade aplicada.
PALAVRAS-CHAVE: Google; Cultura de Busca; Comunicação; Internet; Dietmar Kamper.
INTRODUÇÃO
As pessoas são uma representação da sua própria cultura, das suas próprias atitudes, dos seus hábitos, formas de agir e pensar. O presente artigo parte dessa premissa para aplicar um dos conceitos de Dietmar Kamper à sociedade contemporânea, entendendo como um veículo de comunicação específico, o Google, colabora na afirmação do trabalho como vida. É importante ressaltar que mesmo ao problematizar o objeto deste estudo como uma ferramenta de busca, a mesma atende aos parâmetros de qualquer outro veículo de comunicação, de massa ou não, pois a mesma leva o seu conteúdo e informações diversas a um público determinado, que são os seus usuários e formam a sua audiência, através de um meio de comunicação, a Internet.
Neste momento, para começar esta análise, primeiro é preciso entender o que significa a palavra trabalho. Beber em sua etimologia para expelir quais são as implicações dos seus conceitos aplicados em medidas com vias de exagero. Como o seu excesso transforma e vicia a atividade humana, torna aparente um desequilíbrio que afere o cotidiano e a vida das pessoas.
Como um site da Internet influencia esse processo? E, principalmente, como a tecnologia feita pelo ser humano pode transformar o seu próprio criador? Essas perguntas são o combustível que movem o conflito presente e levam aos apontamentos retratados neste artigo, que tem como objetivo propor uma forma de pensar em quiasma para cruzar Dietmar Kamper com as tecnologias contemporâneas.
Ao entender a cooperação dessa ferramenta de buscas, o Google, na manutenção da ideia do trabalho como vida, a discussão é aberta para um novo patamar. Será que o Google, além de reforçar o trabalho como vida, não dissemina tal cultura aos seus usuários? E, como um veículo de comunicação com as suas dimensões e o seu tamanho, o Google tem a força para ir além e massificar essa cultura.
O EXAGERO EM EXCESSO E A REDUÇÃO DO EQUILÍBRIO
Aplicação da atividade humana a qualquer exercício de caráter físico ou intelectual, ação de uma força que põe em movimento um corpo que lhe opõe resistência e até incômodo, infortúnio, tormento ou sucesso infeliz. Para a versão brasileira do Dicionário Michaelis, a palavra trabalho tem diferentes definições e algumas são extremamente peculiares ao sentido de preencher ou ocupar o tempo, mas nem sempre de forma realmente produtiva, eficaz e satisfatória. Enfim, principalmente nos conceitos da cultura contemporânea em relação à vida e à economia, trabalhar, muitas vezes, é mais do que uma parte da realidade individual de cada pessoa e transforma-se no principal combustível para um ser viver.
O trabalho é superestimado e ganha uma importância exagerada no sentido da vida contemporânea, que é traduzida pelo excesso. E como Albert Einstein diz em uma de suas citações mais famosas, “para ter equilíbrio, é preciso se manter em movimento”, embora uma energia aplicada apenas em uma direção torna impossível a manutenção do equilíbrio. Nesse posicionamento, o assunto pode ser trabalho ou qualquer outra ação humana, o exagero é a resposta para uma vida desiquilibrada, que não encontra a plenitude de sua própria forma.
Diferentes caminhos podem ser propostos por essas definições, mas no caso desta discussão em si, a questão fica por procurar ou discutir um dos possíveis porquês pelo qual o trabalho encontra as raízes da massificação cultural para transformar-se, experimentalmente, em algo sagrado e divino, quase como uma prática religiosa e acima do bem e do mal.
A ESPETACULARIZAÇÃO DO GOOGLE
Definida por Adorno e Horkheimer, a ‘Indústria Cultural’ explica as principais características que compõem os termos da cultura de massa. E para uma mensagem ser propagada nesse modelo comunicacional é preciso haver um instrumento para tal. Como Lima diz, a comunicação perde o seu caráter parcelado para tornar-se multidirecional através de diversos meios e veículos.
A comunicação agora deixa de ser basicamente verbal, escrita e/ou literária para tornar-se, utilizando a aglutinação joyceana, verbo-voco-visual. Tecnicamente, passamos à era da comunicação multidirecional. A mensagem perde seu caráter de parcelada, distribuída em pontos reconhecidos (teatro, biblioteca, museu, sala de concerto, sala de cursos, de projeção), por instrumentos reconhecidos (jornal, livro, revista, gravura, cartaz), que se podem evitar ou escolher. (LIMA, 2000, p. 42)
Os meios e veículos que são repetidamente utilizados, ou escolhidos, tornam-se ferramentas de propagação da cultura de massa. E, mesmo com as suas próprias particularidades, como um veículo de massa definido pelo mercado publicitário como ATL (above the line) ou uma outra forma mais personalizada e personificada que são chamados como BTL (below the line), as ferramentas de busca exibem resultados próprios para cada um de seus usuários, mas ainda sim propagam as suas práticas aos seus usuários e formam ou reforçam padrões como a cultura de busca.
Com a força dos meios de massa, o mercado de comunicação passou a ser dividido em duas partes: acima e abaixo da linha. Uma nomenclatura que talvez seja a melhor maneira de descrever a quarta onda.
A origem dos termos vem no modelo de receita adotada décadas atrás pelo mercado publicitário, onde parte da receita das agências vem do comissionamento pela compra de mídia. (CAVALLINI, 2009, p. 31)
Logo, mesmo que não caracterizado como um veículo de massa, o Google, através da sua audiência que são os seus usuários, se torna um agente massificador da ‘Indústria Cultural’ que, como Morin define, são produtos padronizados e prontos para o consumo.
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