Resenha Saúde Global: Uma Breve História
Por: Luanda Lima • 3/8/2018 • Resenha • 6.319 Palavras (26 Páginas) • 249 Visualizações
Resenha “Saúde Global: Uma Breve História”
O livro “Saúde Global: Uma Breve História”, foi escrito em 2015 pelo autor Marcos Cueto. A obra retrata as pesquisas e atividades docentes do historiador sobre as temáticas desenvolvidas ao longo de alguns anos em distintas universidades e arquivos do mundo sobre principalmente duas temáticas/termos: saúde internacional e saúde global.
O livro é dividido em oito partes: 1) Apresentação; 2) Origens e Percursos da Saúde Internacional; 3) Atenção Primária à Saúde; 4) O Neoliberalismo e as Reformas Sanitárias; 5) Reflexões Finais; 6) Cronologia; 7) Referências; 8) Sugestões de leitura. No presente trabalho, intenta-se realizar um fichamento sobre as cinco primeiras partes.
Na apresentação, o autor trata que o objetivo do livro é circunscrever o estudo da história da saúde global, sendo de utilidade para os encarregados da elaboração de políticas públicas e para os estudiosos dos sistemas de saúde, auxiliando-os no controle das doenças alimentadas pela pobreza, estudantes de saúde pública, história da medicina e áreas afins. Assim, ele pontua que as agências internacionais, as escolas de saúde pública e os governos, substituíram o tradicional termo “saúde internacional” pelo conceito “saúde global”. No entanto, poucos especialistas conhecem as origens históricas dessas expressões. Busca-se compreender a construção histórica e política desses conceitos no contexto de uma nova ordem mundial neoliberal, com um olhar frente aos desafios e possibilidades das políticas de saúde.
Ainda na apresentação, Cueto cita que o termo “saúde global” está vinculado à ideia de globalização, termo que tem aparecido com frequência nos discursos econômicos e políticos vinculados ao fim da Guerra Fria. Assim, a definição mais comum do conceito de globalização é “aquela que compreende processos mundiais ocorridos depois de 1991, a saber: o rápido incremento dos intercâmbios comerciais, o fluxo dos capitais financeiros transnacionais, o trânsito massivo de viajantes e imigrantes e o surgimento de novas tecnologias de informações como a internet. O termo globalização associa-se também com políticas econômicas neoliberais que enfatizam a dinâmica do mercado em detrimento do papel do Estado ao levar a cabo a privatização de empresas públicas” (pág 11-12).
Foi nesse contexto que surgiu e idealizou-se a saúde global, promovida desde fins do século XX como perspectiva mais abrangente que a saúde internacional. A expressão foi considerada uma resposta racional aos problemas gerados pela globalização, como a emergência de novas doenças, num momento em que se formou um novo cenário epidemiológico e em que muitas infecções novas, como a Aids, incidiam igualmente sobre países ricos e pobres.
Na primeira parte do livro, “Origens e Percursos da Saúde Internacional”, Cueto traz um importante panorama sobre importantes marcos no percurso da saúde a nível internacional. O autor inicia o texto circunscrevendo que as primeiras ações dos governos para articular esforços na área da saúde internacional têm relação com a identificação das pandemias durante o século XIX. Em tom crítico, Cueto assinala que as medidas contra essas doenças (cólera, por exemplo), só se converteram em um assunto prioritário quando afetaram as nações mais ricas do planeta (na época, os países europeus).
Assim, a partir de 1851, os governos europeus - e posteriormente dos Estados Unidos e de alguns países não industrializados -, organizaram conferências sanitárias internacionais até o ano de 1913. Doenças como cólera, febre amarela e mais tarde, a peste bubônica, fizeram parte das reuniões sanitárias internacionais durante esses anos. Muitos cientistas, como Robert Koch, Louis Pasteur e Carlos Finlay, afirmaram que essas doenças infecciosas tinham uma origem microscópica e deviam ser combatidas com soros, vacinas e medidas com o objetivo de promover higiene deveriam ser tomadas. Contudo, as conferências sanitárias não puderam obrigar os governos a programar ações articuladas no âmbito da saúde internacional, posto que, na maioria das vezes, os representantes eram médicos e não autoridades políticas.
Com isso, alguns governos decidiram, na virada do século XX, criar uma agência com mais poder que pelo menos centralizasse a informação epidemiológica mundial disponível. Essa foi a origem do Escritório Internacional de Higiene Pública (OIHP), que funcionou em Paris de 1907 a 1946. O intuito do OIHP era ser reconhecido como a principal agência de vigilância sanitária mundial. Contudo, a autoridade dessa agência se fragilizou com o advento da Primeira Guerra Mundial (1914-1919), durante a qual houve pouca cooperação entre as nações europeias.
No fim da primeira Guerra Mundial, os países vencedores (Inglaterra e França), decidiram fundar uma nova instituição que protegesse a paz mundial, a Liga das Nações, ainda que os Estados Unidos não fizessem parte da sociedade, em razão da política isolacionista que caracterizava os EUA. Assim, em 1920, foi criada a Organização de Saúde da Liga das Nações (OSLN). A fusão da OSLN e do OIHP não foi possível por causa das hostilidades entre alguns países-membros das duas organizações. Assim, no período de 1919 e 1939, as duas agências oficiais de saúde internacional, além de exercerem pouca autoridade, contavam com pouca legitimidade.
Entretanto, a OSLN tinha um ativo líder médico: o bacteriologista polonês Ludwik J. Rajchman. O bacteriologista foi fundamental para a criação do Escritório para o Sudeste Asiático (1925). Porém, pouco antes da Segunda Guerra Mundial, ele teve de abandonar a liga, porque a política do seu diretor era a de apaziguar-se com a Alemanha nazista, e Rajchman foi considerado politicamente radical pelas autoridades do órgão.
Em 1913, foi criada a Fundação Rockefeller na cidade de Nova York como a primeira organização filantrópica privada com foco na saúde internacional. Financiada pela fortuna da companhia petroleira de John Rockefeller, o objetivo da instituição era o de controlar a ancilostomíase, a febre amarela e a malária nos países pobres. Apesar das ações e do esforço da organização, a desilusão era dada como certa após algum tempo com as tentativas de controlar as doenças citadas, uma vez que as realidades sociais e epidemiológicas eram bem mais complexas do que supunha a instituição. No entanto, a Fundação procurou vincular cientistas norte-americanos às escolas de medicina latino-americanas, gerando uma norte-americanização do ensino, da pesquisa e das práticas médicas na região e um consequente declínio da influência europeia.
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