Fichamento Hannah Arendt
Por: psmbastos • 7/10/2015 • Trabalho acadêmico • 4.062 Palavras (17 Páginas) • 564 Visualizações
TRABALHO:– As Esferas Pública e Privada - Arendt - Cap II
23/02/06
O Homem: Animal Social ou Político.
A vida humana quando se empenha ativamente me fazer algo (vita activia), tem raízes num mundo de homens ou de coisas feitas pelos homens, um mundo que ela jamais abandona ou chega a transcender por completo.
Nenhuma vida humana, nem a de um eremita, é possível sem um mundo que testemunhe a presença de outros seres humanos.
Todas as atividades humanas são condicionadas pelo fato de que os himens vivem juntos; mas ação é a única que não pode sequer ser imaginada fora da sociedade dos homens.
Só a ação é prerrogativa exclusiva do homem; nenhum animal nem um deus é capaz de ação, e só a ação depende inteiramente da constante presença de outros.
Esta relação especial entre a ação e a vida em comum parece justificar plenamente a antiga tradução do zoon politikon de Aristóteles como animal socialis. O homem é por natureza política, isto é, social.
Segundo o pensamento grego, a capacidade humana de organização política não apenas difere mas é oposta a essa associação natural cujo centro é constituído pela casa (oikia) e pela família. O surgimento da cidade-estado significava que o homem recebera, além de sua vida privada, uma espécie de segunda vida, o seu bios politikos. Cada cidadão pertence agora a duas ordens de existência.
Há uma grande diferença em sua vida entre aquilo que lhe é próprio (idion) e o que é comum (koinon). Não se tratava de mera opinião ou teoria de Aristóteles, mas fato histórico: precedera a fundação da polis a destruição de todas as unidades organizadas à base do parentesco, tais como a phratria e a phyle.
De todas as atividades necessárias e presentes nas comunidades humanas, somente duas eram consideradas políticas e constituintes do que Aristóteles chamava de bios politikos: a ação (praxis) e o discurso (lexis), dos quais surge a esfera dos negócios humanos (taton antropon pragmata como chamava Platão).
A fundação da cidade-estado possibilitou aos homens passar toda a sua vida na esfera pública, em ação e em discurso. A convicção de estas duas capacidades humanas são afins uma da outra, além de serem as mais altas de todas parece haver precedido a polis e ter estado presente no pensamento pré-socrático.
Na experiência da polis, que tem sido considerada o mais loquaz dos corpos políticos e na filosofia que dela surgiu, a ação e o discurso separaram-se e tornaram-se atividades cada vez mais independentes.
A ênfase passou da ação para o discurso e para o discurso como meio de persuasão, pois o ser político em seu viver na polis, significava que tudo era decidido mediante palavras e persuasão e não através de força ou violência.
Em suas duas mais famosas definições, Aristóteles apenas formulou a opinião corrente na polis sobre o homem e do modo de vida político e que, segundo essa opinião, todos os que viviam fora da polis – escravos e bárbaros – eram aneu logou, destituídos naturalmente não da capacidade de falar, mas de um modo de vida no qual o discurso e somente o discurso tinha sentido e no qual a preocupação central de todos os cidadãos, era discorrer uns com os outros.
O grande erro de interpretação na tradução latina de “político” como “social” talvez possa ser evidenciado numa discussão de Tomás de Aquino quando compara a natureza da lei doméstica com a lei política: o chefe de família tem alguma semelhança com o chefe do reino, mas o seu poder não é tão perfeito quanto o do rei.
Não só na Grécia e na polis, mas em toda a antigüidade ocidental, teria sido evidente que mesmo o poder do tirano não era tão grande nem tão perfeito quanto o poder com que o “paterfamilias”, o “dominus” reinava na casa em que mantinha seus familiares e escravos. Não porque o poder do dirigente da cidade fosse igualado pela combinação dos poderes dos chefes de família, mas porque o domínio absoluto e inconteste e a esfera política era mutuamente exclusivas.
A Polis e a Família:
A distinção entre uma esfera de vida privada e vida pública corresponde à existência destas esferas como entidades diferentes e separadas, pelo menos desde o surgimento da cidade-estado. A ascendência da esfera social que não era nem privada nem pública, é um fenômeno relativamente novo cuja origem se deu com o surgimento da era moderna e que encontrou sua forma política no estado nacional.
Historicamente é provável que o surgimento da cidade-estado e da esfera pública tenha ocorrido às custas da esfera privada da família e do lar. A antiga santidade do lar, muito mais presente na Grécia clássica do que na Roma antiga jamais foi esquecida por inteiro. O que impediu que a polis violasse as vidas privadas, respeitando o limites sagrados da propriedade privada tal como concebemos foi o fato de que sem ser dono de uma casa, o homem não podia participar dos negócios do mundo pois sequer tinha nele lugar que lhe pertencesse.
A esfera familiar dava-se porque através dela, os homens eram compelidos a viverem juntos por conta de suas necessidades e carências, que reinavam sobre todas as atividades exercidas no lar.
A esfera da polis era a esfera da liberdade e se havia uma relação entre estas duas esferas era que se a vitória sobre as necessidades da vida em família constituía-se em condição natural para a liberdade na polis.
Em todos estes casos, é a liberdade da sociedade que requer e justifica a limitação da autoridade política. A liberdade situa-se na esfera social e a força e a violência tornam-se monopólio do governo.
O que os filósofos gregos acreditavam é que a liberdade situa-se exclusivamente na esfera política, que a necessidade é um fenômeno pré-político, típica do lar privado e a violência e a força são justificadas nesta última por serem os únicos meios de vencer a necessidade e alcançar a liberdade. A violência é o ato pré-político de libertar-se e alcançar a liberdade no mundo.
O poder pré-político com o qual o chefe de família reinava sobre a família e os escravos, tido como necessário por que o homem e um animal “social”, antes de ser um animal “político” distingue-se do pensamento do século XVII onde os homens só poderiam escapar se estes estabelecessem um governo um governo que através do monopólio do poder e da violência
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