Sobre Verdade E Mentira Num Sentido Extra Moral - Síntese
Artigo: Sobre Verdade E Mentira Num Sentido Extra Moral - Síntese. Pesquise 862.000+ trabalhos acadêmicosPor: Laura Carvalho • 19/1/2014 • 2.789 Palavras (12 Páginas) • 1.077 Visualizações
Sobre Verdade e Mentira no Sentido Extra-Moral (1873)
CARVALHO, Laura de Freitas.
1. O Intelecto como Meio de Conservação do Homem
O conhecimento foi, portanto, inventado. Dizer que ele foi inventado é dizer que ele não tem origem. É dizer, de maneira mais precisa, por mais paradoxal que seja, que o conhecimento não está em absoluto inscrito na natureza humana. O conhecimento não constitui o mais antigo instinto do homem, ou, inversamente, não há no comportamento humano, no apetite humano, no instinto humano, algo como o germe do conhecimento. De fato, diz Nietzsche, o conhecimento tem relação com os instintos, mas não pode estar presente neles, nem mesmo por ser um instinto entre os outros; o conhecimento é simplesmente o resultado do jogo, do afrontamento, da junção, da luta e do compromisso entre os instintos. É porque os instintos se encontram, se batem e chegam, -normalmente, ao término de suas batalhas, a um compromisso, que algo se produz. Este algo é o conhecimento.
Por meio das palavras de Foucault, e consoante à concepção nietzschiana, empreende-se que o conhecimento não é algo natural do homem, mas algo por ele criado. Entretanto, com que finalidade?
Logo no início de sua dissertação Sobre Verdade e Mentira no Sentido Extra-Moral, Nietzsche coloca,
Em algum remoto rincão do universo cintilante que se derrama em um sem número de sistemas solares, havia uma vez o astro, em que animais inteligentes inventaram o conhecimento. Foi o minuto mais soberbo e mais mentiroso da “história universal”; mas também foi somente um minuto. Passados poucos fôlegos da natureza congelou-se o astro, e os animais inteligentes tiveram que morrer.
Nessa passagem observa-se que em certo momento da história o conhecimento foi criado pelos homens (animais inteligentes), a fim de animar a vida em sociedade, uma vez que para o desenvolvimento da comunidade e potencialização das atividades em grupo, era necessária a universalização da linguagem. Nesse sentido, o conhecimento é “criado” e objetivado pelo homem e por isso é tido como mentiroso, pois apenas “nomeia” fatos e objetos alcançando um conhecimento universal dessas coisas, mas incapaz de captar sua essência.
Essa capacidade humana de criar conhecimento advém da consciência que ele tem de si próprio como centro do universo. Para Nietzsche, essa é a única característica que nos difere, intelectualmente, dos demais animais. Para ilustrar tal argumento, ele faz uso da seguinte comparação.
Ao contrário, ele é humano, e somente seu possuidor e genitor o toma tão pateticamente, como se os gonzos do mundo girassem nele, mas se pudéssemos entender-nos como a mosca, perceberíamos que ela bóia no ar com esse páthos e sente em si o centro voante do mundo.
É observável, portanto, sob a concepção nietzschiana, que o conhecimento foi criado com a finalidade de “amparar” o homem e dar sentido à sua existência, uma vez que o objetivo primordial do homem em toda sua vida é a busca do conhecimento de tudo e de todas as coisas, o que finda-se como um objetivo impossível, uma ilusão humana, tendo em vista o caráter ilimitado do conhecimento. Revelando um aspecto cético de tal filosofia.
Primordialmente, as relações de poder estabelecidas em sociedade, eram definidas pela superioridade da força física. Com a substituição gradativa dessa força pelo manejo de instrumentos, essa concepção foi modificada de forma a privilegiar aquele que fosse mais habilidoso com os instrumentos. É observável, portanto a valorização da superioridade intelectual.
Nesse sentido, o conhecimento surge como meio de conservação do homem, visto que o indivíduo dotado de superioridade intelectual utilizaria da propriedade multifacetada do conhecimento. Essa arte do disfarce atinge o seu fastígio nas relações humanas, o deleitar, enganar e iludir, o agir dissimuladamente de forma geral, “o jogo teatral diante de outros e diante de si mesmo”, de tal forma a conceber-se como um absurdo falar-se “honestamente” e ou verdadeiramente.
2. O que é verdade?
Nietzsche concebe como verdade “uma designação uniformemente válida e obrigatória das coisas”, sendo a legislação da linguagem aquela que suscita as primeira noções de verdade, dando origem à divergência entre o veraz e o espúrio. Atribuindo o mentiroso como aquele usa de referências fiéis, as palavras, a fim de fazer o ilegítimo, legítimo. E o faz por meio de trocas arbitrárias ou mesmo criação de nomes. Praticando, portanto, a mentira de forma egoísta e lesiva a outros, o indivíduo passa a ser excluído da sociedade pois não mais será “de confiança”. A princípio, a preocupação humana não reside no fato de ser enganado, mas nos resultados nocivos de tal ilusão, de forma que apenas certos tipos, ou níveis, de mentira são hostilizados.
Para que pensemos e falemos do mundo deve haver algo em comum entre a linguagem e o mundo. O elemento comum deve estar em suas estruturas. Podemos conhecer a estrutura de um deles se conhecemos a do outro. Já que a lógica nos revela a estrutura da linguagem, deve nos revelar também a estrutura do mundo.
Nessa passagem, Wittgenstein enfatiza a relação entre lógica e linguagem para a obtenção do conhecimento. Em sua primeira fase, na obra Tractatus Logico-Philosophicus, afirma que as coisas só terão sentido se observadas com relação a outras coisas pois assim seria possível captar-se a sua essência (das coisas), pois por si só, não têm significado algum. “Também não podemos pensar em nenhum objeto fora da possibilidade de sua ligação com outros”.
Sob esta perspectiva, o que determina a legitimidade ou ilegitimidade de uma proposição é se há conexão fiel entre as palavras e os objetos no mundo, em outras palavras, deve existir uma afinidade entre a estrutura das coisas e a estrutura do pensamento. Portanto, como já explicitado anteriormente por meio das palavras de Wittgenstein, o que possibilita o elo entre mundo e linguagem é o fato de ambos compartilharem da mesma forma lógica, tal que esta seja, assim, a condição de possibilidade de afiguração.
Tais pensamentos têm fundamento no essencialismo platônico. Tomando como base a “Alegoria da Caverna” de Platão, nossa realidade não está além de meras sombras do verdadeiro conhecimento. De maneira que todo o nosso conhecimento e noção do verdadeiro e do falso é uma reprodução de um conhecimento original, puro e inacessível ao homem.
Nietzsche dirá que “todo conceito nasce por igualação do não-igual”, corroborando com o explicitado por Platão
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