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História do povo Nacirema

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Por:   •  9/9/2014  •  Pesquisas Acadêmicas  •  2.279 Palavras (10 Páginas)  •  285 Visualizações

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Os Naciremas

O antropólogo está tão familiarizado com a diversidade das formas de comportamento que diferentes povos apresentam em situações semelhantes, que é incapaz de surpreender-se mesmo em face dos costumes mais exóticos. De fato, se nem todas as as combinações logicamente possíveis de comportamento foram ainda descobertas, o antropólogo bem pode conjeturar que elas devam existir em alguma tribo ainda não descrita.

Deste ponto de vista, as crenças e práticas mágicas dos Nacirema apresentam aspectos tão inusitados que parece apropriado descrevê-los como exemplo dos extremos a que pode chegar o comportamento humano. Foi o Professor Linton, em 1936, o primeiro a chamar a atenção dos antropólogos para os rituais dos Nacirema, mas a cultura desse povo permanece insuficientemente compreendida ainda hoje.

Trata-se de um grupo norte-americano que vive no território entre os Cree do Canadá, os Yaqui e os Tarahumare do México, e os Carib e Arawak das Antilhas. Pouco se sabe sobre sua origem, embora a tradição relate que vieram do leste. Conforme a mitologia dos Nacirema, um herói cultural, Notgnihsaw, deu origem à sua nação; ele é, por outro lado, conhecido por duas façanhas de força: ter atirado um colar de conchas, usado pelos Nacirema como dinheiro, através do rio Po- To- Mac e ter derrubado uma cerejeira na qual residiria o Espírito da Verdade.

A cultura Nacirema caracteriza-se por uma economia de mercado altamente desenvolvida, que evolui em um rico habitat. Apesar do povo dedicar muito do seu tempo às atividades econômicas, uma grande parte dos frutos deste trabalho e uma considerável porção do dia são dispensados em atividades rituais. O foco destas atividades é o corpo humano, cuja aparência e saúde surgem como o interesse dominante no ethos deste povo. Embora tal tipo de interesse não seja, por certo, raro, seus aspectos cerimoniais e a filosofia a eles associadas são singulares.

A crença fundamental subjacente a todo o sistema parece ser a de que o corpo humano é repugnante e que sua tendência natural é para a debilidade e a doença. Encarcerado em tal corpo, a única esperança do homem é desviar estas características através do uso das poderosas influências do ritual e do cerimonial. Cada moradia tem um ou mais santuários devotados a este propósito. Os indivíduos mais poderosos desta sociedade têm muitos santuários em suas casas e, de fato, a alusão à opulência de uma casa, muito frequentemente, é feita em termos do número de tais centros rituais que possua. Muitas casas são construções de madeira, toscamente pintadas, mas as câmeras de culto das mais ricas têm paredes de pedra. As famílias mais pobres imitam as ricas, aplicando placas de cerâmica às paredes de seu santuário.

Embora cada família tenha pelo menos um de tais santuários, os rituais a eles associados não são cerimônias familiares, mas sim cerimônias privadas e secretas. Os ritos, normalmente, são discutidos apenas com as crianças e, neste caso, somente durante o período em que estão sendo iniciadas em seus mistérios. Eu pude, contudo, estabelecer contato suficiente com os nativos para examinar estes santuários e obter descrições dos rituais.

O ponto focal do santuário é uma caixa ou cofre embutido na parede. Neste cofre são guardados os inúmeros encantamentos e poções mágicas sem os quais nenhum nativo acredita que poderia viver. Tais preparados são conseguidos através de uma serie de profissionais especializados, os mais poderosos dos quais são os médicos-feiticeiros, cujo auxilio deve ser recompensado com dádivas substanciais. Contudo, os médicos-feiticeiros não fornecem a seus clientes as poções de cura; somente decidem quais devem ser seus ingredientes e então os escrevem em sua linguagem antiga e secreta. Esta escrita é entendida apenas pelos médicos-feiticeiros e pelos ervatários, os quais, em troca de outra dadiva, providenciam o encantamento necessário. Os Nacirema não se desfazem do encantamento após seu uso, mas os colocam na caixa-de-encantamento do santuário doméstico. Como tais substâncias mágicas são especificas para certas doenças e as doenças do povo, reais ou imaginárias, são muitas, a caixa-de-encantamentos está geralmente a ponto de transbordar. Os pacotes mágicos são tão numerosos que as pessoas esquecem quais são suas finalidades e temem usá-los de novo. Embora os nativos sejam muito vagos quanto a este aspecto, só podemos concluir que aquilo que os leva a conservar todas as velhas substâncias é a ideia de que sua presença na caixa-de-encantamentos, em frente à qual são efetuados os ritos corporais, irá, de alguma forma, proteger o adorador.

Abaixo da caixa-de-encantamentos existe uma pequena pia batismal. Todos os dias cada membro da família, um após o outro, entra no santuário, inclina sua fronte ante a caixa-de-encantamentos, mistura diferentes tipos de águas sagradas na pia batismal e procede a um breve rito de ablução. As águas sagradas vêm do Templo da Água da comunidade, onde os sacerdotes executam elaboradas cerimônias para tornar o líquido ritualmente puro.

Na hierarquia dos mágicos profissionais, logo abaixo dos médicos-feiticeiros no que diz respeito ao prestígio, estão os especialistas cuja designação pode ser traduzida por "sagrados-homens-da-boca". Os Nacirema têm um horror quase que patológico, e ao mesmo tempo fascinação, pela cavidade bucal, cujo estado acreditam ter uma influência sobre todas as relações sociais. Acreditam que, se não fosse pelos rituais bucais seus dentes cairiam, seus amigos os abandonariam e seus namorados os rejeitariam. Acreditam também na existência de uma forte relação entre as características orais e as morais: Existe, por exemplo, uma ablução ritual da boca para as crianças que se supõe aprimorar sua fibra moral.

O ritual do corpo executado diariamente por cada Nacirema inclui um rito bucal. Apesar de serem tão escrupulosos no cuidado bucal, este rito envolve uma prática que choca o estrangeiro não iniciado, que só pode considerá-lo revoltante. Foi-me relatado que o ritual consiste na inserção de um pequeno feixe de cerdas de porco na boca juntamente com certos pós mágicos, e em movimentá-lo então numa série de gestos altamente formalizados. Além do ritual bucal privado, as pessoas procuram o mencionado sacerdote-da-boca uma ou duas vezes ao ano. Estes profissionais têm uma impressionante coleção de instrumentos, consistindo de brocas, furadores, sondas e aguilhões. O uso destes objetos no exorcismo dos demônios bucais envolve, para o cliente, uma tortura ritual quase inacreditável. O sacerdote-da-boca abre a boca do cliente e, usando os instrumentos acima citados, alarga todas as

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