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Diversão com café

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Por:   •  9/10/2014  •  Tese  •  3.301 Palavras (14 Páginas)  •  317 Visualizações

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Platitudes com Café

domingo, 14 de setembro de 2014

velado em papel de pauta

Postado por Maurílio Resende às 22:33 Nenhum comentário:

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quarta-feira, 10 de setembro de 2014

dentes-de-leão

I

Ela saltou do ônibus com a cabeça nas nuvens. Era estranho estar ali. Conhecia o lugar, mas era a primeira vez que pisava naquela rodoviária sabendo que demoraria um tempo para voltar, que tinha uma nova casa agora, e uma nova vida despontava naquela tarde quente, coisa abafada, tão diferente do tempo a que estava acostumada desde sempre.

Ela tinha 22. Carregava nos ombros uma mochila pesada e no peito um coração que não conseguia calar. Ele batia com vida. Cumpria o seu papel, apesar do medo e da dúvida, e das feridas que quase o silenciaram. Passadas, agora, passado, tão presente que era quase impossível acreditar que estivesse mesmo ali, meio perdida numa rodoviária suja, e não na prisão habitual, da qual acreditara que jamais sairia.

Caminhou lentamente, ciente de alguns olhares, da sensação estranha no estômago, da necessidade de se distrair um pouco, se perder nos devaneios. Ela andava de um jeito diferente, como quem não sabe ao certo aonde vai, ou tem tanta certeza de onde quer chegar que pouco importa se seus pés tocam o céu ou o chão. Talvez os dois. Se existe uma coisa sobre sonhos, é que eles comportam a certeza e a dúvida de uma maneira única, e ela tinha mesmo essa maneira toda única de se comportar.

***

O Centro da cidade é um lugar assustador. Ela vinha de longe, onde todos ouviam histórias sobre os perigos daquela terra cinza. Não era um lugar muito bonito, mesmo para ela, que tentava enxergar a beleza de cada coisa.

Havia, no entanto, os detalhes, e neles estavam sua sorte. Destacados aos olhos bem treinados, pintavam o retrato de uma solidão coletiva: a mulher com as crianças, que esperava condução no ponto ao lado, parecia sozinha. O fiscal rodoviário, que tragava de semblante fechado seu cigarro de filtro amarelo, também. O mendigo enrolado na manta, o jovem de camisa social e bíblia embaixo do braço, o velhinho todo arrumado. Sozinhos.

Ela sentia certa afeição pelos solitários, pelos andarilhos, tendo ela própria crescido como um. Sabia que, se você tem sorte nessa vida, vai encontrar pessoas com quem dividir segredos e sonhos, planos e conspirações, mas que nem sempre conseguirão aplacar o vazio que trazemos enraizado na alma, a vontade de fugir, de encontrar o novo, de ser levado e semear. Ao vento, dentes-de-leão.

II

Eram quatro estações até o seu bairro, um microcosmo que tentava decidir se era Centro ou Zona Sul.

Um rapaz no vagão fazia malabares por dinheiro. A caixinha de som aos seus pés tocava uma melodia misteriosa enquanto ele meio dançava, meio tentava não cair, equilibrando nas mãos três bolas de contato. Para ela, parecia um menino desajeitado brincando com mundos que eram dele e de mais ninguém.

Ela catou nos bolsos algumas moedas, mas sabia que aquilo era detalhe. Fazia questão de prestar atenção, doar seu tempo, observar cada movimento, perceber como se encaixava à música, ou tentava.

Algumas pessoas olhavam para ele, com um sorriso brincando nos lábios, ou então contrariadas, como se não gostassem de perceber que gostavam daquilo que viam. Alguns resmungavam impacientes e outros o ignoravam, alheios, fones de ouvido, ocupados demais com suas vidas.

Na chegada da sua estação, levantou apressada, colocou as moedas aos pés do artista, com um sorriso sincero, um aceno, e saiu.

III

O apartamento fica no quarto andar. É algo pequeno e aconchegante, ou pelo menos será, assim que der uma geral em tudo. É um bom lugar para chamar de seu, e ela quase consegue enxergar onde colocará cada coisa. Nas paredes, seus quadros, pôsteres de bandas e de filmes antigos. Um sofá pequeno e uma mesinha para escrever e estudar, o violão no canto, o ukulele sobre a cama, livros organizados na cômoda de segunda mão... e um gato. É difícil pensar nisso sem sorrir, meio boba, meio orgulhosa.

Cansada, deixa cair a mochila, suspirando ao sentir o estresse nos ombros. Abre a janela e observa a rua, sua rua, e o céu. É quase noite. Quer dormir, descansar um pouco. Mas ainda não. Tem coisas a fazer antes de dormir, antes do dia seguinte, o primeiro dia.

Tira da mochila uma muda de roupas e alguns livros de poesia, que deixa sobre a cama. De um bolso lateral, tira três garrafinhas de vidro, uma com areia vermelha, outra com pedras e algumas folhas secas. A terceira delas, fria ao toque, parece vazia, embora vibre de forma quase imperceptível. É onde guarda seus fantasmas, aqueles dos quais ainda não conseguira abrir mão, cujos sussurros ainda precisava ouvir de vez quando.

Coloca as garrafas sobre a mesa de cabeceira, olha ao redor, tentando compreender mais uma vez a realidade de tudo. E vai lavar o banheiro.

***

As horas passam. Ela está exausta, mas o apartamento está brilhando, como novo, ou quase. As roupas para o dia seguinte estão separadas sobre uma cadeira. Já passa das onze, e ela se permite um cigarro. O primeiro em dias, cada vez mais um capricho, algo descartável, não mais uma fuga.

Deixa o corpo cansado, dolorido, cair sobre a cama, onde se embola nos cobertores e desiste (quente demais), joga todo o pano para um canto e respira fundo, orgulhosa. Pensa numa música, em algo que não consegue tirar da cabeça. No escuro, seus olhos brilham. Ela pensa nos fantasmas na garrafa, mas só por um segundo, um instante, breve, antes de se entregar ao sono.

IV

Em

...

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