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Uma história de “diferenças e desigualdades” as doutrinas raciais do século xix

Por:   •  9/11/2018  •  Resenha  •  1.558 Palavras (7 Páginas)  •  861 Visualizações

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Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro

Instituto Multidisciplinar

Departamento de Letras

Aluna: Maila Francisca do Nascimento Pereira

Fichamento

Texto: Uma história de “diferenças e desigualdades” as doutrinas raciais do século xix

Autor: Lilian Mortiz

A partir de 1870 introduzem-se no cenário brasileiro teorias de pensamento até então desconhecidas, como o positivismo, o evolucionismo, o darwinismo. p35

ENTRE A EDENIZAÇÃO E A DETRAÇÃO

 A época das grandes viagens inaugura um momento específico na história ocidental, quando a percepção da diferença entre os homens torna-se tema constante, de debate e reflexão: a conquista de terras desconhecidas levava a novas concepções e posturas, já que, se era bom observar, era ainda mais fácil ouvir do que ver. Nas narrativas de viagem, que aliavam fantasia a realidade, esses “novos homens” eram frequentemente descritos como estranhos em seus costumes, diversos em sua natureza (Mello e Souza, 1986; Holanda, s. d.; Todorov, 1983; Gerbi, 1982). p35

“é no século XVIII que os “povos selvagens passam a ser entendidos e caracterizados como primitivos” (Clastres, 1983:188). Primitivos porque primeiros, no começo do gênero humano; os homens americanos se transformam-se em objetos privilegiados para a nova percepção que reduzia a humanidade a uma espécie, uma única evolução e uma possível “perfectibilidade”. p35

Em Rousseau, por exemplo, com a noção do “bom selvagem”, essa idéia estará absolutamente presente. O homem americano se transformava inclusive em modelo lógico, já que o “estado de natureza” significava, para esse autor, não o retorno a um paraíso original, e sim um trampolim para a análise da própria sociedade ocidental, um instrumento adequado para se pensar o próprio “estado, de civilização”. p36

Pergunto qual das duas — a vida civil ou a natural — é mais suscetível de tornar-se insuportável. À nossa volta vemos quase somente pessoas que se lamentam de sua existência, inúmeras até que dela se privam assim que podem … Pergunto se algum dia se ouviu dizer que um selvagem em liberdade pensa em lamentar-se da vida e querer morrer. Que se julgue pois, com menos orgulho, de que lado está a verdadeira miséria (1775/1978:251). p36

Vários pensadores corroboraram esse tipo de visão mais negativa da América, mas dois merecem uma atenção maior: Buffon. com sua tese da “infantilidade do continente”, e De Pauw, com a teoria da “degeneração americana”. p37

O pequeno porte dos animais, o escasso povoamento, a ausência de pêlos nos homens, a proliferação de espécies pequenas, de répteis e de insetos, tudo parecia corroborar a tese da debilidade e imaturidade dessa terra (Buffon, 1834). p37

“O debate se vê realmente polarizado com a introdução da noção de ‘‘degeneração”, utilizada pelo jurista Cornelius de Pauw. Até então chamavam-se de degeneradas espécies consideradas inferiores, porque menos complexas em sua conformação orgânica. A partir desse momento, porém, o termo deixa de se referir a mudanças de forma, passando a descrever ‘‘um desvio patológico do tipo original.” 6 Radicalizando os argumentos de Buffon, De Pauw acreditava que os americanos não eram apenas ‘‘imaturos” como também “decaídos”, confirmando sua tese central de “fé no progresso, e falta de fé na bondade humana” (Gerbi, op. cit.: 66).” p37

“O termo raça é introduzido na literatura mais especializada em inícios do século XIX, por Georges Cuvier, inaugurando a ideia da existência de heranças físicas permanentes entre os

vários grupos humanos (Stocking, 1968:29).” p37-38

“O discurso racial surgia, dessa maneira, como variante do debate sobre a cidadania, já que no interior desses novos modelos discorria-se mais sobre as determinações do grupo biológico do que sobre o arbítrio do indivíduo entendido como “um resultado, uma reificação dos atributos específicos da sua raça” (Galton, 1869/1988:86).” p38

PENSANDO NA ORIGEM: MONOGENISMO x POLIGENISMO

A partir de meados do século XIX a hipótese poligenista transformava-se em uma alternativa plausível, em vista da crescente sofisticação das ciências biológicas e sobretudo diante da contestação ao dogma monogenisía da Igreja. Partiam esses autores da crença na existência de vários centros de criação, que corresponderiam, por sua vez, às diferenças raciais observadas. p38

A versão poligenista permitiria, por outro lado, o fortalecimento de uma interpretação biológica na análise dos comportamentos humanos, que passam a ser crescentemente encarados como resultado imediato de leis biológicas e naturais. p38

Retornando a Hipócrates, o poligenismo insistia na idéia de que as diferentes raças humanas constituiriam “espécies diversas”, “tipos” específicos, não redutíveis, seja pela aclimatação, seja pelo cruzamento, a uma única humanidade. Nas palavras de Hannah Arendt, com o poligenismo punha-se fim não só “às leis naturais que previam um elo entre os homens de todos os povos, como à igualdade, à comunicação e à troca” (1973:77).

Entendida como um ramo das ciências naturais, a antropologia dedicava-se sobretudo à medição craniométrica, material considerado privilegiado para a análise dos povos e de sua contribuição. Essa disputa, denominada por Sol Tax como “a guerra dos trinta anos entre etnologia e antropologia: 1830-60” (Tax, 1966:10), levava não só à conformação de ciências distintas, como demarcava atuações específicas. p39

“Para esse cientista (Paul Broca), o principal elemento de análise era o crânio, a partir do qual se poderia comprovar a inter-relação entre inferioridade física e mental.” p39

O objetivo era, dessa maneira, chegar à reconstrução de “tipos”, “raças puras”, já que se condenava a hibridação humana, em função de uma suposta esterilidade das “espécies miscigenadas”. Broca e seus colegas da “Escola Craniológica Francesa” (como Gall e Topinard), adeptos da interpretação poligenista, acreditavam na tese da “imutabilidade das raças”, traçando, inclusive, paralelos entre o exemplo da não-fertilidade da mula e uma possível esterilidade do mulato (Broca, 1864). p39

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