Fichamento Livro a cidade de pensamento único
Por: Lucca Biagi • 11/10/2019 • Trabalho acadêmico • 2.749 Palavras (11 Páginas) • 672 Visualizações
UNIVERSIDADE SÃO FRANCISCO – GRADUAÇÃO EM ARQUITETURA E URBANISMO
FICHAMENTO
TEORIA E HISTÓRIA DA ARQUITETURA, DO URBANISMO E DA ARTE V
BRAGANÇA PAULISTA 2019
Otília Arantes -A CIDADE DO PENSAMENTO UNICO – Uma estratégia fatal – “A cultura nas novas gestões urbanas”
– Biografia do autor:
Otília Beatriz Fiori Arantes
- Título: Professora de filosofia
- Nascimento:
- Educação: Graduação em Filosofia pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (1961).
- Experiência Profissional: Possui graduação em Filosofia pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (1961), mestrado em Filosofia pela Universidade de São Paulo (1968) , doutorado em Filosofia - Universite de Paris I (Pantheon-Sorbonne) (1972) e Livre Docência pela Universidade de São Paulo (1992). Ministrou cursos na PUC de São Paulo, na Faculdade de Arquitetura e Urbanismo e no Departamento de Filosofia da Universidade de São Paulo, pelo qual se aposentou em 1993. Presidiu o Centro de Estudos de Arte Contemporânea (1979 a 1992). Tem experiência na área de Filosofia, com ênfase em Estética, atuando principalmente nos seguintes temas: modernidade, pós-modernidade, Mário Pedrosa, crítica de arte no Brasil, arte e política, arquitetura e urbanismo.
- Publicações Principais:
Textos escolhidos: Acadêmicos e modernos
Data da primeira publicação: 1995
Autores: Mário Pedrosa, Otilia Beatriz Fiori Arantes
O lugar da arquitetura depois dos modernos
Data da primeira publicação: 1993
Autores: Otilia Beatriz Fiori Arantes
Um ponto cego no projeto moderno de Jürgen Habermas: arquitectura e dimensão estêtica depois das vanguardas ; duas conferências de Jürgen Habermas
Livro por Otilia Beatriz Fiori Arantes e Paulo Arantes
Data da primeira publicação: 1992
Autores: Paulo Arantes, Otilia Beatriz Fiori Arantes
– Contexto de produção do texto:
A cidade do pensamento único: desmanchando consensos
- Publicado em 2000.
Outras publicações da época:
- 2001, Brasil: Emília Maricato – Brasil, cidades: alternativas para a crise urbana
- 1970, França: Henri Lefebvre– A revolução urbana
- 12000, Inglaterra : David Harvey– Espaços de esperança
- – Objetivo do texto:
O livro “Uma estratégia fatal: a cultura nas novas gerações urbanas”, tem por objetivo de empreender uma análise crítica dos processos ideológicos que presidem aos movimentos de globalização em sua relação com o planejamento e a gestão de cidades, tema amplamente explorado pela produção acadêmica no Brasil desde os anos 90. A erudição e a fluência argumentativa da autora sustentam um discurso competente que desfaz, de modo implacável, perspectivas construtivas diante de um mundo subsumido ao capital.
Dois eixos centrais se entrecruzam e se reforçam mutuamente no texto de Arantes: o primeiro se relaciona à identidade de natureza do projeto moderno das vanguardas arquitetônicas com a modernização capitalista, daí a continuidade no pós-modernismo com “o formalismo do ciclo anterior”, em que os movimentos nesse plano resultariam de “reviravoltas niveladoras” tributárias da hegemonia global; o segundo centra-se na “mercadorização” da cidade através de “abordagens culturalistas” e políticas de image-making assimiladas nos projetos urbanos, com a conseqüente transformação da cidade em “mercadoria total” em que os variados encaminhamentos arquitetônicos e urbanísticos desde o modernismo não passariam de representações ideológicas das estratégias de dominação.
