As vicissitudes do feminino em situação de violência.
Por: jarismara • 10/2/2020 • Artigo • 6.294 Palavras (26 Páginas) • 165 Visualizações
As vicissitudes do feminino em situação de violência.
Jarismara Quednau – jarismara@gmail.com.
Especialização em Teoria e Clínica Psicanalítica.
Instituto de Pós-Graduação – CIAP Educacional.
Cacoal, Rondônia.
30 de outubro de 2019.
Resumo
A presente construção teórica, cerceada pela teoria psicanalítica, tem o intuito de agrupar uma breve bibliografia sobre as ligações amorosas na neurose histérica. Objetivamos compreender o porquê de mulheres, conhecedoras dos direitos que as amparam, inseridas nas cenas de violência recorrentes, não rompem com esta condição. Esta construção é uma revisão de literatura, que primeiro trata sobre violência, gênero, construções sociais e políticas públicas, para depois recorrer às contribuições teóricas de autores que utilizaram as obras Freudianas, bem como usaremos as obras do próprio Freud. Para estudar a construção da subjetividade feminina e a forma como o modelo da relação entre mãe e filha se repete nas relações amorosas é imprescindível recorremos às teorias freudianas do Complexo de Édipo, da castração, do masoquismo e da catástrofe. É visível a existência da repetição da posição de assujeitamento nas relações amorosas, que aponta para o jeito único de ser mulher, de vincular-se assujeitada ao outro, na ausência do amor, tem-se o desamor, no fim, a consumação da fantasia e a satisfação do desejo experimentado como um gozo único, o gozo feminino.
Palavras-chave: Mulher. Violência. Desejo. Gozo. Psicanálise.
1. INTRODUÇÃO
O Estado busca cessar a violência de gênero por meio de politicas públicas, como a criação de leis, acentuando a carência de mecanismos efecientes contra esse fenômeno multifacetado, denominado violência. Em relação as mulheres que se encontram inseridas na cena de violência, é imprescindível a presença de mecanismos eficientes, não apenas relacionados as leis que inflingem punições, mas, principalmente no engajamento à mudança da posição subjetiva. Nisto a psicnálise poderá contribuir, ofertando uma alternativa para expor os engodos que atravessam a violência de gênero.
Neste contexto, avançamos na compreensão acerca do que aflige as mulheres que procuram as instituições de apoio e amparo e mesmo sendo assistida pelo Estado, não saem da cena de violência na qual estão inseridas. O que motiva uma mulher a submeter-se e permanecer silenciosamente na violência, mesmo sabedora dos direitos que a amparam? O que isso diz sobre o gozo feminino e seu desejo? Para compreender as escolhas das mulheres com destino à feminilidade e suas vicissitudes, é preciso entender a violência, orquestrada como um sintoma, que fundamenta o gozo feminino, dentro da lógica agressor e agredida.
Para Freud a possibilidade do lançamento da psicanálise nas instituições públicas, iria acontecer com o tempo, devido a demanda, para ele os serviços da psicanálise seriam ofertados a população por meio do Estado, com adequações na sua prática, porém, mantendo a essência. A psicanálise pode ser um método eficaz para a promoção da saúde, sua inclusão nas políticas públicas, é fundamental para que possa ofertar suas contribuições.
Dentro da lógica neurótica da espancada, é essêncial que dois sujeitos estejam em cena, logo a mulher que, inconscientemente, se coloca na posição de agredida, precisa se implicar neste jogo e para que isso aconteça é preciso que haja identificação subjetiva. É imprescindível entender o feminino e seu gozo peculiar, para então desenvolver políticas, de fato, efetivas.
Optou-se pela realização de uma revisão de literatura, com abordagem qualitativa-descritiva, onde realizou-se um levantamento sobre violência, gênero, construções sociais e políticas públicas, para depois recorrer às contribuições teóricas da psicanálise cerceadas nas obras de Freud, que tratam da feminilidade e gozo peculiar. Amplamente discutida no cenário das políticas públicas, a violência de gênero porém, não conta com o aporte teórico de pesquisas que dizem respeito ao que mantém essas mulheres na cena de violência, o que desencadeou o interesse pelo tema.
2. DESENVOLVIMENTO
2.1 Violência, gênero, construções sociais e políticas públicas.
O Relatório Mundial sobre Violência e Saúde, agrupou diferentes posições adotadas por diversos países e culturas, como meio de combate a violência em sua diversidade. De acordo como o Relatório Mundial sobre Violência e Saúde:
Configura-se como violência o uso intencional da força física ou do poder, real ou em ameaça, contra si próprio, contra outra pessoa, ou contra um grupo ou comunidade, que resulte ou tenha grande possibilidade de resultar em lesão, morte, dano psicológico, deficiência de desenvolvimento ou privação (OMS, 2002).
Para Krug, E. G. et al (2002) o relatório intenciona propor uma tipologia para cada ato violento, com três categorias que se dividem em: “violência auto-infligida, coletiva e interpessoal”. As violências familiares seriam um subtipo da violência interpessoal e ficariam divididas em violência entre parceiros íntimos, contra a criança e o adolescente e contra o idoso, podendo ser de natureza física, psicológica, sexual ou envolver negligência ou privação.
Definir gênero está aquém da biologia, onde somos classificados pelo sexo com o qual nascemos, já que este, é uma construção sociocultural, onde existe uma educação diferenciada para mulheres e homens, induzindo e fortalecendo papéis e estereótipos (LISBOA; PINHEIRO, 2005). Beauvoir (1990, p. 9) enfatiza que: “não se nasce mulher, torna-se mulher”, a construção cultural impressa no gênero, possibilita o entendimento, em poucas palavras, de que precisa-se aprender a ser mulher, o feminino não esta inscrito na biologia, sobre isto, Freud tem muito a dizer e será discutido no caminhar desta construção teorica.
Neste sentido, para Leôncio et al (2008) qualquer ato que resulte ou possa vir a resultar em prejuízo psicológico, físico, moral, sexual ou patrimonial, ou ainda em sofrimentos tais como: ameaças, chantagens, coação e privação da liberdade, manipulação, controle da vida pessoal ou pública, pelo simples fato de a vítima ser do gênero feminino, independente do sexo biológico, é uma violência de gênero.
A violência deve ser estudada como um fenômeno multifacetado, associado a problemas variados, complexos e de natureza distinta, podendo estar atrelado a questões estruturais e culturais, tais como o poder, gênero, subjetividade, assujeitamento(DA FONSECA, D. H; RIBEIRO, C. G.; BARBOSA, N. S. 2012).
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