Delírios de Uma Alma Sólida
Por: Caio Queiroz • 7/11/2018 • Trabalho acadêmico • 922 Palavras (4 Páginas) • 133 Visualizações
RESENHA CRÍTICA
LUNA, Naara. “A Polêmica do Aborto e o 3º Programa Nacional de Direitos Humanos”. Revista de Ciências Sociais, Rio de Janeiro, V. 57, nº1, 2014, pp. 237 a 275.
O artigo de Naara Luna vislumbra sob a ótica da dicotômica discussão acerca do aborto em que há de um lado o grupo autodenominado pró-vida, qual seja, contrários ao aborto e em defesa da vida do feto e, do outro lado, o grupo pró-escolha, referente àqueles que são favoráveis à descriminalização do aborto como problema de saúde pública e defensores do direito de autonomia da mulher na questão reprodutiva.
LUNA divide o trabalho em três análises antropológicas distintas sobre o tema.
A primeira análise discorre sobre uma pesquisa documental contendo um breve preâmbulo do Programa Nacional de Direitos Humanos (PNDH). Iniciado em 1996, teve sua segunda edição em 2002, data no qual pela primeira vez o aborto é mencionado como questão de saúde pública e, em 2009, na terceira edição, obteve maior avanço na discussão, de acordo com a perspectiva do movimento pró-escolha, ao reivindicar a aprovação do projeto de lei que descriminaliza o aborto, “considerando a autonomia das mulheres para decidir sobre seus corpos” (p.240).
A segunda análise denominada “Levantamento de material de mídia impressa e eletrônica” (p.241) apresenta a ostensiva parcialidade da mídia tradicional ao abordar o tema de forma superficial ou ao dar espaço, majoritariamente, às opiniões contrárias a descriminalização com argumentos, em sua maioria, religiosos. As discussões mais profundas que inserem o aborto no debate sobre direitos humanos não obtiveram cobertura da grande imprensa.
A narrativa contida na terceira análise torna o leitor um participante do Seminário Aborto e Direitos Humanos. O evento foi organizado pela Comissão de Biodireito e Bioética da OAB-RJ, com o apoio da Comissão de Direitos Humanos da OAB-RJ e da OAB-Mulher e constituiu-se de juristas, profissionais da área da saúde, um parlamentar e algum convidado relacionado aos temas de religião e laicidade.
A autora narrou detalhadamente os acontecimentos do seminário e constatou que na polêmica sobre o aborto, cada grupo – pró-vida e pró-escolha – usou como fundamento o Princípio da Dignidade da Pessoa Humana, “porém atribuindo a dignidade a entes distintos: fetos e mulheres” (p. 258). Um ponto importante que distingue os dois grupos é o surgimento da vida.
O grupo pró-escolha, composto pela maioria dos palestrantes, pautam-se principalmente nos seguintes argumentos: que redação do Código Penal é insensível aos direitos das mulheres e que a proibição do aborto não inibe sua prática; a questão da mortalidade materna e dos danos à saúde ocasionado pelo aborto; a criminalização à pobreza pois as mulheres negras ou pobres vão a julgamento, além de que as mulheres com recursos financeiros têm acesso a serviços de abortamento com o cuidado de profissionais de saúde preparados, enquanto as pobres recebem orientação de conhecidos e são atendidas em ambientes desprovidos dos profissionais de saúde ou de recursos; a questão do legislativo não discutir sobre o aborto por questões eleitorais; rebatimento à fundamentação religiosa em virtude da laicidade do Estado; direito à vida da mulher pautado na dignidade da pessoa humana; assimetria de gêneros em uma sociedade patriarcal; retrocesso do chamado “Estatuto do Nascituro”, descriminalização do aborto até a décima segunda semana de gestação, entre outros.
Enquanto o grupo pró-vida, em sua maioria ouvintes, questionou a falta de democracia no debate e falta de paridade para aprofundamento da discussão, pois os palestrantes que eram contra a descriminalização do aborto não compareçam no seminário. “Para os antiabortistas, o aborto representa crime e até mesmo assassinato o que desqualifica quem pratica ou quem defende a legalização” (p.258). Denunciaram as ONGS militantes pela descriminalização, principalmente em relação a organização Católica pelo Direito de Decidir (CDD), alegando ser parte de um “complô de entidades internacionais controlistas para atacar o Brasil” (p.258). Questionaram os abortos feitos em avançado período de gestação como também o direito da mulher ao próprio corpo termina quando começa o direito do bebê à vida. Questinaram, inclusive, “por que os grupos que são favoráveis ao aborto para reduzir a mortalidade materna não se unem para reivindicar acesso à contracepção e impedir o aborto e a morte de mulheres e crianças? ” (p. 248).
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