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Hakani e o lado obscuro da culturalidade: O início de um debate sobre o infanticídio indígena no brasil

Por:   •  10/7/2018  •  Trabalho acadêmico  •  1.868 Palavras (8 Páginas)  •  234 Visualizações

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Hakani e o lado obscuro da culturalidade: O início de um debate sobre o infanticídio indígena no brasil

Paulo Victor Mendanha Oliveira (mendanha-paulo@live.com)

Resumo: No centro das discussões sociais contemporâneas, o debate entre os Direitos Humanos e à vida perante os direitos culturais coincide no caso da prática de infanticídio indígena no Brasil. A pretensão do seguinte artigo é fazer uma abordagem crítica do assunto, a partir do documentário Quebrando o silêncio, produzido e dirigido no ano de 2010 por Sandra Terena, uma das primeiras jornalistas índias do Brasil, levando em conta os dois caminhos possíveis. Pretendo destacar alguns de extrema felicidade da diretora, tendo a sensibilidade de encontrar o exemplo perfeito para ilustrar o caso. Como a importância da voz indígena se faz presente, sendo que ela é a parcela da população interessada, de fato. Abordarei também a pressão que cai sobre o governo e os diferentes aspectos morais que rondam essa questão, bem como a discordância em certos pontos de pessoas que queriam a mudança. Também mostrarei a inevitabilidade dos direitos à vida.

Palavras Chave: Hakani, Cultura, Direitos Humanos, Infanticídio, Hans Joas, Everardo Rocha

Grande parte das pessoas inseridas em matrizes culturais europeias herdou preconceitos que não existem em outras culturas. Uma parte da discussão acerca da racionalização humana envolve preconceitos racistas. Somos herdeiros de uma cultura preconceituosa, que subjuga os nativos americanos, enxergando-os como incapazes de tomar decisões básicas no que diz respeito à sua própria vida. A interferência do homem branco é visivelmente dolorosa e sofrida ao povo indígena, que clama por autonomia.

O infanticídio indígena - uma condição em que provavelmente centenas de crianças indígenas são levadas à morte das mais variadas maneiras, e pelas mais variadas causas como no caso de nascerem gêmeos ou deficientes físicos e mentais - é uma prática recorrente aos dias atuais. A partir do caso Hakani, uma criança de etnia suruwaha, condenada à morte nos primeiros anos de vida por não se desenvolver como as outras crianças, as discussões em torno do infanticídio foram tomando proporções cada vez maiores.

Como os únicos interessados nesse assunto, alguns povos indígenas sentem-se calados. Por vezes esse assunto é discutido por pessoas inseridas fora do contexto, que discursam sobre algo que não vivem, ignorando completamente a vivência dos índios, por vezes sendo um assunto tratado como lenda. A importância de se escutar tanto as lideranças, quanto os homens comuns das tribos se faz imprescindível, de modo que repetindo, como únicos interessados, os índios devem tomar as rédeas da situação, e a sua palavra deve ser a final.

Analisando o documentário Quebrando o silêncio, idealizado e dirigido por Sandra Terena, uma das primeiras jornalistas indígenas brasileiras, percebemos uma abordagem multilateral do assunto. Intrinsecamente ligada ao tema, Sandra reúne relatos de vítimas, de praticantes, de observantes, e também de pessoas externas ao assunto, como alguns antropólogos, advogados e religiosos. O cuidado com a pluralidade das fontes por parte de Sandra é notável, e se faz necessário perante a um assunto polêmico como esse.

Como qualquer outro indivíduo institucionalizado, as crianças indígenas nascem inseridas num contexto em que são dominadas pela tradição. Não se escolhe o contexto cultural em que se nasce. Do mesmo modo em que a sociedade europeia trouxe preconceitos até então inexistentes consigo, também trouxe novas formas e opções de vida. Depois de mais de 5 séculos de convivência, alguns aspectos culturais começaram a ser mesclados. Perante a isso, o índio também percebeu novas formas de abordar a vida. Com essas novas percepções, alguns costumes indígenas até então incontestáveis começaram a se modificar. A relação dinâmica do indivíduo com a cultura fez com que o comportamento indígena se moldasse.

No cerne do debate em questão, o discurso dos pais indígenas é carregado de tristeza. Construído diante da fala carregada, porém firme e decidida, ele brada por socorro. Convictos de suas ideias, boa parte da geração atual desses pais indígenas afirma que não vão mais seguir a esses costumes. De qualquer modo que a criança nascer, sendo ela deficiente, gêmea, ou outra maneira, elas não vão mais sacrificar. Parte dos avós dessas crianças que nascem dos dias atuais também deseja a ruptura com esses laços.

Paralelamente a isso, as lideranças indígenas também caminham para o mesmo lado. Também prevalece dentre eles a intenção em preservar ao máximo a vida das novas crianças. Alguns deles ainda ressaltam a alegria que é a convivência infantil. Eles também percebem um declínio preocupante no número populacional. No documentário citado anteriormente, o exemplo do Cacique Tabata foi uma colocação cuidadosamente colocada, e muito feliz da diretora Sandra, pois traz um exemplo bem peculiar: Mesmo sendo parte da liderança, o cacique foi obrigado a deixar a tribo para criar seus filhos gêmeos, o que demonstrava que mesmo com a iminente defesa as essas crianças, ainda existia uma certa resistência.

Segundo ao que é apresentado no documentário, a maior parte dessa resistência formada em torno das ideias de defesa as crianças gira em torno das crianças deficientes. Mesmo que se mantenham as suas vidas, não se sabe como tratar exatamente o problema delas, pois se comparada a uma criança que vive em uma cidade, a criança indígena não teria nenhuma opção de acessibilidade. Seu campo de ação seria completamente limitado, tornando-se dependente de outro membro da tribo. Como exemplo prático podemos citar o irmão de Hakani, que foi obrigado a cuidar de sua irmã integralmente e leva-la em sua companhia para todos os lugares que fosse, por um tempo depois que os outros familiares sucumbiram.

Hans Joas, um sociólogo alemão professor na Universidade Humboldt de Berlim, é um ferrenho defensor da sacralidade da pessoa. Segundo ele:

O documento mais importante para a história mais recente dos direitos humanos é sem sombra de dúvida, a Declaração Universal dos Direitos Humanos, proclamada pelas Nações Unidas no dia 10 de dezembro de 1948. [...] Na própria Declaração dos Direitos Humanos, ademais o comprometimento com a dignidade humana é fundamental com o fato de que “o desconhecimento ou o desprezo dos direitos humanos resultaram em barbárie (JOAS, 2011 p. 110)

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