Resenha De "Olhos De Madeira - Nove Reflexões Sobre A Distância" De Carlo Ginzburg
Trabalho Universitário: Resenha De "Olhos De Madeira - Nove Reflexões Sobre A Distância" De Carlo Ginzburg. Pesquise 862.000+ trabalhos acadêmicosPor: brunomengo86 • 5/5/2014 • 1.041 Palavras (5 Páginas) • 2.038 Visualizações
Ginzburg introduz seu trabalho citando o primeiro formalismo russo, concebendo a crítica literária como conhecimento rigoroso e a arte enquanto mecanismo. Evoca os nomes de Roman Jakobson e Viktor Chklovski como pilares importantes deste campo intelectual, tendo Chklovski escritos importantes sobre a psicologia humana, estudando seus hábitos inconscientes, o poder da automatização sobre o homem. É bastante interessante o trecho onde ele diz que a arte serve para que consigamos ver ao invés de apenas reconhecer. Sua função seria ressuscitar em nós a percepção da vida, nos tornar novamente sensíveis às coisas ao nosso redor. Para tal, a arte se utilizaria de dois procedimentos: o estranhamento da coisa e a complicação da forma, com a qual tornaria mais difícil a percepção e consequentemente aumentaria sua duração. Ele aponta que a arte é um meio de experimentação do devir, e o que já foi não tem importância. O próprio processo de experimentação é um fim em si mesmo, daí a necessidade de sua prolongação. O hábito torna inerte esta percepção.
Ginzburg faz um paralelo entre a ideia de Chklovski sobre a arte ser este instrumento em prol da percepção, e a obra de Proust em relação à memória involuntária. O nome de Proust não aparece em sua obra de 1917, “Recherche”, sendo os exemplos de estranhamento resgatados sobretudo de Tolstoi. Analisando o conto “Kholstomer”, Chklovski ressalta que a sensação de estranhamento não se dá através da percepção humana, mas do animal. Transcrevo aqui interessante trecho que ilustra a ideia:
“Muitos dos homens que me definiam como “seu” cavalo não cavalgavam; era outra gente que me cavalgava. Tampouco me davam o feno; isso também eram outros que faziam. Não me fizeram bem os que me chamavam de “meu cavalo”, e sim cocheiros, veterinários ou outras pessoas estranhas. Quando, mais tarde, ampliei o horizonte das minhas observações, convenci-me de que o termo “meu” não se refere apenas a nós, cavalos, mas, em geral, vem unicamente de um instinto baixo, animalesco, dos homens, instinto que eles chamam de sentimento de propriedade ou direito de propriedade. O homem diz “minha casa”, mesmo se nunca mora nela, mesmo se só cuida da sua construção e da sua manutenção. O comerciante diz “minha loja”, por exemplo “minha loja de tecidos”, mas não confecciona suas roupas nem com as melhores fazendas que lá vende. [...] Agora estou convencido de que a diferença substancial entre nós e os humanos está aí. Já por esse simples fato – e até mesmo descurando todas as outras vantagens que temos em relação a eles – temos o direito de afirmar que, na hierarquia dos seres vivos, estamos um degrau acima dos homens. A atividade dos homens, pelo menos de todos aqueles com os quais travei contato, é determinada pelas palavras, não pelos fatos.”
Além dos escritos de Tolstoi, Chklovski toma como instrumento de análise um gênero literário diferente: adivinhas com subentendidos eróticos.
Há em Chklovski um desinteresse pela história. Não apenas nele mas nos formalistas russos, algo que reforça a ideia da arte enquanto mecanismo. E se é um mecanismo, diz, Ginzburg, devemos entender como ela funciona, não como nasceu. Ginzburg evoca o nome de Brecht para norteara noção de estranhamento na arte e na teoria literária do século XX. E indaga por qual motivo Chklovski, ao realizar seus estudos, ateve-se quase em sua totalidade apenas a textos de autores russos. O que isso significava? Uma dúvida colocada pelo autor é se o estranhamento deve ser encarado como sinônimo da própria arte em geral ou se faz parte de um procedimento literário específico a um gênero.
Ginzburg utiliza como ferramenta de análise alguns escritos de Marco Aurélio, imperador romano, especificamente 12 livros constituídos de uma autobiografia e de escritos variados, a maior parte deles escrita durante campanhas militares. Há um trecho interessante onde ele diz, em imperativo, seu modo verbal favorito: “cancela a
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