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FRANCIS BACON: Ensaios LVIII

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Por:   •  22/11/2014  •  Tese  •  4.424 Palavras (18 Páginas)  •  553 Visualizações

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Solomon saith: "There is no new thing upon the

earth". So that as Plato had an imagination,

"that all knowledge was but remembrance"; so

Solomon giveth his sentence, "that all novelty is

but oblivion".

FRANCIS BACON: Essays LVIII.

Em Londres, em princípios do mês de junho de 1929, o antiquário Joseph

Cartaphilus, de Esmirna, ofereceu à princesa de Lucinge os seis volumes em quarto-menor

(1715-172O) da Ilíada de Pope. A princesa adquiriu-os; ao recebê-los, trocou algumas

palavras com ele. Era; diz-nos, um homem muito magro e terroso, de olhos apagados e

barba cinzenta, de traços singularmente vagos. Empregava com fluidez e ignorância as

diversas línguas; em poucos minutos, passou do francês ao inglês e do inglês a uma

conjunção enigmática de espanhol de Salonica e de português de Macau. Em outubro, a

princesa ouviu de um passageiro do Zeus que Cartaphilus havia morrido no mar, ao

regressar a Esmirna, e que o haviam enterrado na ilha de Ios. No último tomo da Ilíada

encontrou este manuscrito.

O original está escrito em inglês e é abundante em latinismos. A versão que

oferecemos é literal.

I

Que eu me lembre, meus trabalhos começaram em um jardim de Tebas

Hekatómpylos, quando Diocleciano era imperador. Militei (sem glória) nas recentes

guerras egípcias, sendo tribuno de uma legião que esteve aquartelada em Berenice, diante

do mar Vermelho: a febre e a magia consumiram muitos homens que cobiçavam com

magnanimidade o aço. Os mauritanos foram vencidos; a terra, antes ocupada pelas cidades

rebeldes, foi dedicada eternamente aos deuses plutônicos; Alexandria, debelada, implorou

em vão a misericórdia de César; antes de um ano, as legiões alcançaram o triunfo, mas eu

mal consegui divisar a face de Marte. Essa privação me doeu e foi talvez a causa de eu ter

me lançado, por temerosos e extensos desertos, a descobrir a secreta Cidade dos Imortais.

Meus trabalhos, como disse, começaram em um jardim de Tebas. Toda essa noite

não dormi, pois algo estava combatendo em meu coração. Levantei-me pouco antes do

amanhecer; meus escravos dormiam, a lua tinha a mesma cor da infinita areia. Um

cavaleiro vencido e ensangüentado vinha do oriente. A uns passos de mim, caiu do cavalo.

Com tênue voz insaciável, perguntou-me em latim o nome do rio que banhava os muros da

cidade. Respondi-lhe que era o Egito, que as chuvas alimentam. "Outro é o rio que

persigo", replicou com tristeza, "o rio secreto que purifica da morte os homens". Escuro

sangue brotava de seu peito. Disse-me que sua pátria era uma montanha que está do outro

lado do Ganges e que nessa montanha se falava que, se alguém caminhasse até o ocidente,

onde o mundo se acaba, chegaria ao rio cujas águas dão a imortalidade. Acrescentou que

na margem ulterior se ergue a Cidade dos Imortais, rica em baluartes e anfiteatros e

templos. Antes do amanhecer, morreu, mas determinei descobrir a cidade e seu rio.

Interrogados pelo verdugo, alguns prisioneiros mauritanos confirmaram a informação do

viajante; alguém lembrou a planície elísia, no fim da terra, onde a vida dos homens é

perdurável; outro, os cumes onde nasce o Pactolo, cujos moradores vivem um século. Em

Roma, conversei com filósofos que sentiram que prolongar a vida do homem era prolongar

sua agonia e multiplicar o número de suas mortes. Ignoro se acreditei alguma vez na

Cidade dos Imortais: penso que então me bastou o trabalho de procurá-la. Flávio,

procônsul de Getúlia, entregou-me duzentos soldados para a tarefa. Também recrutei

mercenários, que se disseram conhecedores dos caminhos e foram os primeiros a desertar.

Os fatos posteriores deformaram até o inextricável a lembrança de nossas primeiras

jornadas. Partimos de Arsinoe e entramos no abrasado deserto. Atravessamos o país dos

trogloditas, que devoram serpentes e carecem do comércio da palavra; o dos garamantes

da Líbia, que têm as mulheres em comum e se nutrem de leões; o da tribo dos augilas, que

só veneram o Tártaro. Fatigamos outros desertos, onde é negra a areia, onde o viajante

deve roubar as horas da noite, pois o fervor do dia é intolerável. De longe divisei a

montanha que deu nome ao Oceano: em suas ladeiras cresce o eufórbio, que anula os

venenos; no cume, vivem os sátiros, nação de homens cruéis e rústicos, inclinados à

luxúria. Que essas regiões bárbaras, onde a terra é mãe de monstros, pudessem abrigar em

seu seio uma cidade famosa, a todos nos pareceu inconcebível. Prosseguimos na marcha,

pois teria sido uma desonra retroceder. Alguns temerários dormiram com o rosto exposto à

lua; a febre os queimou; na água corrompida das cisternas outros beberam a loucura e a

morte.

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