O foco da análise não se restringe, portanto, aos enclaves das metrópoles periféricas, ou às cidades genéricas e sem identidade dos EUA, as edge cities, locais de reprodução de tipologias urbanas e arquitetônicas que respondem às necessidades de comando da economia global, e em que se opera a negociação das condições materiais e simbólicas do capitalismo avançado. Trata-se de uma generalização acerca das intervenções urbanas de cidades européias como Paris, Lisboa, Barcelona, Londres e Berlim, e cidades dos Estados Unidos, especialmente Baltimore, tida como matriz da tournant cultural do capitalismo avançado.
– Pontos chave:
- Cidade depois dos modernos se encontra em processos de ironia objetiva, em que “convertem as melhores intenções no seu avesso, realizando, não por desvio mas por finalidade interna, o contrário do que prometiam.”(p.11)
- Em relação a este ponto central pergunta-se: o motivo desta centralidade não só relançar como manter o foco na alegada dimensão cultural do impulso dito historicista do ‘modelo’ prevalecente durante a fase de reação ao naufrágio histórico do Movimento Moderno. planejamento urbano: estratégico, que sepretende ser novo pelo menos em relação às intervenções pontuais do período anterior, e contrastante, por desenterrar e pelo menos reabilitar uma expressão derivada da falida “ideologia do plano” (p.13)
- “quando, nos dias de hoje, se fala de cidade (pensando estar "fazendo cidade"...), fala-se cada vez menos em racionalidade, funcionalidade, zoneamento, plano diretor etc, e cada vez mais em requalificação, mas em termos tais que a ênfase deixa de estar predominantemente na ordem técnica do Plano -como queriam os modernos - para cair no vasto domínio passe-partout do assim chamado "cultural" e sua imensa gama de produtos derivados.” (p.15)
- A diferença fundamental entre ambos estaria na ingenuidade dos modernos ao se imaginarem desprendidos da “dura verdade de sua funcionalidade sistêmica”, enquanto os pós-modernistas não só legitimariam como invocariam a “cidade-empresa” (p.17).
- Urbanismo atual intervenções acupunturais (contrapartida com o partido anterior de expansionismo periférico, desprovido de serviços e sem qualidade) e assim por diante. Venuti acreditava, sinceramente, que tais providências contrariavam os interesses rentistas, desfazendo os desequilíbrios territoriais e sociais. (p.20)
- A terceira geração urbanística – sem ruptura maior de continuidade com a anterior, exceto quanto ao gerenciamento Aspectos em comum com a geração anterior: Caminho de volta à cidade – mesma e paradoxal “animação urbana”. Cidades como protagonistas privilegiadas: Quando forem dotadas de um Plano Estratégico que possa responder aos desafios competitivos da globalização. (p.24)
- o “encadeamento objetivo” do chamado “culturalismo empresarial” encarnado não apenas na ideologia dos planos estratégicos cuja matriz norte-americana teria se generalizado, mas, também, assimilado nos movimentos do urbanismo contemporâneo, e nos “Grandes Projetos” realizados mundo afora (p. 47-48).
– Conclusões:
No primeiro texto do livro, Otília Arantes revela como surge já nos 70, com a crise do fordismotaylorismo, uma nova matriz liberal de planejamento, inspirada na gestão empresarial e baseada na idéia da cidade como máquina de crescimento, isto é, “máquina urbana de produzir renda”, e que entre outra e que entre outras designações, tornou-se conhecida por Planejamento Estratégico. Segundo essa matriz, sobreviverão no mundo global de extrema competitividade, as cidades que conseguirem uma coalizão entre as elites fundiárias e os empreendedores de negócios “decorrentes das possibilidades econômicas dos lugares”, visando o crescimento econômico a qualquer preço através da obtenção de vantagens na competição permanente entre lugares pela atração do escasso e volátil capital internacional. No centro desse processo, que coagiu o “espetáculo como forma de resistência” para transformá-lo em “forma de controle social”, a cultura aparece como um novo e fantástico empreendimento econômico, que facilita a fabricação de consensos em torno da idéia de que somente a inserção na rede global de cidades será capaz de gerar crescimento, empregos e modernidade. Associados aos políticos, ao grande capital e aos promotores culturais, os planejadores urbanos, agora planejadores-empreendedores, tornaram-se peças-chave dessa dinâmica. Esse