Campus do cérebro: gênese heterodoxa de um projeto
Por: biacarneiro1 • 2/11/2015 • Trabalho acadêmico • 3.742 Palavras (15 Páginas) • 248 Visualizações
doi: 10.5102/uc.v10i2.1990
José Galbinski1
Campus do cérebro:
gênese heterodoxa de um projeto
Campus of the Brain: the design process
Resumo
Neste artigo é analisado o processo de projetação arquitetônica do Campus do Cérebro, com ênfase nas questões ambientais, de linguagem e de diretrizes conceituais O objetivo deste artigo é compartilhar experiências profissionais. Este ousado empreendimento, liderado pelo neurocientista Dr. Miguel Nicolelis, está sendo implantado na cidade de Macaíba/RN em uma gleba de 100ha cedida pela UFRN. O desafio que se punha à nossa frente era o de organizar o espaço daquela grande área, sem referências significativas, em meio à vastidão agreste e, ao mesmo tempo, conferir ao Campus do Cérebro um sentido transcendente que, alçando-se acima da pura e simples raciona- lidade de um plano do uso-do-solo imprimisse àquele lugar um carácter de dignidade compatível com a importância nacional e internacional da mais ousada ideia científica/social jamais empreendida no sertão nordestino.
Palavras-chave: Processo de projetação. Linguagem. Diretrizes conceituais e ambientais.
Abstract
The author analyses the design process of the Campus of the Brain (Campus do Cérebro), with emphasis on the architectural esthetics and con- ceptual guidelines. The objective of this paper is to document and share the planning process with other architects. This outstanding development, lead by neuroscientist Dr. Miguel Nicolelis is being built in Macaiba, in the state of Rio Grande do Norte. The design blends the campus in the natural landscape cre- ating a sense of belonging and transcendence. This communion with the land symbolizes the dignity of the scientific endeavor that will take place at the site.
Keywords: Design process. Conceptual guidelines
[pic 1]
1 Arquiteto e Planejador Urbano, Ph.D. por Cor- nell University, New York. Coordenador Curso Arquitetura e Urbanismo-UniCEUB. jose.gal- binski@uniceub.com
Introdução
No Brasil, a pesquisa em neurociências estava em seus estágios iniciais enquanto um grupo de cientís- tas brasileiros na Duke University, North Caroline-USA vinha obtendo resultados excepcionais, liderando inter- nacionalmente os avanços na área. À frente desse grupo de pesquisadores, no comando da equipe o Dr. Miguel Nicolelis, um paulista, nacionalista confesso e extremado torcedor do Palmeiras. O fulcro de sua pesquisa consistia em prover cobaias com próteses mecânicas movidas pela força do pensamento.
Usando de alta tecnologia, o pesquisador capta si- nais elétricos dos comandos cerebrais e os disponibiliza como comandos mecânicos nas próteses implantadas em cobaias, de maneira que, quando o sujeito os retransmite, a máquina executa as ordens perfeitamente. Inspirado no Dr. Christian Barnard, médico australiano que realizou o primeiro transplante de coração no mundo e o fez em um concidadão na Austrália, o sonho do Dr. Nicolelis passou ser concluir seus experimentos no Brasil e concretizar, pela primeira vez na história da humanidade, a implan- tação da prótese em um paraplégico que passaria a andar com comandos trasmitidos diretamente do cérebro, um brasileiro.
Universitas: Arquitetura e Comunicação Social, v. 10, n. 2, p. 1-10, jul./dez. 2013
Reconhecimento
Em fins de dezembro de 2003, fomos convidados pelo Dr. Miguel Nicolelis para elaborar os projetos urba- nísticos e arquitetônicos do empreendimento batizado de “Campus do Cérebro”, em Macaíba/RN em gleba de 1.000.000m² cedida pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte. A escolha de Macaíba foi motivada pela visionária intenção do Dr. Nicolelis de, em uma das comunidades de mais baixo IDH1 do País, introduzir um dinâmico fator de transformação social.
O convite nos surpreendeu, entusiasmou e, ao mesmo tempo preocupou enormemente, em face da ta- manha e complexa tarefa que teríamos de enfrentar. O maior problema era o tempo, já que os projetos deveriam ser elaborados em curto prazo, melhor dizendo, em cur- tíssimo prazo, o que contrariava a prática profissional por nós adotada e recomendação aos arquitetos de Alberti (RYKWERT, 1980) de que um projeto deve ter seu tempo
Passado o impacto do convite, poucos dias após, embarcamos rumo à cidade de Raleigh, North Caroline para, in loco, conhecermos os trabalhos que estavam sen- do desenvolvidos e, mais importantes para um arquiteto, conhecermos as características dos espaços/equipamen- tos que davam suporte às pesquisas. Em verdade, essa visita teve como referência a fase primeira de nossos pro- cedimentos projetuais, descritos em Estudos iniciais em projetos de Arquitetura (Galbinski, 2008).
Em Duke University, o Dr. Sidarta Ribeiro, cientis- ta, na época membro da equipe do Dr. Nicolelis, também brasileiro e nacionalista confesso, além de extremado pra- ticante de capoeira, ex-estudante de Biologia na Univer- sidade de Brasília e aluno do Professor Emérito Dr. Isaac Roitman, conduziu a visita. Na oportunidade, apresentou-
-nos aos demais membros da equipe de cientistas e, em especial, à macaquinha, cobaia principal das pesquisas.
O detalhamento dos laboratórios do Centro de Pesquisa-CP, extremamente especializados, ficaria a car- go do escritório Lord, Aeck, Sargent/Architecture (LAS), com sede em Atlanta, contando com mais de 70 arqui- tetos, que tinha sido responsável pelos laboratórios em Duke University e desenvolvia projetos de laboratórios de alta segurança para a N.A.S.A. O chefe do escritório, arquiteto Dr. Kent D. Brown, viajou de Atlanta a Raleigh para nos encontrar neste dia.
No encontro, foi acertado que o LAS não inter- feriria na integridade da concepção arquitetônica, salvo nos interiores quando necessário para a instalação dos laboratórios. Para isso, seriam valiosas nossas anotações e fotos, feitas durante os percursos de reconhecimento dos espaços de trabalho dos cientistas. Tendo retornado de viagem ao Brasil, o Dr. Nicolelis juntou-se ao grupo e conduziu o restante da visita em Duke U, tendo, ain- da, incluído visita a uma escola em Chapel Hill, cidade vizinha, escolhida por ele por ter características de uso consideradas positivas para a futura escola no Campus do Cérebro. Essa parte foi acompanhada pelo arquiteto Kenneth E. Redfoot, autor do projeto da escola, que expli- cou o sentido e as intenções das soluções arquitetônicas empregadas naquele projeto.
...