DESGRANDES, Flávio. O Efeito Estético Finalidade Sem Fim. Revista Urdimento, nº 17, Setembro De 2011.
Monografias: DESGRANDES, Flávio. O Efeito Estético Finalidade Sem Fim. Revista Urdimento, nº 17, Setembro De 2011.. Pesquise 862.000+ trabalhos acadêmicosPor: jessicasantos2 • 4/11/2013 • 1.010 Palavras (5 Páginas) • 522 Visualizações
No livro Le spectateur
émancipé2 - com tradução
para o português3 -
em que se propõe a
analisar a emancipação
do espectador em face das manifestações
artísticas contemporâneas, Jacques Rancière
traça uma comparação da atitude proposta
ao leitor no campo da arte com a participação
conferida aos alunos em um processo
pedagógico. Para isso, Rancière se vale das
reflexões concebidas em outro livro seu,
intitulado O Mestre Ignorante4, em que aborda
as excêntricas opções pedagógicas de Joseph
Jacotot, professor francês do início do século
XIX. O que marca a linha educacional adotada
por esse mestre é justamente o fato de colocarse
em situações em que sua própria ignorância
configura-se como marca fundamental do
processo instaurado. Seu primeiro desafio
começa em 1818, quando convidado a assumir
o cargo de professor nos Países Baixos: seus
alunos não falavam francês e ele ignorava
totalmente o holandês, não havia pois uma
língua comum em que pudessem estabelecer
uma situação educacional. Naquela época
havia sido publicada uma versão bilíngue
de As Aventuras de Telêmaco, de Fénelon, um
dos romances franceses mais lidos durante
o século XVIII, e Jacotot viu ali uma saída,
propôs que os alunos lessem o livro e, por
conta própria, escrevessem em francês o
que pensavam de tudo o que haviam lido.
Esperava por barbaridades, pois:
1 Professor livre-docente do Departamento de Artes Cênicas
da USP. Autor dos seguintes livros: Pedagogia do Espectador,
Hucitec, 2003; Pedagogia do Teatro: provocação e dialogismo,
Hucitec, 2006.
2 RANCIÈRE, Jacques. Le spectateur émancipé. Paris: La
fabrique, 2008.
3 RANCIÈRE, Jacques. O Espectador emancipado. Lisboa:
Orfeu Negro, 2010.
4 RANCIÈRE, Jacques. O Mestre Ignorante – cinco lições sobre
a emancipação intelectual. Belo Horizonte, Autêntica, 2005.
Como, de fato, poderiam todos esses
jovens, privados de explicações,
compreender e resolver dificuldades
de uma língua nova para eles? De toda
forma, era preciso verificar até onde esse
novo caminho, aberto por acaso, os havia
conduzido e quais os resultados desse
empirismo desesperado. Mas, qual não
foi sua surpresa quando descobriu que
seus alunos, abandonados a si mesmos,
se haviam saído tão bem dessa situação
quanto o fariam muitos franceses! (apud
RANCIÈRE, 2005, p. 18-19).
Até então Jacotot acreditava que
a principal tarefa dos mestres era a de
transmitir seu saber aos alunos, não se
tratava, bem sabia, de “entupir os alunos de
conhecimentos, fazendo-os repetir como
papagaios, mas, também, que é preciso
evitar esses caminhos do acaso, onde
se perdem os espíritos ainda incapazes
de distinguir o essencial do acessório”
(RANCIÈRE, 2005, p. 19). A atitude
adotada pelo professor deveria interligar
com clareza causa e consequência, tecer
relações evidentes entre os métodos
educacionais propostos e o fim almejado,
estabelecido a priori; assim o aluno poderia
progredir, ao apropriar-se racionalmente
do conhecimento, que o levaria à formação
do julgamento e do gosto.
A experiência nos Países Baixos
colocava em questão uma evidência de
todo o sistema de ensino: a necessidade
de explicações; sozinhos os alunos
haviam buscado e combinado as
palavras francesas correspondentes às
que conheciam, sem explicações sobre
ortografia e conjugações. Explicar alguma
coisa a alguém parece, antes de mais
nada, analisa Rancière, demonstrar-lhe
que não poderia compreender por si só;
o que cria uma dependência permanente
do mestre, de quem o aluno sempre
precisará, e a quem sempre recorrerá para
obter as necessárias explicações sobre os
novos
...