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Por:   •  4/3/2015  •  2.318 Palavras (10 Páginas)  •  176 Visualizações

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Revista Estudos Políticos

Resenha de Coerção, capital e estados europeus (1990-1992), de Charles Tilly. Resenha de Bernardo Bianchi Barata Ribeiro

Posted in Nº 0 (2010/1) by Revista Estudos Políticos on junho 1st, 2010

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TILLY, Charles (1996). Coerção, capital e estados europeus (990-1992). São Paulo: EDUSP.

Bernardo Bianchi Barata Ribeiro é doutorando em Ciência Política no Instituto de Estudos Sociais e Políticos da Universidade do Estado do Rio de Janeiro.

Seria despropositado apontar, passados vinte anos desde que foi publicado pela primeira vez nos EUA, em 1990, a magnitude do esforço depositado por Charles Tilly em Coerção, capital e estados europeus (990-1992)[1]. Mais do que simplesmente enriquecer o estudo da formação dos Estados europeus a partir da interpretação das vicissitudes e tensões que atravessaram suas rotas de constituição, Tilly procurou desmitificar estes processos constitutivos. Talvez a sua mais importante contribuição consista justamente em desnaturalizar o desenvolvimento das formas atuais dos Estados europeus, que tampouco podem ser percebidas como o resultado inelutável de um imperativo histórico qualquer. Do mesmo modo, Tilly rejeita a análise hegemônica e ingênua que toma a Grã-Bretanha e a França como sendo trajetórias-padrão de formação dos Estados europeus; tudo o mais não passando de caminhos pedregosos e marginais. Afinal, trata-se de levar a sério a enorme variação, no tempo e no espaço, dos tipos de Estados que povoaram a Europa nos últimos séculos. Mas semelhante consideração não pode tapar o sol com a peneira, pois sabemos, do mesmo modo, que os Estados europeus, por mais diversificados que possam ter sido no passado, acabaram por convergir em variantes de uma mesma forma: o Estado nacional (Tilly, 1996, p. 50).

Tilly não achata toda esta variedade de Estados que retalharam durante séculos o mapa da Europa sob uma trajetória uniforme em direção aos atuais Estados nacionais. Sua análise é muito mais prospectiva do que retrospectiva, como bem o afirma Karl Monsma (Charles Tilly, p. 25). E esta não é uma constatação banal. Conforme adverte o próprio Tilly,

A lição é clara. Usar a força do século XX como o principal critério de formação efetiva do estado ( a exemplo do que fazem muitos analistas) significa sucumbir às tentações da teleologia, interpretar mal as relações entre as cidades, os estados, o capital e a coerção no passado da Europa” (Tilly, 1996, p. 82).

Ao longo do livro, temos, bastante amiúde, a impressão de que o autor perdeu o fio da meada, perdendo-se em descrições inúteis. Ora, nada mais consistente com a proposta de desnaturalizar o processo de formação dos Estados europeus do que apresentar da forma mais ampla possível toda a intrincada teia de fenômenos que abalou esta trajetória. Fazer uma mera genealogia do Estado nacional europeu contemporâneo redundaria num recorte drástico e demasiadamente normativo, o que subtrairia qualquer potencial histórico do empreendimento. Seria o calvário mesmo da história. Assim, a análise de Tilly tem que ter um ponto de partida a partir do qual as diferentes experiências estatais se desenvolvem: o ano de 990. E nada a respeito daquele mundo – a Europa na virada para o segundo milênio – antecipa a consolidação dos Estados nacionais. Isto assinala o caráter maximamente ideográfico e minimamente nomotético do seu intento.

É precisamente esta metodologia que permite a Tilly não deixar passar em branco a existência de Estados tais como a República de Florença, de Maquiavel, ou Portugal, para ficarmos com um exemplo mais próximo de nós. É preciso levá-los em consideração e dar uma explicação para o insucesso dessas estruturas políticas. É nesses termos que devemos procurar responder por que um determinado tipo de Estado, com uma estrutura bastante própria, obteve êxito quando outros falharam. Ou seja, não se trata unicamente de explicar a formação dos Estados europeus contemporâneos através da análise das características individuais desses Estados e do modo como elas se impuseram, como se eles fossem o resultado de um projeto premeditado e cujo resultado final somente poderia ser o Estado nacional. Outros Estados, ou melhor, outras estruturas políticas, responderam igualmente bem e, por vezes, até mesmo de forma mais eficiente aos imperativos próprios da vida política de seu tempo. E não seria lícito dizer que tais Estados prosperaram nas dobras da civilização, aproveitando-se de um relativo casuísmo. Não, como bem o demonstra Tilly, eles prosperaram porque se inseriram de forma eficaz no fluxo volátil de seu tempo e, quando não mais o puderam fazer, deixaram de existir.

I. Guerra e seleção de Estados

Retomando a epígrafe desta resenha, gostaríamos de ressaltar a agonia de Maquiavel frente à invasão da Itália perpetrada pelas tropas de Carlos VIII em 1494. É uma agonia que, como bem o aponta Tilly, tocava o que “estava ocorrendo ao sistema italiano de Estado” (Tilly, 1996, p. 136). O Decennale Primo é um poema que guarda algo de réquiem, se bem que tenha também algo de marcha. Todavia, acima de tudo, o Decennale Primo é a expressão bem-acabada de uma análise política: o formato de Estado predominante na península itálica estava fadado a ser destroçado por sucessivas incursões francesas e espanholas. E isso porque os Estados italianos não puderam responder ao esforço militar empreendido pelas potências territoriais européias. Nesses termos, são valiosas as palavras de Tilly:

os governantes mais poderosos em alguma região particular estabeleceram os termos da guerra para todos; os governantes menos importantes tiveram de optar entre aceitar as exigências dos vizinhos poderosos ou tentar esforços excepcionais no sentido de se prepararem para a guerra (Tilly, 1996, p. 111)

Maquiavel bem que tentou realizar um esforço excepcional, arregimentando o máximo de tropas que pôde, mas isso não foi o suficiente, por conta da própria situação do Estado florentino. Tilly bem diagnostica a dificuldade dessas inovações ali onde “a extensão da atividade comercial afetou fortemente a viabilidade das diversas táticas usadas para construir o poder do Estado” (Tilly, 1996, p. 198). A falência do modelo italiano é, pois, indicativo da importância da guerra – e do modo como se responde a ela – na organização dos Estados. No limite, podemos dizer que “a estrutura do estado emergia sobretudo sob a forma de produto

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