As Terras Devolutas
Por: Ingrid Gonçalves • 5/6/2019 • Trabalho acadêmico • 1.106 Palavras (5 Páginas) • 244 Visualizações
A usucapião é uma aquisição pela posse por tempo prolongado, como dito por Clóvis Belivaqua (2003, p.168) e, ainda, é o modo pelo qual o possuidor se tornará proprietário, conforme fala Orlando Gomes (2005, p. 186). Sendo esta considerada um modo originário de aquisição, pois ao instante que é concretizado a usucapião, nada advém do proprietário anterior, brotando, portanto, um direito novo, assim explica José Salles (1991, p. 28).
Para que ela se realize é necessário que sejam seguidos certos requisitos, tais quais receberam alterações no Código de 2002, como principal diferença ao de 1916 destaca-se os prazos necessários para usucapir, assim, esclarecido por Orlando Gomes (2005, p. 186).
O Código e a doutrina trazem requisitos essenciais para que a usucapião se realize. Alguns deles são:
- Posse com animus dominio, nesse caso, o ocupante deve ter a intenção de ser dono do imóvel.
- Lapso temporal, seria ter uma posse continua e duradoura, sem interrupções.
- Posse mansa e pacifica, significa o proprietário nunca ter contestado a posse do indivíduo, se houver essa contestação a usucapião é descaracterizada.
Ao se falar de usucapião, não se pode deixar de falar do princípio da função social da propriedade, assunto este, intimamente ligado ao instituto da usucapião, já que o possuidor exerce a função social do imóvel que o proprietário não cumpriu.
O princípio da função social da propriedade seria o exercício do direito à propriedade que obedeça às normas legais e morais, com o intuito de observar o interesse coletivo.
Para tanto, a função social da propriedade é prevista na Constituição Federal de 1988 e no Código Civil de 2002. A CF/88 no seu artigo 5°, inciso XXII traz o direito à propriedade, já no inciso XXIII do mesmo artigo, ela diz que a propriedade terá que atender a função social. O Código trouxe as obrigações aos proprietários, no artigo 1228, §1° ele menciona as finalidades sociais e econômicas que a propriedade deve possuir.
Nesse caso, a usucapião serve para que esses direitos sejam assegurados, já que o proprietário que abandona ou subutiliza seu imóvel não estará cumprindo sua função social. Portanto, esse instituto, tem a importância de transferir para o possuidor, que cumpriu os requisitos da usucapião, o título de proprietário do imóvel, pois este cumpre a função social de propriedade exigida pela legislação.
Ao tratar da função social é valido trazer o entendimento de Silvio Luis Ferreira da Rocha, que ensina que a função social da propriedade é um princípio que incide sobre todas as relações jurídicas de domínio, sejam públicas ou privadas. (2005, p.127)
Portanto, a função social da propriedade não atinge somente bens privados, trazendo assim, uma atenção aos bens públicos, que muitas vezes deixam de cumprir seu papel de ter uma função social, de interesse coletivo.
Pode-se citar então, as terras devolutas, que são bens públicos, mas que não possuem uma finalidade, não cumprindo assim o princípio da função social. Estas são terras que estão espalhadas por todo território nacional sem nenhum tipo de registro ou finalidade.
As terras devolutas se caracterizam como terras sem dono, sem destinação. Para Pontes de Miranda (1969, p. 529) seriam terras que nunca tiveram donos ou já não os tem mais. Essas terras possuem previsão legislativa no art. 3° da Lei 601 de 1850, conhecida como Lei de Terras. No seu art. 3°, §1° as terras devolutas são conceituadas como aquelas que não se encontram aplicadas a algum uso público.
Com o passar do tempo, foi instituído o Decreto-lei nº 9760/1946, que cita então os bens da União. No seu artigo 5º conceitua, séculos depois da Lei de Terras, o que seriam as terras devolutas. Valido, assim, trazer parte do artigo a este estudo:
Art. 5º. São terras devolutas, na faixa de fronteira, nos Territórios Federais e no Distrito Federal, as terras que, não sendo próprias nem aplicadas a algum uso público federal, estadual, territorial ou municipal, não se incorporaram ao domínio privado.
Pode-se dizer que o conceito que o decreto-lei traz mantem-se com as características da Lei de Terras, pois a mesma já trazia que as terras devolutas são aquelas que não possuem destinação de uso público.
Ao fazer uma análise do princípio da função social da propriedade dessas terras devolutas, nota-se que elas não se enquadram nos requisitos anteriormente estudados. Inclusive, por não possuírem uma finalidade, acabam por se tornar passíveis de usucapião.
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