O Trágico no Cinema de José Padilha
Por: Paulo Silva • 8/1/2022 • Resenha • 710 Palavras (3 Páginas) • 89 Visualizações
- O Trágico no Cinema de José Padilha -
A violência no Brasil tem provocado várias formas de reflexão, sejam essas de caráter teórico ou imagético. Entre as imagens, o cinema se distingue como um produtor de significados que tem conquistado um público cada vez maior e mais variado, o que gera a necessidade de reflexões filosóficas sobre as formas pelas quais tais significados são construídos e consumidos.
O trágico, nessa obra, constituí uma forma que integra o aterrorizante, sem, no entanto, estimular um efeito destruidor. Assim, a obra trágica apesar de não incorporar qualquer tipo de possibilidade, não adere a uma posição pessimista, valoriza o aspecto inquietante da existência humana.
O filme do diretor carioca José Padilha e um filme pautado em fatos reais, que procura encenar a violência urbana. Podemos avaliar a película nesse ponto de vista como uma concepção de produto que culmina na estruturação de uma representação da realidade. No filme assistimos uma exibição do fato histórico de acordo com as imagens e arquivos de noticiario, além de relatos de pessoas direta ou indiretamente ligadas ao acontecimento.O filme procede assim a uma desconstrução de verdades, de discursos pré-estabelecidos em torno do evento dando lugar a uma iniciativa analítica por parte do espectador e, conseqüentemente, a um importante resgate da memória coletiva relativo ao fato ocorrido.
O sensação que a obra nos permite rever é uma de uma violência, violência essa que é trabalhada pela montagem e pela análise do acontecimento por parte dos entrevistados, cuja multiplicidade de sentidos afasta o risco de uma acepção prévia e única do cineasta que viria adornar o fato. A obra não repete a violência real, não a substitui, nem a simula.
A exibição da violência em Ônibus 174, ao retrata-lo no presente, atém-se a sua capacidade de ressonância e de apelo o que Rosset chama da (consciência do trágico). O filme restitui ao povo o seu poder de reflexão sobre uma realidade que se apresenta de forma pura, a exposição da violência construída pelo filme adquire assim uma extensão trágica, na medida em que, desfazendo- se de sentidos prévios, permite ao espectador não só a relembrança de uma experiência vivida, como também o exercício de afastamento dos sentidos prévios ou das certezas sedimentadas no juízo comum, para fazer frente ao conhecimento de novas realidades, novos significados.
O Ônibus 174 é um bom exemplo do alcance didático da utilização das imagens e arquivos no cinema, confrontando as imagens jornalísticas a depoimentos de sobreviventes do seqüestro, de representantes da povo e de familiares e amigos das vítimas, o filme ressuscita um fato que a televisão havia arquivado no dia seguinte. Ele procede assim a um trabalho metódico de desconstrução do discurso televisivo em torno do fato, dando lugar a uma atividade analítica por parte do espectador. Não só temos a ocasião de ver de novo, mas também vemos melhor e mais devagar, nos permitindo explorar gestos e expressões dos policiais, do seqüestrador e das passageiras do ônibus que tinham passado totalmente despercebidos no fluxo contínuo das imagens durante as transmissões ao vivo.
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