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A Dialética e a formação social brasileira

Por:   •  8/8/2017  •  Seminário  •  2.988 Palavras (12 Páginas)  •  349 Visualizações

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Sodré e a dialética da formação social brasileira

MARCOS DEL ROIO*

Introdução

Nelson Werneck Sodré foi autor de mais de quarenta livros, nos quais abordou as mais diversas facetas da realidade nacional, sempre com a perspectiva da totalidade histórica social e com a perspectiva do debate ideológico.

Um autor tão que produziu por cerca de seis décadas tem, uma trajetória complexa e dotada de uma particularidade iluminante da própria trajetória do marxismo no Brasil. A formação militar o colocara em contato com a filosofia positivista, presente no Exército desde a crise do escravismo e da monarquia.

Sodré tem uma formação teórica afinada com o marxismo apenas em fins dos anos 1950, no período em que participou do Instituto Superior de Estudos Brasileiros (ISEB).

Nessa fase, sua interlocução com a intelectualidade que girava em torno do PCB também ficou mais próxima.

Sodré estava convencido de que os fundamentos teóricos plantados sobre a crítica da formação social brasileira, ainda nos anos 1920, indicavam o caminho a ser trilhado e aprofundado na pesquisa. Sodré elaborou a sua interpretação da realidade histórica social do Brasil entre 1962 e 1965, com a publicação do que pode ser visto como uma “trilogia”.

Assim Sodré, nesse período, se destacou como intelectual capaz de incidir amplamente no seio do chamado mundo da cultura e da política da esquerda, tendo na prática elaborado a visão que predominou no PCB, ainda que outros intelectuais dignos de nota e que militavam à esquerda tenham também oferecido contribuições importantes, como os casos de Ignácio Rangel, Alberto Passos Guimarães, Ruy Facó e Caio Prado Jr. Apenas este último, porém, é amplamente citado no livro de Sodré.

A vitória das forças conservadoras e a instauração da ditadura militar em abril de 1964 não diminuíram a disposição de Sodré para o estudo e a publicação. Pela “direita” e pela “esquerda”, Sodré sofreu críticas muito pouco generosas e com claro objetivo de disputa política e ideológica. Era preciso mostrar que o autor tido por principal ideólogo do PCB estava seriamente equivocado e que a ação política do partido, alimentada por essa interpretação de Brasil, fora responsável pela derrota dramática de 1964. As críticas de Sodré diziam respeito à existência de “feudalismo” e de uma “burguesia nacional”.

Sodré buscou seus fundamentos teóricos na obra da Marx, em especial O capital, e de marxistas como Lenin, Rosa Luxemburgo e Lukács.

Sodré tem apreendido a particularidade da formação social brasileira a partir da elaboração de Lenin e Mariátegui.

Escravismo e feudalismo na colônia

Para Sodré era necessário identificar antes a natureza da forma social portuguesa para que se pudesse bem analisar a realidade da colonização. Não podia haver dúvida de que Portugal era um reino feudal, no qual predominava a nobreza da terra e o trabalho servil.

No entanto, em vez de se debilitar, o domínio da nobreza em Portugal

se fortaleceu com as doações de terras conquistadas aos árabes. Os laços enfraquecidos pela luta militar voltaram a enrijecer-se. A conquista robusteceu-os, e a produção feudal se restabeleceu. Com o agravante de uma área escravista que vai aparecer no extremo sul. (Sodré, 1962, p.29)

Marx alimenta a sua orientação geral.

Para Sodré, Portugal era um país no qual ainda predominava o feudalismo. Sodré pode se agregar, mas de forma bastante crítica, àquela linha historiográfica presente no Brasil desde o século XIX, que entendia ser feudal o Brasil das origens.

Sodré descarta desde logo a tese do capitalismo, pois

os que apoiaram a tese da existência de características capitalistas na empresa da colonização foram levados a isso, certamente, pela confusão que reinou por longo tempo entre as noções da capital comercial, característica da fase mercantil, e capitalismo. Hoje, parece claro que, embora tenha contribuído para a transformação de que resultou o aparecimento do modo capitalista de produção, o capital comercial, como se apresentava na época da expansão ultramarina, estava longe [...] de caracterizar o referido modo de produção. (Sodré, 1962, p.82)

Sodré assume parcialmente a tese do escravismo, proposta por Celso Furtado (1959) e, ao mesmo tempo, formula uma original visão sobre a formação social brasileira, que pode ter sido inspirada em Mariátegui (e respaldada por Lenin). Furtado e Sodré defende que o escravismo foi a forma sócio produtiva predominante na época colonial, mas acaba por desenvolver também uma formulação sobre o surgimento e desenvolvimento de um particular feudalismo no Brasil.

Quando teve início o processo de conquista e colonização do território que viria a ser o Brasil, houve um esforço de transplantar a forma feudal prevalecente no Reino, como demonstra a legislação que implantou as donatárias como forma de ocupação territorial.

O resultado foi que o feudalismo existente no Reino regrediu ao escravismo forjado na colônia. Iniciava-se assim a experiência histórica de um escravism o colonial, que tinha a sua produção voltada para o exterior, enquanto importava trabalhadores escravizados da África. A consolidação do escravismo colonial dependeu sempre do capital comercial.

No entanto, ele lembra que

as relações feudais, por vezes, misturavam-se às escravistas. O proprietário do engenho era, por vezes, proprietário de grandes extensões do interior, obtidas à base do direito feudal, e detentor, por todos os motivos, de privilégios senhoriais. De cunho feudal era, ainda, a estrutura política e administrativa que a metrópole instalara. (Sodré, 1962, p.84)

Assim, a ação colonizadora inicial foi empreendimento do capital comercial fincado em formas sociais feudais, que recriou formas escravistas e feudais na colônia. O escravismo era mais produtivo.

O feudalismo colonial era periferia do escravismo. Já o escravismo era periferia do reino feudal português.

No século XIX, o território brasileiro era um aglomerado de zonas agrícolas e coletoras sem conexão e relação entre si, que buscavam a sobrevivência e a exportação daquilo que produziam, fosse chá, algodão, açúcar, fumo, couros, com base em trabalho escravo ou servil. Mesmo assim já se podia falar da existência de uma “classe senhorial”

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