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A Questão Dos Direitos Humanos E O Combate às Desigualdades: Discriminação E Violência

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Por:   •  7/11/2013  •  4.976 Palavras (20 Páginas)  •  467 Visualizações

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1. Raça e direitos humanos no Brasil

É de Joaquim Nabuco a compreensão de que a escravidão marcaria por longo tempo a sociedade brasileira porque ela não teria sido seguida de “medidas sociais complementares em benefício dos libertados, nem de qualquer impulso interior, de renovação da consciência pública.”[1] Na base dessa contradição perdura uma questão essencial acerca dos direitos humanos: a prevalência de uma concepção de que certos humanos são mais ou menos humanos do que outros e por conseqüência a naturalização da desigualdade de direitos. Se alguns estão consolidados no imaginário social como portadores de uma humanidade incompleta torna-se natural que não participem igualitariamente do gozo pleno dos direitos humanos. Uma das heranças da escravidão com a qual contribuiu, posteriormente, o racismo científico do século XIX que dotou de suposta cientificidade a divisão da humanidade em raças estabelecendo hierarquia entre elas e conferindo-lhes estatuto de superioridade ou inferioridade naturais. Dessas idéias decorreram e se reproduzem as conhecidas desigualdades sociais que vem sendo amplamente divulgadas nos últimos anos no Brasil.

No entanto, o pensamento social brasileiro tem longa tradição no estudo da problemática racial e, no entanto, na maior parte de sua história, as perspectivas teóricas que o recortaram respondem, grandemente, pela postergação do reconhecimento da persistência de práticas discriminatórias em nossa sociedade. Nadya Castro Araújo inventaria o percurso pelo qual o pensamento social brasileiro sobre as relações raciais foi se transformando por meio de diferentes óticas pelas quais foi abordado, iniciando-se pelo pessimismo em relação à configuração racial miscigenada da sociedade brasileira, corrente no final do século XIX até as primeiras década do século XX, como atestam pensadores como Sílvio Romero, Paulo Prado, Nina Rodrigues, entre outros, passando pela visão idílica sobre a sua natureza das relações raciais constituídas no período colonial e determinantes na predisposição racialmente democrática da sociedade brasileira, que tem em Gilberto Freyre sua expressão maior e mais duradoura. Comparecem ainda visões que situam a questão racial como reminiscências da escravidão, fadadas a desaparecer tanto mais se distancie no tempo daquela experiência histórica, ou ela é situada como sub-produto de contradições sociais maiores ditadas pela análise materialista dialética que as informava, como coloca Florestan Fernandez. Para Araújo, nessa leitura :

"a desigualdade racial era descrita como um epifenômeno da desigualdade de classe. Mesmo ali onde estereótipos e preconceitos contra negros eram expressamente manifestos, eles eram analisados antes como atos verbais que como comportamentos verdadeiramente discriminatórios."[2]

O novo ponto de inflexão nessa reflexão emerge na obra de Carlos Hasenbalg em que pela primeira vez as desigualdades raciais são realçadas a partir de uma perspectiva em que discriminação e racismo são tomados como variáveis independentes e explicativas de tais desigualdades.

Essas concepções conformam as duas matrizes teóricas e/ou ideológicas em disputa na sociedade. De um lado o mito da democracia racial ao desracializar a sociedade por meio da apologética da miscigenação presta-se historicamente ao ocultamento das desigualdades raciais. Como afirma o sociólogo Carlos Hasenbalg, esse mito resulta em "uma poderosa construção ideológica, cujo principal efeito tem sido manter as diferenças inter-raciais fora da arena política, criando severos limites às demandas do negro por igualdade racial".[3] E é essa mistificação que ressurge como veremos adiante para cooperar com a epígrafe acima no que ela adverte para a “repetição do passado no presente”

De outro lado a força do pensamento de esquerda que ao privilegiar a perspectiva analítica da luta de classes para a compreensão de nossas contradições sociais tornam secundárias as desigualdades raciais obscurecendo o fato da raça social e culturalmente construída ser determinante na configuração da estrutura de classes em nosso país. Essa inscrição e subordinação da racialidade no interior da luta de classes, iniciada inspirando perspectivas militantes que buscam articular raça e classe como elementos estruturantes das desigualdades sociais no país.

Mais recentemente economistas vêm qualificando a magnitude dessas desigualdades ao ponto de, neste momento, podermos afirmar que vivemos num país apartado racialmente. De fato, as disparidades nos Índices de Desenvolvimento Humano encontradas para brancos e negros indicam que o segmento da população brasileira auto-declarado branco apresenta em seus indicadores socioeconômicos (renda, expectativa de vida e educação) padrões de desenvolvimento humano compatíveis com os de países como a Bélgica; que o segmento negro da população brasileira auto-declarado negro (pretos+pardos) apresenta um índice de desenvolvimento humano inferior ao de inúmeros países em desenvolvimento como a África do Sul que, há menos de duas décadas, erradicou o regime de apartheid.

Sociologia e economia são áreas que vêm consolidando uma nova percepção sobre a importância da racialidade na configuração das desigualdades sociais no Brasil, tornando-a variável estrutural para a compreensão e superação do problema social no país.

Apesar disso, as duas ideologias, o mito da democracia racial a perspectiva da luta de classes tem portanto em comum a minimização ou o não-reconhecimento e/ou a invisibilização da intersecção de raça para as questões dos direitos humanos, da justiça social e da consolidação democrática dificultando e permanecem atuantes como elementos que dificultam a inscrição da erradicação das desigualdades raciais nas políticas públicas.

2. O governo Lula e a questão racial

Reconheça-se a bem da verdade histórica que Fernando Henrique Cardoso em coerência com sua produção acadêmica sobre o negro foi o primeiro presidente na história da República brasileira a declarar em seu discurso de posse que havia um problema racial no Brasil e que era necessário enfrenta-lo com audácia política. Em conseqüência é em seu governo que as primeiras políticas de inclusão racial são gestadas e implementadas sendo grandemente impulsionadas pelo processo de construção da participação do Brasil na Conferência Mundial contra o Racismo, a Discriminação Racial, a Xenofobia e Formas Correlatas de Intolerância

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