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ARISTÓTELES O TRATADO DO INFINITO (FÍSICA III, 4-8)

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Por:   •  27/11/2014  •  5.498 Palavras (22 Páginas)  •  324 Visualizações

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ARISTÓTELES

O TRATADO DO INFINITO (FÍSICA III, 4-8)

Arlene Reis, Fernando Coelho e Luís Felipe Bellintani Ribeiro

Tradução a partir da edição do texto grego: Aristotelis Physica. Recognovit brevique adnotatione critica instruxit W. D. Ross. Oxford: Oxonii e Typographeo Clarendoniano, 1992.

Arlene Reis possui doutorado em Filosofia pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul e é professora da Universidade Federal de Santa Catarina.

Fernando Coelho possui graduação em Filosofia, em Letras - Francês e mestrado em Estudos da Tradução pela Universidade Federal de Santa Catarina (2009).

Luiz Felipe Bellintani Ribeiro possui Doutorado em Filosofia pela Universidade Federal do Rio de Janeiro e é professor associado da Universidade Federal Fluminense , Brasil.

ARISTÓTELES - O TRATADO DO INFINITO

P E R I • v . 0 2 • n . 0 1 • 2 0 1 0 • p . 9 8 - 11 0 9 9

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[202b 30] Visto que a ciência acerca da natureza versa sobre as grandezas, o movimento e o tempo, sendo cada um destes necessariamente ou infinito ou finito, ainda que nem tudo seja infinito ou finito, como a afecção ou o ponto (pois talvez nenhuma destas coisas seja necessariamente ou um ou outro), seria conveniente que [35] aquele que se ocupa da natureza contemplasse o infinito, se existe ou não, e, se existe, o que é. Há um sinal de que é próprio dessa [203a] ciência a contemplação acerca do assunto, pois todos os que parecem ter tocado dignamente tal filosofia compuseram um discurso acerca do infinito, e todos o estabeleceram como um princípio dos entes, alguns dos quais, como os Pitagóricos e Platão, o estabeleceram como um princípio por si mesmo, não como [5] acidente de outra coisa, mas como sendo o próprio infinito uma substância (ousía). Salvo que os pitagóricos o colocam nas coisas sensíveis (pois não estabelecem o número como separado) e dizem também ser infinito o que está fora do céu; ao passo que Platão, por considerar não haver nenhum corpo fora do céu, nem tampouco as ideias, [10] porque estas não estão em lugar algum, diz estar o infinito nos sensíveis e nas ideias. E os pitagóricos dizem que o infinito é o par (pois este encerrado e abarcado pelo ímpar, fornece aos entes infinidade, um sinal disto é o que acontece com os números: colocados os gnômones em torno do um e separadamente, ora [15] surge uma forma sempre outra, ora surge uma forma una). Para Platão são dois os infinitos, [16] o grande e o pequeno.

[16] Todos os que tratam da natureza e dão fundamento ao infinito estabelecem [sempre] para ele certa natureza diferente dos chamados elementos, como água ou ar ou o intermediário destes. Pois, dentre os que estabelecem finitos elementos, nenhum os estabelece como infinitos. Quantos, porém, estabelecem os elementos como [20] infinitos, por exemplo, Anaxágoras e Demócrito, aquele a partir das homeomeria1 seste da panspermia2 das figuras, dizem ser o infinito contínuo pelo contato. E Anaxágoras diz que qualquer uma das partes é uma mistura, semelhante ao todo, por ver que qualquer coisa vem a ser a partir de qualquer coisa. Esta [25] parece, pois, ser a causa de

1 Literalmente: “(formados) de partes semelhantes”.

2 Literalmente: “(mistura) de todas as sementes.

ARISTÓTELES - O TRATADO DO INFINITO

PERI • v. 01 • n. 01 • 2009 • p. 98 - 110 100

ele dizer que num certo momento todas as coisas estavam juntas, como esta carne e este osso, e deste modo qualquer coisa: e, portanto, todas as coisas, e, por conseguinte, ao mesmo tempo. Há, pois, um princípio da separação não apenas em cada coisa, mas também de todas. Ora, visto que o que vem a ser vem a ser a partir de um corpo quejando, há um vir-a-ser de todas as coisas, salvo que não [30] ao mesmo tempo, e deve haver certo princípio do vir-a-ser, e este é uno, o qual Anaxágoras chama “intelecto”, e o intelecto opera, desde certo princípio, inteligindo, de tal modo que é necessário que, num momento, todas as coisas tenham estado juntas e, em outro, tenham começado a se mover. Demócrito, por sua vez, diz que nenhuma das coisas primeiras vem a ser uma da outra, embora [203b] o corpo comum, ao menos para ele, seja princípio de todas as coisas, diferindo, segundo as partes, pela grandeza e pela figura.

Que, com efeito, é conveniente aos físicos esta contemplação é evidente a partir dessas considerações. E razoavelmente, então, todos colocam o infinito como princípio, [5] pois nem pode ser ele em vão, nem há para ele outra potência senão como princípio. Tudo, pois, ou é princípio ou é a partir de um princípio, e do infinito não há princípio. Se houvesse, esse seria seu limite.3 E, além disso, sendo certo princípio, é não-gerado e incorruptível, pois é necessário que o gerado chegue a um fim (télos), e fim (teleuté) é próprio de toda corrupção. [10] Por isso, conforme dizemos, não há um princípio deste princípio, mas ele mesmo parece ser princípio das outras coisas, abarcar todas e a todas governar, como dizem quantos não estabelecem além do infinito outras causas, como o intelecto ou a amizade; E este é o divino, pois é imortal e indestrutível, como diz Anaximandro e a maioria [15] dos fisiólogos.

A crença de que o infinito é algo dar-se-ia aos que examinam tal assunto, sobretudo, por cinco motivos: pelo tempo (pois este é infinito), bem como pela divisão que ocorre nas grandezas (pois também os matemáticos lançam mão do infinito); e ainda pelo fato de que somente desse modo geração e corrupção não se esgotam, se for infinito aquilo desde que o que se gera [20] é retirado; além disso, pelo fato de que o limitado sempre faz limite com relação a algo, de modo que é necessário que nada seja

3 O ideal seria traduzir em português o par ápeiron/ péras por um par oriundo da mesma raiz, como “ilimitado/ limite”, ou “indeterminado/ determinação” (ou “termo”), ou “infinito/ fim”, mas a opção por “infinito” para ápeiron, devido ao seu caráter físico e matemático no presente contexto, e o fato de que a palavra “fim” poderia criar confusão com a tradução de télos, acabou ficando “infinito/ limite” mesmo.

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PERI • v. 01 • n. 01 • 2009 • p. 98 - 110 101

o limite4, se é necessário que uma coisa sempre faça limite com outra; enfim, sobretudo pelo principal motivo, o qual produz a aporia comum a todos: por

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