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RAIZES DA VIOLÊNCIA

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Por:   •  10/8/2014  •  2.676 Palavras (11 Páginas)  •  233 Visualizações

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COMPORTAMENTO

PARTE II – RAÍZES SOCIAIS DA VIOLÊNCIA

Drauzio Varella

Concentração populacional e violência

Em 1962, John Calhoun publicou na revista Scientific American um estudo que ganhou os jornais diários e teve repercussão no

meio científico. No artigo “Densidade Populacional e Patologia Social”, o autor relatava um experimento sobre as consequências

do aumento da população de ratos, numa gaiola com um comedor na parte central e outros distribuídos pelos cantos.

O aumento do número de animais na gaiola provocava sua aglomeração em volta do comedor central, embora houvesse espaço

à vontade ao redor dos comedores laterais. Como cada rato queria para si a posição mais privilegiada no centro, começavam as

disputas. Quanto maior a concentração de ratos, maior a violência das brigas: mordidas, ataques sexuais, mortes e canibalismo.

Naqueles anos 1960, o experimento foi um prato cheio para os comportamentalistas (behavioristas) e o público em geral.

Oferecia uma explicação simples para a epidemia de violência que a TV começava a mostrar nas grandes cidades: turbas

enfurecidas, polícia, bombas de gás lacrimogêneo, saques e as gangues urbanas. Assim como os ratos se matavam por uma

posição no meio da gaiola, os homens se agrediam no centro das cidades, concluíram todos.

Durante décadas, a imagem da “gaiola comportamental” de Calhoun contaminou o entendimento das causas da violência urbana:

quanto maior a concentração de gente nos centros urbanos mais violência, tornou-se crença geral. Ninguém lembrou que, no

centro de Tóquio apinhado de gente, uma senhora pode andar tranquila à meia-noite, e que São Paulo ou Los Angeles, cidades de

grande extensão e densidade populacional muito menor, estão entre as cidades mais violentas do mundo. É o que dá extrapolar

diretamente para o homem dados obtidos com animais. Apesar de mamíferos, os roedores não são primatas.

Aprendendo com os chimpanzés

Os primeiros abalos sofridos pela “gaiola comportamental” vieram da primatologia que começou a nascer nos anos 70. Em 1971,

B. Alexander e E. Roth, do Oregon Regional Primate Research Center, descreveram brigas ferozes e até mortais entre macacos

japoneses, quando os animais previamente mantidos em cativeiro eram libertados num espaço 73 vezes maior.

Em 1982, dois holandeses, F. De Waal e K. Nieuwenhuijsen, publicaram um estudo fundamental com os chimpanzés mantidos na

colônia de Arnhem. Nela, os chimpanzés ficavam soltos numa ilha durante o verão e eram recolhidos a uma clausura com

calefação nos meses frios. O espaço nesse ambiente fechado ficava reduzido a apenas 5% daquele disponível nos meses quentes,

na ilha. Depois de analisar os dados colhidos em centenas de horas de observação de campo, os autores concluíram que,

fechados, os chipanzés pareciam mais irritados, às vezes, tensos, mas não abertamente agressivos.

Os machos dispostos a desafiar a hierarquia complexa das sociedades chimpanzés adotavam postura cautelosa no inverno:

curvar-se diante do macho alfa (dominante) e agradar seu pelo. As diferenças eram acertadas nos meses quentes, na ilha: o

número de conflitos agressivos dobrava.

O pavilhão 5 da Casa de Detenção de São Paulo (Carandiru) alberga cerca de 1.600 presos. Vão para lá, os que têm problema de

convivência com a massa carcerária: estupradores, justiceiros, delatores, craqueiros endividados e outros que infringiram a ética

do crime. Feito sardinha em lata, cinco, seis e até doze homens dividem xadrezes com pouco mais de oito metros quadrados de

área útil. É a maior concentração de presos da cadeia.

Nos últimos 2 anos, no pavilhão 5 houve apenas uma morte. Morreu muito mais gente nos pavilhões menos povoados. Quantas

mortes teriam ocorrido nesses dois anos, caso esses mil e seiscentos homens estivessem em liberdade?

Entre os primatas, o aumento da densidade populacional não conduz necessariamente à violência desenfreada. Diante da

redução do espaço físico, criamos leis mais fortes para controlar os impulsos individuais e impedir a barbárie. Tal estratégia de

sobrevivência tem lógica evolucionista: descendemos de ancestrais que tiveram sucesso na defesa da integridade de seus grupos;

os incapazes de fazê-lo não deixaram descendentes. Definitivamente, não somos como os ratos.

Como já dissemos, a análise que a sociedade costuma fazer da violência urbana é baseada em fatores emocionais, quase sempre

gerados por um crime chocante, pela falta de segurança nas ruas do bairro, preconceito social ou discriminação. As conclusões

dos estudos científicos não costumam ser levadas em conta na definição de políticas públicas. Nos últimos anos, foram

desenvolvidos métodos analíticos mais precisos para avaliar a influência dos fatores econômicos, epidemiológicos e

sociológicos associados às raízes sociais da violência urbana: pobreza, impunidade, acesso a armamento, narcotráfico,

intolerância social, ruptura de laços familiares, imigração, corrupção de autoridades ou descrédito na Justiça.

A maior parte dessas pesquisas é conduzida nos Estados Unidos, talvez porque os europeus tenham estado menos preocupados

com o problema,

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