PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ESTUDOS DE LINGUAGEM
Por: Monalliza Brun • 13/3/2022 • Resenha • 1.328 Palavras (6 Páginas) • 106 Visualizações
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UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO INSTITUTO DE LINGUAGENS
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ESTUDOS DE LINGUAGEM
RESENHA
NACCIOLI, Juçara. Chão batido. 1° edição. Sâo Paulo: Cálida, 2021.
Boninne Monalliza Brun Moraes[1]
Juçara Naccioli fez sua graduação em Letras – Língua Portuguesa/ Literatura. É especialista em Teoria e Prética da Língua Portuguesa pela Universidade Federal de Mato Grosso ( UFMT). Dedica-se às áreas da docência, artes cênicas e literária como poetisa e contista. Poeta integrante do Coletivo Literário Maria Taquara; membro do Coletivo Audiovisual Negro Quariterê e membro do Coletivo Parágrafo Cerrado. Participou do Prêmio Flip 2019 na gênero poesia ficando como finalista. Participante efetiva no teatro e na cinematografia regional. Chão batido é sua primeira obra e foi selecionada no Editorial MT Nascentes da Lei Aldir Blanc do Estado de Mato Grosso.
O livro nos apresenta poesias que envolvem mulheres, crença, honra, ancestralidade, resistência, raça, religiosidade, fé, cotidiano, conselhos, proteção e ensinamentos de vida. A autora apresentou um resgate das lembranças de sua infância, onde apresentou os lugares por onde viveu, histórias que escutava e as receitas que ali foram aprendidas. Estes cenários eram preenchidos pela figura de sua bisavô, que fazia receitas e mandigas para as pessoas que a procuravam para pedir conselhos ou cura de doença físicas ou aflições da alma. Juçara reassumiu na sua escrita o “pretuguês“ o que leva o leitor a entrar no mundo da sua vó, como se estivesse presente no momento da fala, além disto há uma continuidade melódica nas poesias que prende o leitor até o próximo aconselhamento.
Cristiane Sobral, escritora, inicia a obra prefaciando sobre a emoção que a acometeu ao ler poesias e declara como esta obra foi um presente para o mundo das Letras, anunciandom um caminho de ressignificação das humanidades. Destacou ainda o eu “ lírico”da preta velha, benzedeira que na sua grande bondade aconselha e benze quem precisar. Revelou que as linhas dos poemas remetem à ancestralidade , mostram o poder do matriacardo e o quanto respeitam sua sabedoria, tradições e o que culmina na cultura nacional, saindo do pensamento eurocêntrico ambasado na cultura dos colonizadores, dando assim vida ao pensamento declonial, buscando no autoconhecimento da história, da cultura uma identidade que está apagada.
Vale aqui ressaltar a história da construção da obra, escrita por uma mulher negra e domiciliada na região centro-oeste do Brasil, atributos que vão ao encontro do preconceito linguístico dentro e fora da academia, por considerarem uma literatura inferior e etnica. O conceito de raça surgiu em decorrência das alterações fenotípicas com a função principal de classificação de superioridade e legitimação de poder e a partir desta ideia , como Quijano afirma, foi criada a colonização e segmentando o povo:
A posterior constituição da Europa como nova identidade depois da América e a expansão do colonialismo europeu ao resto do mundo conduziram à elaboração da perspectiva eurocêntrica do conhecimento e com ela à elaboração teórica da ideia de raça como naturalização dessas relações coloniais de dominação entre europeus e não-europeus. Historicamente, isso significou uma nova maneira de legitimar as já antigas ideias e práticas de relações de superioridade/ inferioridade entre dominantes e dominados. Desde então demonstrou ser o mais eficaz e durável instrumento de dominação social universal, pois dele passou a depender outro igualmente universal, no entanto mais antigo, o intersexual ou de gênero: os povos conquistados e dominados foram postos numa situação natural de inferioridade, e consequentemente também seus traços fenotípicos, bem como suas descobertas mentais e culturais. Desse modo, raça converteu-se no primeiro critério fundamental para a distribuição da população mundial nos níveis, lugares e papéis na estrutura de poder da nova sociedade. Em outras palavras, no modo básico de classificação social universal da população mundial. (QUIJANO, 2005, p. 118).
Ressalto aqui a importância da obra, pois vivemos em uma sociedade marcada pela discriminação racial e diante destas desigualdades e discriminações que o movimento decolonial no campo da literatura vem com a expectativa de novos caminhos, autores, aprendizagens e resgate e valorização da nossa história.
Assim obra segue com poesias que mostram um mundo que já havia a mistura da influência do colonialismo europeu sobre a cultura dos negros, pois na fala da bisavó vem marcada o cristianismo, a evangelização, fazendo uma fusão de crenças, como na citação da poesia Escolhas:
... eu vô dizê pa suncê
Deus fez todo mundo
passarim avuadô
alegre livre, sorto
mas passarim
começa fazê presepada
avuá onde num deve
mexe com cousa errada
pa perdê liberdade
parece criança danada
atentano aquele que lhe criô
é risposta da vida
num é de Deus Nosso Sinhô... ( NACCIOLI, 2021, p.21)
Para Quijano, a colonialidade do poder passa da dominação através da hierarquização das culturas à dominação da hierararquização das raças, onde a raça é o que defini o padrão de dominação entre colonizadores e colonizados, configurando assim uma ideologia de poder, que articula nas relações sociais de exploração, disputa e conflito em busca do controle na economia, na sexualidade, no conhecimento e na autoridade coercitiva,
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