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Pesquisa sobre Pelourinho

Por:   •  6/10/2015  •  Artigo  •  1.846 Palavras (8 Páginas)  •  489 Visualizações

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1º Ato

Em 1986, Lina Bo Bardi, convidada pelo então prefeito de Salvador, Mário Kertész, volta à Bahia para um novo período de realizações. Seria o segundo momento de Lina na Bahia. O primeiro foi entre 1958 e 1964, do qual se destacam as obras do Solar do Unhão, criado como Museu de Arte Popular, e o próprio Museu de Arte Moderna da Bahia.

Neste novo período, um grande desafio é colocado na pauta de trabalho: a recuperação do Centro Histórico, que estava fisicamente em ruínas, parecia um sitio bombardeado; “havia sofrido um terremoto voluntário”, dizia Lina. Mas era densamente habitado por uma gente que, à sua maneira e com os meios ao seu alcance, conservava ali a vida urbana.

Portanto, de cara, tínhamos que descartar o termo “revitalização”, uma vez que vida ali não faltava. E “com que força”, continuava Lina: “prostituição, bebida, drogas e crime, quer coisa mais viva?”

Piada à parte, um mundo “subáqueo” de numerosas famílias pobres, pequenos negócios e serviços, quebra-galhos e biscateiros, abandonados há muito pelo poder público e pelas classes mais abastadas, que se afastavam cada vez mais desse umbigo urbis pelas praias da orla, zelava e mantinha vivo aquele testemunho histórico urbano único e original. Sim, único em sua originalidade.

O lugar

O centro histórico de Salvador representa a cidade portuguesa no trópico, a “Nova Évora” à beira mar, e por isso foi classificado pela Unesco como Patrimônio da Humanidade. Não foi pelo valor individual desta ou daquela casa ou sobrado já tantas vezes reformados, mas pela força de seu conjunto. Seu traçado urbano é peculiar, pois resulta do modo livre e sábio com que o colonizador adaptou sua aldeia portuguesa à geografia da encosta sobre a Baia de Todos os Santos. A vegetação exuberante e indomável, a umidade implacável, a luz azul do sol, a beleza de doer da vista sobre o mar, o serpentear das cumeadas dos morros entremeados de grotas e pequenos vales, estes foram elementos determinantes no urbanismo da nova cidade portuguesa transplantada aos trópicos. Além da liberdade de fazer do brasileiro, ou “português à solta”, como bem definiu Agostinho da Silva.

O projeto

Mas, voltando ao nosso ponto de partida, de 1986 a 1990 experimentamos uma série de projetos-pilotos que deveriam direcionar uma recuperação rápida, econômica e de qualidade. Rápida pelo emprego da tecnologia do pré-fabricado de ponta, criado pelo arquiteto Lelé em sua “fábrica de cidades”; econômica pela fabricação seriada de uma dezena de peças a compor um vocabulário construtivo; e de qualidade pelo rigor projetual, de produção e execução das obras. Essas eram condições sine qua nonpara nosso plano, uma vez que o objetivo maior era manter aquela população que lá vivia – ou grande parte dela – em condições dignas de habitabilidade sem criar um êxodo natural, com o aumento do valor imobiliário, e nem forçado, como saneamento social deliberado. Nosso projeto, baseado em um levantamento sócio-econômico de todas as famílias, previa uma logística de efeito dominó. Ou seja, recuperávamos uma ruína abandonada transformando-a em moradia plurifamiliar – alguns apartamentos em cada casarão antigo recuperado –, transferindo para ali os moradores vizinhos das casas degradadas.

Em seguida partíamos para a recuperação dessas casas degradadas já desocupadas, para trazer outras famílias, e assim por adiante. Em todos os casos, o térreo dessas casas deveria conter um pequeno comércio ou serviço, a ser tocado pelos próprios moradores. Chegou-se ali a levantar, através de pesquisas, demandas de usos e capacidade de instalação de equipamentos comerciais e públicos para atender a estes usos. O cadastro de cada imóvel ou ruína era primoroso e, junto ao programa pré-estabelecido do futuro uso e definição das famílias que iriam ocupar cada imóvel, é que partíamos para o projeto arquitetônico.

Realizamos o primeiro piloto na Ladeira da Misericórdia, que estava totalmente abandonada. Era um ponto simbólico na encosta, para quem vê do mar ou da cidade baixa. Foi uma boa escolha, porque ali havia um mix de situações e problemas: ruínas dos séculos XVIII, XIX e XX, terrenos baldios, muralhas de contenção da encosta e vegetação exuberante.

Adotamos um programa variado: um restaurante, um bar, três casarões transformados em 8 ou 9 apartamentos com 3 pontos comerciais em seus térreos. Chegamos a desenhar todo o mobiliário e executar grande parte dele. A idéia dos contrafortes de concreto era a solução adotada como elemento de estabilização das ruínas e linguagem contemporânea para as novas construções.

Ao final da realização, tudo deveria aparecer como numa radiografia daquele momento, final dos anos 1980. Seria como dizer com a arquitetura: “aqui, o que sobrou de uma ruína do século XVIII, em alvenaria mista; aqui, um pedaço de casa do século dezenove; aqui, uma construção contemporânea, do século XX; todos em harmonia e prontos para uma vida nova”.

Adotando o princípio da honestidade de propósitos recomendado pela “Carta de Veneza”, com nossa intervenção estávamos advertindo: “este é o estado a que chegou a destruição e o abandono; e esta é também uma forma de recuperação que respeita e expõe o passado com dignidade de condições de uso na atualidade”.

Mas, como regra nesse país, com as mudanças na política e na administração publica, o abandono foi inevitável. “Aqui tudo parece que é ainda construção, mas já é ruína”, bem disse Caetano Veloso.

Tudo foi esquecido, parece que nem existiu.

2º Ato

No início dos anos 1990, o Governo do Estado da Bahia resolve encarar o problema de degradação do centro histórico e lança um amplo e ambicioso plano de recuperação. Fazendo justiça, um grande mérito deve ser reconhecido: foi interrompido o processo de ruína física do conjunto urbano. Mas, ao aproximarmos o olhar do resultado dessa intervenção, identificaremos uma série de erros e equívocos de toda ordem, em muitas áreas. Hoje, com a poeira assentada, uma revisão crítica faz-se necessária.

Miolos de Quadra

Em nosso projeto com Lina Bardi propusemos a utilização dos fundos de quadra – os maravilhosos quintais verdes das casas – como quintais coletivos, uma vez que cada casa passaria a ser de três ou quatro famílias. Seria como que reforçar a idéia de “oásis”, a descoberta de zonas verdes exuberantes no “seco casba baiano” da cidade de pedra e cal, ao penetrar e cruzar um casarão, ou uma arcada de portais. Um exemplar

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