FOLHA EXPLICA A ADOLESCÊNCIA CONTARDO CALLIGARIS 1. ELEMENTOS DE DEFINIÇÃO A ADOLESCÊNCIA COMO MORATÓRIA Imagine Que, Por Algum Acidente, Você Seja Transportado, De Uma Hora Para Outra, A Uma Sociedade Totalmente Diferente. Digamos Que O Avião No Q
Artigos Científicos: FOLHA EXPLICA A ADOLESCÊNCIA CONTARDO CALLIGARIS 1. ELEMENTOS DE DEFINIÇÃO A ADOLESCÊNCIA COMO MORATÓRIA Imagine Que, Por Algum Acidente, Você Seja Transportado, De Uma Hora Para Outra, A Uma Sociedade Totalmente Diferente. Digamos Que O Avião No Q. Pesquise 862.000+ trabalhos acadêmicosPor: manuzih15 • 14/3/2015 • 3.723 Palavras (15 Páginas) • 754 Visualizações
FOLHA EXPLICA
A ADOLESCÊNCIA CONTARDO CALLIGARIS
1. ELEMENTOS DE DEFINIÇÃO
A ADOLESCÊNCIA COMO MORATÓRIA
Imagine que, por algum acidente, você seja transportado, de uma hora para outra, a uma sociedade
totalmente diferente. Digamos que o avião no qual você estava sobrevoando um canto recôndito da
Amazônia teve uma dificuldade téc
nica. O piloto conseguiu aterrissar, mas o aparelho está
destruído. Não há como esperar socorro, nem como sair do fundo selvagem da floresta. Por sorte,
uma tribo de índios que nunca encontraram homens modernos, mas que são relativamente bem-
humorados, adota você e seus amigos. Será necessário, imaginemos, 12 anos para que vocês se
entrosem com os usos e costumes de sua nova tribo - desde a linguagem até o entendimento dos
valo
res da sociedade em que aparentemente vocês viverão o resto de seus dias.
Os 12 anos passaram. Você agora fala corrente
mente a língua, conhece as leis e regras de sua nova
tribo, na verdade se sente um deles. Entre as coisas que você aprendeu, está o fato evidente de que,
nessa sociedade, é importante sobressair e adquirir destaque. E, para se destacar, há principalmente
dois campos, seja você homem ou mulher: a pesca com o arpão e as serenatas de berimbau. Em
outras palavras, nessa sociedade é bom e necessário ser um excelente pescador com o arpão e tocar
magistralmente o berimbau-de-boca. Quem melhor pesca e toca - todos percebem- é clara
mente
muito mais feliz do que os outros.
Você está muito satisfeito com isso. Pois, durante os 12 anos, você olhou, imitou e aprendeu. Você
na verdade se acha e talvez seja mesmo ótimo na pesca com o arpão - pelos anos na selva, seu corpo
está treinado, forte e rápido - e está prestes a desafiar qual
quer um numa serenata de berimbau.
Nessa altura, os anciões da tribo lhe comunicam o seguinte: talvez você tenha tamanho e perícia
suficientes para encarar tanto um surubim de dois metros quanto um berimbau dos mais
sofisticados, mas é melhor esperar mais dez anos antes de vir fazer propriamente parte da tribo e,
portanto, competir de igual para igual com os outros membros. Naturalmente, os anciões
acrescentarão que esse "pequeno" atraso é inteiramente para seu bem. Eles amam você e por isso
querem que ainda por um tempo você seja protegido dos perigosíssimos surubins que andam por ai.
Isso sem falar dos berimbaus ...
Portanto, você vai poder se preparar melhor ainda para o dia em que será enfim reconhecido como
membro da tribo. Que tudo isso, acrescentarão também os anciões, não constitua frustração
nenhuma, pois na verdade a tribo inteira considera que você tirou a sorte grande e que os ditos dez
anos serão os mais felizes de sua existência. Você - acrescentam eles - não terá as pesadas
responsabilidades dos membros da tribo. Ao mesmo tempo, poderá pescar e tocar berimbau à
vontade - será apenas como treino, de brincadeira, mas justamente por isso serão atividades
despreocupadas.
Agora, seriamente, como você acha que encara
ria o anúncio e a perspectiva desses dez anos de
limbo? Logo agora que você achava que seu berimbau ia seduzir qualquer ouvido e sua destreza
transfixar peixes de olhos quase fechados ...
É bem provável que você passasse por um leque variado de sentimentos: raiva, ojeriza, desprezo e
enfim rebeldia. Se houvesse uma tribo inimiga, se
ria o momento de considerar uma traição. No
míni
mo, você voltaria a se agrupar com os companheiros do avião, que talvez você tivesse perdido
de vista e que agora estariam lidando com a imposição da mesma moratória. Juntos, vocês
acabariam constituindo uma espécie de tribo na tribo, outorgando-se mutuamente o reconhecimento
que a sociedade parece temporariamente negar a vocês todos.Vocês se afastariam de suas famílias
(adotivas, no caso) e viveriam no e pelo grupo, onde se sentem tratados como homens e mulheres
de verdade. Circulando em grupo, impondo sua presença rebelde pelas ruas da aldeia
se possível
nas horas menos adequadas -, vocês se
riam fonte de preocupação e medo, objeto de re
pressão e,
quem sabe, de inveja.
Pois bem: o que acontece com nossos adolescentes é parecido com o destino dos aeronáufragos
dessa pequena história. Ao longo de mais ou menos 12 anos, as crianças, por assim dizer, se
integram em nossa cultura e, entre outras coisas, elas aprendem que há dois campos nos quais
importa se destacar para chegar à felicidade e ao reconhecimento pela comunidade: as relações
amorosas/sexuais e o poder (ou melhor, a potência) no campo produtivo, financeiro e
...