VIDA GEMIDA EM SAMBAMBAIA
Casos: VIDA GEMIDA EM SAMBAMBAIA. Pesquise 862.000+ trabalhos acadêmicosPor: Paulinho_bs • 10/11/2013 • 2.050 Palavras (9 Páginas) • 2.515 Visualizações
“-De fé e milagre, que quem em Deus tem fé não morre de fome. Os poderes de Deus são maiores que os poderes da Seca.”
(Vida Gemida em Sambambaia)
Vida gemida em Sambambaia, publicado em 1985, o mais díspar e ambíguo em termos temáticos, estéticos e enunciativos. É um dos principais enunciados ibiapianos de reposição dos estereótipos da pobreza piauiense e de invenção, ainda mais extemporânea, em plenos anos 1980 de um espaço rural, tradicional e pobre, inscrito na memória e instituído com marcas de denúncia social, da mesma forma que Palha de Arroz. Os personagens e o espaço inventado neste romance não conheceram os tempos antigos da abastança do sertão, eles já se deparam com a seca, a pobreza, a fome, os desmandos políticos, a crise da pecuária. O sertão piauiense do século XX se apresenta depauperado, a maioria dos personagens não são fazendeiros; o foco narrativo recai, predominantemente, sobre Alonso, um homem do “povo”, vaqueiro e lavrador, que sofre, como todos do povoado Sambambaia, a aspereza da seca, necessitando, por isso, recorrer à criminalidade ou à migração para outros espaços.
É clara a indefinição política e estética de Nonon em Vida gemida, as sensibilidades estão entre a saudade e a revolta, o relato oscila entre a primeira pessoa do narrador- personagem, o filho do fazendeiro do conto original, e a terceira pessoa do narrador onisciente, ao estilo de Graciliano. O menino que narra a partir do alpendre da casa-grande paterna deixa o enredo, e um novo protagonista, Alonso, surge como que de improviso, com seu universo pobre, dando outra sequencia a um conto memorialístico, para que ele se torne romance de denúncia. Alonso não parafraseia de todo Fabiano, de Vidas secas, porque Fonte Ibiapina não concebe a concisão nas palavras e a elaboração do mutismo do personagem como técnica. Semelhante a Pau de Fumo, de Palha de Arroz, Alonso não fica inerte ante a seca, ele apela para o crime diante da miséria, roubando bodes para alimentar a família, e, além disso, é notadamente loquaz em seus gemidos identitários, nos quais o autor utiliza falas populares para lamentar a pobreza do Piauí, para se queixar dos políticos e de suas falsas promessas ou para constatar o isolamento de um lugar aonde nem o Grupo Escolar chegara ainda. Com o olhar de folclorista inseparável do romancista, o narrador não se distancia dos personagens para montar a tensão ou apontar o que seria a ignorância popular; ele quer estar junto, observar de modo compreensivo para sair em defesa das crendices do povo, de seu apego às superstições e aos ritmos da natureza, de seus folguedos que faziam esquecer o sofrimento.
O povoado de Sambambaia, no interior de Picos, cidade natal do autor, seria uma síntese e um símbolo do Piauí, um espaço pobre sobre o qual se constroem sentidos diferentes e contraditórios: “pobre aqui não vale coisa nenhuma”; “basta ser pobre pra ser um desfeitado nesta terra”; “este pedaço de chão é a melhor terra do mundo pra gente pobre viver”, “terra tão boa, mas cheia de tanto sofrimento”. É mais uma obra tensa entre identidades espaciais, entre migração e permanência, mas o apego ao torrão pobre piauiense supera a idealização de São Paulo ou do Maranhão. Apesar de ter sido anunciado como um dos primeiros romances que Fontes Ibiapina escrevera, Vida gemida em Sambambaia é publicado num momento em que o Piauí, como o Brasil de modo geral, não era mais predominantemente rural, e o próprio sertão, sobretudo a partir da modernização urbana dos anos 1970, sofria mais intensamente a migração e o esvaziamento .
As situações de fome durante a seca, as falas dos personagens, a repetição da palavra “pobre” para qualificar os sujeitos e os lugares repõem as imagens da pobreza e da rusticidade piauienses. Apesar de não ser exatamente um espaço “empobrecido”, como nos romances de Nonon que choram a saudade da fartura, o meio rural de Sambambaia era pobre, e, como na cidade de Teresina, a pobreza equiparava e desumanizava a todos: “A pobreza passando miseravelmente. Vida de cachorro, uma vida daquelas. Quase que todo mundo sofria em Sambambaia, porque [...] quase todo mundo era pobre.” É um romance feito de gemidos, articulados para fazer ressoar o estereótipo da pobreza piauiense; é exemplo de um dos mais importantes investimentos identitários da escritura de Fontes Ibiapina: a enunciação do Piauí como sertão nordestino e pobre.
Nível de Narração
O sucesso do livro está atrelado à simplicidade da linguagem (a mais difícil das virtudes literárias!). Não há exibicionismo do autor no uso de palavreado erudito. O diálogo flui espontâneo, normal, com os fatos do cotidiano. Sua linguagem é natural, direta, coloquial, simples, sóbria, condicionada ao assunto e á região, própria da linguagem moderna brasileira. A estas características deve-se ao não envelhecimento da obra, pois sua matéria está isenta do peso da idade. Uma linguagem regionalista sem afetação, sem pretensão literária e sem vínculo obrigatório a um falar específico (modismo comum na tendência regionalista). A sobriedade da construção, a nitidez das formas, a emoção sem grandiloquência, a economia de adjetivos são recursos perceptíveis em todo o livro.
NÍVEL DE DEGRADAÇÃO
O nível de degradação dos personagens era a profunda melancolia por conviver com as escassezes pluviais fizeram com que muitos se desesperassem deixando suas terras, levando consigo a memória da derrota e do desespero. Também possui cenas e episódios característicos da região, com a procissão de pedir chuva, são traços descritivos da condição do retirante. O sentido reivindicatório, entretanto não traz soluções prontas, preferindo apontar os males da região através de observação narrativa.
Em Vida Gemida em Sambambaia, primeira e mais popular romance de Fontes Ibiapina, o autor exprime intensa preocupação social, apoiado, contudo, na análise psicológica dos personagens, especialmente o homem nordestino, sob pressão de forças atávicas que o impelem à aceitação fatalista do destino. Há uma tomada de
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