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Desenvolvimento mental e cognitivos

Por:   •  22/9/2015  •  Artigo  •  5.998 Palavras (24 Páginas)  •  362 Visualizações

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DESENVOLVIMENTO DA MEMÓRIA: INFLUÊNCIAS DO CONHECIMENTO DE BASE E DO USO DE ESTRATÉGIAS

Claudia Berlim de Mello1 e Gilberto Fernando Xavier2

1Núcleo de Atendimento Neuropsicológico Infantil, Departamento de Psicobiologia da Universidade Federal de São Paulo, E-mail cberlim@ib.usp.br e 2Departamento de Fisiologia do Instituto de Biociências da Universidade de São Paulo, E-mail: gfxavier@usp.br

Alguns tipos de memória melhoram substancialmente ao longo do desenvolvimento infantil. Na fase escolar, em especial, mudanças quantitativas e qualitativas são observadas no desempenho de tarefas que requerem aquisição, armazenamento e recordação de informações e estão envolvidas na ampliação do vocabulário, na formação de conceitos e nos processos de resolução de problemas. Dentre os fatores implicados nessas mudanças, tem-se apontado o uso progressivo de estratégias de memória e o montante de conhecimento geral, que cada criança constrói por meio das suas experiências cotidianas e da instrução formal, além dos processos de maturação de seu sistema nervoso. Uma análise sobre a influência destes fatores é relevante para o entendimento de diferenças individuais em termos das competências mnemônicas, bem como de problemas de aprendizagem que algumas crianças apresentam. Esse será o tema central deste capítulo.

Módulos de memória

A quantidade de evidências que favorece a noção de que memória compreende um conjunto de habilidades mediadas por diferentes módulos do sistema nervoso vem crescendo sistematicamente (para revisão ver Xavier1). Além de estarem relacionados com o funcionamento de diferentes circuitos do sistema nervoso, esses módulos podem ser dissociados em termos na natureza da informação processada e de suas regras intrínsecas de operação, que são distintas; ainda assim, numa pessoa normal, eles funcionam de modo cooperativo e integrado, gerando a sensação de um sistema único de memória.

Evidências neuropsicológicas e experimentais destas diferenças têm levado à formulação de diferentes modelos teóricos sobre esses módulos de memória.

Por exemplo, memória semântica corresponderia ao armazenamento de informações relativas aos conhecimentos gerais, incluindo conceitos, significados de palavras e fatos socialmente compartilhados; i.e., informações passíveis de relato verbal, mas que não possuem um contexto espacial e temporal específicos, pois sua formulação depende de múltiplos encontros com a informação (para gerar o conceito de "cadeira" há necessidade da exposição a diferentes exemplares, em diferentes ocasiões). Já a recordação de eventos passíveis de relato verbal e que dizem respeito à história pessoal - tendo, portanto, um contexto espacial e temporal específico - como a lembrança de uma viagem ou o encontro com um amigo, é atribuída à memória episódica. Tanto os conhecimentos gerais quanto os eventos individualmente vivenciados podem ser armazenados por longos períodos de tempo, às vezes indefinidamente. Assim, considera-se que os sistemas de memória episódica e semântica constituiriam subdivisões do sistema de memória de longa duração (ou memória duradoura). Constata-se que esses sistemas se caracterizam pelo fato de que as informações neles contidas podem ser relatadas verbalmente, ou seja, a pessoa tem acesso consciente ao conteúdo da informação e pode, assim, declará-las. Dessa forma, são denominados como sistemas de memória declarativa ou explícita.

A aquisição de certos tipos de habilidades, como caminhar sobre as duas pernas, o complexo conjunto de movimentos envolvidos no ato de escrever com um lápis, teclar habilidosamente num computador, andar de bicicleta ou dirigir um automóvel, utilizar um espelho para fazer a barba ou maquiar-se, envolve treinamento repetitivo, sendo sua aquisição gradual. Uma vez adquiridos, esses conteúdos são armazenados sem que o indivíduo consiga descrevê-los verbalmente (por exemplo, como sabemos desencadear precisamente os movimentos de cada um dos dedos necessários, numa seqüência definida, para teclarmos a palavra "coração"? Quando andamos de bicicleta, como sabemos o quanto inclinar com o corpo ao fazermos uma curva, sabendo que a mesma tem certo ângulo, estamos a certa velocidade e queremos evitar um buraco no chão?). Embora seja difícil apresentar um relato verbal preciso sobre como esses desempenhos são realizados, esse tipo de memórias manifesta-se sob a forma do desempenho habilidoso da atividade previamente treinada.  O sistema associado a estas aquisições é denominado de memória implícita, que também seria um dos sub-componentes dos sistemas de memória de longa duração.

Por outro lado, certas informações que são relevantes somente para a execução de uma dada tarefa são mantidas apenas enquanto úteis e logo esquecidas. É o caso, por exemplo, da memorização temporária de um número de telefone que só é registrado e mantido até ser discado, ou da leitura de uma frase (há necessidade de reter o que foi lido antes para criarmos uma síntese da idéia defendida na mesma - depois de criada a síntese, a informação deixa de ser relevante, podendo ser apagada). A manutenção ativa de certos conteúdos na memória, enquanto esses conteúdos são relevantes, envolve a memória operacional (um tipo de memória de curta duração, de capacidade limitada, para informações passíveis de relato verbal, cujo conteúdo é descartado após o uso).

A observação destas diferenças no tempo de permanência da informação levou à definição dos sistemas de memória de longa e de curta duração (esta última podendo ser mantida ativamente, enquanto útil, caso em que é denominada memória operacional) que se diferenciam, portanto, em termos de sua capacidade de armazenamento.

Admite-se que a memória operacional é constituída por múltiplos componentes2.  Na perspectiva deste modelo, entende-se que as informações não são apenas mantidas temporariamente como também mentalmente manipuladas, o que é importante para a execução de certas operações ou tarefas intelectuais, como um cálculo mental. Na formulação original deste modelo, considera-se a existência de dois sub-sistemas de armazenamento, um para o arquivamento de informações verbais, na "alça fonológica", e outro para o arquivamento de informações de natureza vísuo-espacial, na "alça vísuo-espacial". O funcionamento da alça fonológica se expressa em termos da reverberação, isto é, na repetição, geralmente silenciosa (sub-vocal), das informações verbais mantidas. É o que ocorre quando o número do telefone é continuamente repetido na mente até ser discado. O terceiro elemento da memória operacional, a central executiva, é um tipo de sistema de controle da atenção responsável pela regulação das atividades dos outros dois sistemas.

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