A QUESTÃO REVOLUCIONÁRIA NO POEMA “FALA INICIAL”, DE CECÍLIA MEIRELES
Por: Bianca Macedo • 17/4/2015 • Ensaio • 1.294 Palavras (6 Páginas) • 1.027 Visualizações
UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE
INSTITUTO DE LETRAS E ARTES
A QUESTÃO REVOLUCIONÁRIA NO POEMA “FALA INICIAL”, DE CECÍLIA MEIRELES
BIANCA HENRIQUE DE MACEDO – 50807
Turma A
RIO GRANDE - RS
2014
A partir da leitura do poema “Fala inicial”, do livro Romanceiro da Inconfidência, de Cecília Meireles, percebi na fala do eu-lírico a contextualização de uma revolução que estava ocorrendo e na qual ele próprio estava inserido. De uma maneira única, ele nos insere no movimento que estava acontecendo através de seus sentimentos, falando, no início do poema, de sua incapacidade ao sentir a atmosfera de medo, condenação e morte, que está rodeando o ambiente ao qual ele está. Ambiente este em que o eu-lírico diz ser “atroz labirinto de esquecimento e cegueira”, algo está confuso, um emaranhado intrincado de varias coisas e que é cruel e desumano, sendo carregado pelo esquecimento e cegueira das pessoas que estão ali, como se estivessem fazendo que não estavam percebendo o certo e errado, quem é bom e quem é ruim, quem devia estar sofrendo e quem não devia, mas que fica pasma ao ver o que se sucede.
Notei uma relação de poder na segunda estrofe, em que a voz da oração vale menos do que a voz do Brigadeiro, “sobre o povo e sobre a tropa”, sobre as civis e sobre os soldados, louvando alguém já estava fora do trono. O que me lembrou da questão que envolve o livro El reino de este mundo, de Alejo Carpentier, em que o poder está no centro da historia, e que independente da cor, da posição social, isso é algo que está alem de questões humanas, está relacionado à essência humana, à ambição do homem:
(…) Y comprendía, ahora, que el hombre nunca sabe para quién padece y espera. Padece y espera y trabaja para gentes que nunca conocerá, y que a su vez padecerán y esperarán y trabajarán para otros que tampoco serán felices, pues el hombre ansía siempre una felicidad situada más allá de la porción que le es otorgada. Pero la grandeza del hombre está precisamente en querer mejorar lo que es. En imponerse tareas. (CARPENTIER, p. 79).
Assim Carpentier trouxe a questão da mimese para seu texto, o fato de basear-se na experiência humana do sujeito, assim como Cecília Meireles, de uma maneira distinta, mas que se percebe em seus versos a representação da realidade, criando algo através de uma perspectiva histórica, em que tipos históricos estão inseridos em seu poema. Um poema que, assim como os demais do Romanceiro da Inconfidência, narra acontecimentos da história desse período da inconfidência mineira, em que houve uma tentativa de revolta abortada pelo governo, contra o domínio português, além de outros motivos, e que Joaquim José da Silva Xavier, conhecido por Tiradentes, liderava um grupo que era formado pelos poetas Tomas Antonio Gonzaga e Cláudio Manuel da Costa, padre Rolim, e outros representantes da elite mineira. Assim como o personagem também histórico Mackandal, de El reino de este mundo, que foi queimado na fogueira, apesar de que seus seguidores acreditassem que não estava morto e seguiram reverenciando-o, se assimilava à figura de Jesus Cristo, esse líder da inconfidência intitulado Tiradentes teve sua imagem reproduzida de forma semelhante a Jesus, com barba e cabelo compridos, mesmo que, historicamente, saibamos que ele não poderia ter nem a barba nem o cabelo assim devido ao que se permitia o Exército Português e também para evitar a proliferação de piolhos, bem como na hora de sua execução estava careca e sem barba para que evitasse que cabelo e barba interferissem na ação da corda.
Cecília confronta a todos, através de questionamentos no poema, que nos fazem pensar sobre a temática, sobre um trecho da história do Brasil, sobre a Inconfidência Mineira e os defensores de uma causa. “Quem ordena, julga e pune?/Quem é culpado e inocente?” são questões levantadas pelo eu-lírico levanta em meio ao poema, o que faz com que quem leia, pense a situação, vá além do que já ouviu sobre a inconfidência, sobre o que lhe foi ensinado na escola, e tenha a sua própria opinião. Eu vi como uma maneira de instigar o leitor a adentrar-se no assunto, a não só pensar no que está sendo colocado, mas também repensar sobre toda essa questão revolucionária que é história de nosso país.
Em relação à formalidade do poema, vemos o uso do verso livre, em que não há uma continuidade de rimas como há em poemas parnasianos ou simbolistas, por exemplo. Não há essa linearidade, o poema se dá como em forma de uma narrativa, vai contando à sua maneira, e no seu ritmo próprio. Percebi também assonância de “o”, em palavras como na primeira estrofe aparecem “posso”, “mover”, “passos”, “por”, “atroz”, “labirinto”, “esquecimento”, “amores”, “ódios”, “vão”, “pois”, “sinto”, “sinos”, “percebo”, “roçar”, “vejo”, “arrepio”, “morte”, “voz”, “condenação”, “avisto”, “masmorra”, “sombra”, “carcereiro”, “sobre”, “coração”, o que traz ao texto um peso, um tom sombrio, trazendo um clima mais tenso e denso para o poema. O recurso das reticências também surge em meio ao texto dando margem à uma reflexão sobre o que se está falando, como nesses versos “Morre a tinta das sentenças/e o sangue dos enforcados...”, fazendo com que o leitor pense sobre o que aconteceu com o julgamento dos que enforcaram tantos e, assim, morrendo junto com as sentenças, o sangue e a resolução, a justiça em relação aos enforcados.
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