modelo de mão única, que passa invariavelmente pela gentrificação de áreas urbanas “degradadas” para torná-las novamente atraentes ao grande capital ao grande capital através de mega-equipamentos culturais, tem dupla orígem, americana (Nova-York) e européia (a Paris do Beaubourg), atingindo seu ápice de popularidade e marketing em Barcelona, e difundido-se pela Europa nas experiências de Bilbao, Lisboa e Berlim. Otília ressalta a impossibilidade de alguém “minimamente responsável” propor a aplicação desse modelo que reduz a cidade a mero espaço de negócios, no contexto social dos países subdesenvolvidos. Pois bem, Carlos Vainer nos lembra que nossas elites não primam exatamente pela responsabilidade. Em seu segundo texto, Vainer testemunha a implantação do Planejamento Estratégico da Cidade do Rio de Janeiro. Uma “bem orquestrada farsa”, com o objetivo de legitimar “projetos caros aos grupos dominantes da cidade”, a saber, tudo aquilo que permitiria a produção da “máquina de crescimento” carioca, competitiva e vendável à dinâmica do capital internacional. Vainer desnuda as manobras para colocar em escanteio as reivindicações populares, dando espaço aos interesses dos empreendedores e a um agressivo marketing para criar falsos consensos que legitimassem a farsa. Tais ações soam coerentes com as colocações de seu primeiro texto, no qual mostra, através da antravés da análise exaustiva das argumentações teóricas dos consultores barcelonenses, a mise-en-place de um arsenal político-ideológico-empresarial destinado a impor universalmente, à maneira do pensamento único e com a indefectível cooperação das elites do Terceiro-Mundo, a matriz do Planejamento Estratégico segundo a qual a sobrevida das cidades está em sua transformação em mercadoria. Com o mesmo brilho dos textos anteriores, Ermínia Maricato fecha o livro perguntando se essa nova matriz seria resultante “de um processo endógeno calcado na práxis urbana” ou seguiria novamente um “caminho de dominação econômica, política e ideológica de inspiração externa, reproduzindo modelos alienados de nossa realidade”. Ermínia Maricato passeia com desenvoltura pela história do planejamento urbano no Brasil, demonstrando a infinita sobreposição de modelos de dominação que, utilizando-se do controle sobre o poder político e a burocracia estatal, a legislação, e a economia, permitiram a eterna produção de um espaço urbano de segregação espacial e exclusão social, voltado apenas aos interesses das elites dominantes. Ermínia mostra que a praxis tra que a praxis urbana no Brasil tem origens na nossa estrutura colonial, e é hoje produtora da cidade desigual, dividida entre um pequeno território legal onde se reproduzem os interesses econômicos das elites e a enorme parcela da cidade ilegal, abandonada à sua própria sorte por um Estado – e um planejamento urbano - que há muito se descolaram – pois era esse seu interesse - da realidade da maioria. Como seria possível, nessa matriz social oriunda de uma “industrialização de baixos salários”, que necessita de uma profunda reestruturação política, econômica e social, a importação de um modelo de cidade global que exacerba a exclusão e a criação de oportunidades para poucos privilegiados? Como diz a autora, essa representação da “cidade” é uma “ardilosa construção ideológilógica que torna a condição de cidadania um privilégio e não um direito universal: parte da cidade toma o lugar do todo”. E, mostrando que também na área urbana podem sim existir – e de fato existem – propostas efetivas que se contraponham ao pensamento único, Ermínia Maricato finaliza analisando diversos instrumentos de planejamento voltados para o necessário desenvolvimento includente das nossas cidades.
Concluímos que Para Arantes, as políticas de ocupação do território urbano sob a globalização determinam de modo generalizado a transfiguração do espaço em “cidade-negócio” capitaneada pelo “culturalismo de mercado”, ou seja, uma verdadeira “máquina de produzir riquezas” conforme Molotch e Logan precocemente diagnosticaram. Nesse processo, a adesão da população em torno dos “famigerados” projetos de requalificação/revitalização urbana, então associados aos processos de gentrificação, expressaria o poder da “máquina ideológica” mediante expedientes do tipo “consensos cívicos” ou “coalizões urbanas pró-crescimento”.
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