DA ANTROPOLOGIA À ÉTICA: A QUESTÃO DA CORPOREIDADE
Por: reidofeudo • 31/3/2020 • Artigo • 6.963 Palavras (28 Páginas) • 239 Visualizações
ANTROPOLOGIA 3ª AULA
DA ANTROPOLOGIA À ÉTICA: A QUESTÃO DA CORPOREIDADE
Profa. Dra. Ir. Marly Carvalho Soares*
Resumo: Não há nada que os seres humanos possam fazer sem o corpo. Daí o novo imperativo categórico: “cuidar do corpo” tanto no seu uso simbólico sob os mais diversos aspectos que abrange desde o aspecto religioso, mediado pelo científico, histórico, filosófico, até o estético e virtual, como ainda mais no seu uso material onde ele passa de sujeito a consumidor em uma cultura dominada pela economia. Daí que partindo da estrutura do ser homem, mediatizada pelas relações e pelas ciências chegaremos a uma visão unitária do ser humano . Caberá à Antropologia filosófica coordenar essa totalidade, auxiliada pelos saberes da ciência e da Ética. A unidade estrutural se mediatiza através de três componentes que integram o ser na sua individualidade: a categoria da corporeidade, a do psiquismo e a categoria do espiritual. Na dialética da corporeidade temos o corpo como substância material e intencional; como dimensão expressiva do ser humano e, como condição de possibilidade das demais dimensões do ser corpo. Na dialética da História a corporeidade tem sido objeto de pesquisa e estudo desde os primórdios da filosofia grega até a contemporaneidade. No século XX, o corpo singular fez, portanto, sua entrada na ciência e também no direito.
Palavras-chave: Pessoa, unidade, relação, corpo, espírito.
Abstract: There isn’t anything that the human being can do without the body. Then the new categorical empire: “to take care the body”, as in its symbolic use, under more different aspects the includes since religious aspect, mediated by scientific, historic, philosophic and even virtual and aesthetic, as yet in its material use, where it passes from subject to consumer, in a culture dominated by economy. Then from the human being’s structure, mediated by relations and sciences, we’ll arrive to an unitary vew of the human being. It’ll fit to philosophic anthropology coordinate this totality, aided by wisdoms of science and ethics. The structural unity mediate itself through three components those complete the being in its individuality: the category of corporeity , psychismus and spiritual category. In the dialectics of corporeity we have the body as material and intentional substance; as expressive dimension of human being, and as condition of possibility of the other dimensions of being body. In the dialectics of history, the corporeity has been object of search and study, since the beginning of Greek until philosophy contemporarity. In 20th Century, the singular body made, then, its entrance on science and also in the right.
Keywords: Person; unity; relation; body; spirit.
Introdução
O tema é amplo. Duas disciplinas complementares que convergem para o mesmo objetivo: refletir sobre o ser humano - quer na sua dimensão somática, quer no seu agir ético. O fenômeno humano pode ser reduzido somente à natureza material, ou por outro lado, acentuando o ser cultural, ou ainda, um puro sujeito. Como Lima Vaz constrói esse todo, articulando os três pólos da natureza, do sujeito e da forma ,tentando dizer novamente : o que é o homem? A Antropologia filosófica, segundo Lima Vaz, ao elaborar o seu discurso sobre a idéia unitária do ser humano, deve considerar os outros saberes, cujo procedimento metodológico obedece aos seguintes passos: o plano da pré-compreensão, onde se compreende o homem na sua experiência natural; o plano da compreensão explicativa, cujo estudo se dá por meio da explicação científica, e o plano da compreensão filosófica, que tematiza a experiência original que o homem faz de si mesmo como ser capaz de dar razão ao seu próprio ser como sujeito.
Além do mais, três perguntas instigam o nosso pensar quando pesquisamos a dimensão corpórea do ser humano. A 1ª pergunta “como é que o corpo se tornou, em nossos dias, um objeto de investigação histórica? A segunda de ordem mais filosófica – qual é o lugar que o corpo ocupa na estrutura ontológica do sujeito e como se dá o movimento dialético que parte da ordem do dado para a ordem do conceito, e a 3ª pergunta “ de ordem mais econômica “meu corpo será sempre o meu corpo”? “Tentaremos responder através de um resumo expositivo de duas obras fundamentais da contemporaneidade: A História do Corpo”, sob a direção de Jean-Jacques Courtine, e Antropologia Filosófica, de Henrique Cláudio de Lima Vaz. Uma de cunho mais histórico–científico e, a outra um discurso mais antropológico-ético
Que a questão do homem (corpo) seja problema difícil atesta claramente a história: realmente a corporeidade tem sido objeto de pesquisa e estudo desde os primórdios da filosofia grega. Todos os grandes filósofos da Antiguidade, da Idade Média e da época moderna estudaram-na com paixão. Da crítica kantiana à Metafísica, os progressos da ciência, a emersão da consciência histórica e outros fatores já no século XIX e, depois mais decididamente ainda no século XX, deram uma reviravolta decisiva na investigação antropológica: abandona-se o terreno metafísico no qual, como se viu, os filósofos haviam trabalhado até Kant, para se colocarem em outros terrenos: da história, da ciência, da cultura, da fenomenologia, da psicanálise, da religião.
Base metodológica da reflexão filosófica sobre o corpo humano – Existe uma reflexão filosófica sobre o corpo humano em quase toda parte da história do pensamento. Achamo-la em Platão, Aristóteles, Santo Agostinho, Santo Tomás, Descartes, Spinoza, Leibniz, Schopenhauer, Nietzsche, Bérgson, Heidegger, Sartre, Merleau-Ponty, Marcel e muitos outros ainda. Em geral, porém, salvo os existencialistas, esses autores não consideram o corpo em si mesmo, mas o vêem exclusivamente em relação com a alma. Ademais, não se ocupam do corpo no inicio de suas reflexões antropológicas, mas no fim. Tal procedimento não é seguido apenas pelos platônicos (Platão, Plotino, Descartes, Leibniz), os quais, identificando o homem com a alma, logicamente estudam antes de tudo e sobretudo esta; mas também pelos aristotélicos (Aristóteles, Tomás, Locke), que no entanto vêem no corpo uma parte essencial do homem. Isso é devido a exigência metodológica: tanto os platônicos como os aristotélicos, em antropologia, se valem do método metafísico, o qual exige que se estudem antes as causas e depois os efeitos, antes as coisas mais perfeitas e depois aquelas menos perfeitas. E, dado que tanto os platônicos como os aristotélicos sustentam que a alma seja mais perfeita que o corpo e que exerça sobre ele uma atividade causal, logicamente concentram suas atenções na alma.
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