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Fichamento: Retratação à Violência Doméstica

Por:   •  6/10/2019  •  Resenha  •  1.611 Palavras (7 Páginas)  •  272 Visualizações

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UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA CATARINA

CURSO DE DIREITO

Disciplina: Direito Penal III

Professora: Profª Drª Marília De Nardin Budó

Aluna: Iryni Mariah Helário Meintanis

Fichamento de: MELLO, Marília; SALAZAR, Carolina. Não à retratação? O lugar da intervenção penal no crime de violência doméstica contra a mulher. Revista Brasileira de Sociologia do Direito, Porto Alegre, ABraSD, v. 1, n. 2, p. 47-62, jul./dez., 2014.

1 – A Lei Maria da Penha diante da realidade dos conflitos domésticos e das expectativas das mulheres vítimas

Em um contexto brasileiro de impunidade e ineficiência do instrumento penal, a conjuntura para a Lei Maria da Penha não se mostra diferente; apesar dos esforços, a não diminuição da taxa de feminicídios desde a vigência da lei, bem como a falta de confiança das vítimas para a resolução de conflitos relacionados à violência doméstica pelo sistema penal (por um sentimento de “apropriação, pelo sistema penal, dos conflitos das vítimas, de sorte que suas vozes e expectativas são completamente olvidadas e o problema não é solucionado” (página 2), como descrito pelos autores), colaboram para esse cenário, que nos leva a questionar a eficácia da legislação vigente. Para além disso, o sistema processualístico aplicado minimiza o papel da vítima em seu próprio processo, não lindando com os traumas gerados pela agressão, o que faz crer que além do papel secundário da vítima -reduzida a testemunha-, sua situação psicológica após a solução do conflito não é pertinente.

Essa indiferença para com o emocional dos envolvidos na violência de gênero, bem como a redução da complexidade de toda uma relação afetiva (física, psicológica e emocional) para casos isolados de agressão não contempla as causas do crime, e por consequência é parcialmente ineficaz em tratar seus efeitos. Cabe ressaltar, também, que em uma parte considerável dos processos a vítima não almeja a prisão -ou qualquer outro tipo de vingança- do parceiro, e sim um reestabelecimento da paz familiar, com o fim da violência; há uma procura maior pela mediação e auxílio psicológico das relações familiares do que por uma punição efetiva ao agressor.

Destaca-se, também, que quando o processo termina com aplicação de pena privativa de liberdade ao companheiro-agressor, a mulher desenvolve uma sensação de culpa por ter sido a precursora da denúncia que resultou na prisão de uma pessoa pela qual, apesar das circunstancias, ela ainda sente apreço. Com isso, a sanção ao agressor contempla a vítima indiretamente, pela carência afetiva e sentimento de culpa, e diretamente, por questões econômicas, visto que a renda familiar ficará parcial ou completamente comprometida. Percebe-se, então, que a maioria das vítimas de casos de violência contra a mulher não almeja o efeito penal, que é imposto a todas as situações sem consulta às partes envolvidas no processo. Posto esse cenário, conclui-se que parte das vítimas de violência familiar se abstêm da denúncia e prefere lidar com o contexto de violência a denunciar seu companheiro:

[...] legislações muito rígidas desestimulam as mulheres agredidas a denunciarem seus agressores e registrarem suas queixas. Sempre que o companheiro ou esposo é o único provedor da família, o medo de sua prisão e condenação a uma pena privativa de liberdade acaba por contribuir para a impunidade [...]. É urgente que se amplie o conhecimento das experiências alternativas à imposição de penas nesta área, pois já existe evidência de que, em vários casos, o encarceramento de homens pode aumentar, ao invés de diminuir, os níveis de violência contra a mulher e as taxas gerais de impunidade para esse tipo de crime  (página 5)

Esta conjuntura põe em cheque a efetividade penal nos casos de Lei Maria da Penha, visto que em muitas mulheres buscam meios alternativos para lidar e resolver a situação, como psicólogos, ajuda de amigos e parentes e grupos de apoio. Isto posto, a esfera penal dos crimes domésticos fica delegada à parcela mais carente das vítimas. Cabe a observação de que a Lei Maria da Penha possibilitou medidas protetivas e de amparo de urgência, entretanto quando o processo é encerrado ou interrompido, cessa-se também esse auxílio, vinculando o auxílio a punitividade do parceiro.

2 – O “tipo penal” de violência doméstica e as discussões acerca de sua ação penal

A tipificação da violência doméstica ocorreu em 2004, sendo uma qualificação da lesão corporal leve quando ela for praticada contra ascendente, descendente, irmão, cônjuge ou companheiro, ou com quem conviva ou tenha convivido, ou, ainda, prevalecendo-se o agente das relações domésticas, de coabitação ou de hospitalidade” (art 129, parágrafo 9 do Código Penal), independentemente do sexo da vítima. A Lei Maria da Penha, criada em 2006 se utilizou desse tipo penal já existente para identificar as formas de violência doméstica especificamente contra a mulher, inserindo uma agravante penal genérica para essas situações, aumentando o referencial quantitativo em abstrato – anteriormente, era de 6 (seis) meses a 1 (um) ano, gerando um intervalo de 6 meses entre o mínimo e o máximo; atualmente, o mínimo é de 3 (três) meses e o máximo para 3 (três) anos, aumentando esse intervalo para 33 (trinta e três) meses, com isso, o crime perdeu o status de crime de baixa lesividade garantido pela Lei n. 9.099/1995. Destaca-se que o artigo 41 da Lei Maria da Penha também vedou a classificação dos crimes de violência contra a mulher como crimes de baixa lesividade, visto que antes desse artigo, uma parte considerável dos crimes de violência doméstica eram considerados de menor potencial ofensivo; essa vedação impossibilita a impossibilidade de utilização da transação penal, suspensão condicional do processo e composição civil dos processos que envolvem a Lei Maria da Penha.

Destarte, a maior discussão gerada pelo artigo 41 se relaciona com a mudança ou não da natureza da ação penal da lesão corporal leve qualificada pela violência doméstica. No ordenamento jurídico brasileiro, a ação penal pode ser promovida por parte pública (Ministério Público), ou privada (pessoa que teve seu bem jurídico violado); na esfera da ação penal pública, a ação se subdivide em ação penal pública incondicionada ou condicionada à requisição do Ministro da Justiça ou à representação da vítima – acentua-se que a representação da ação ainda pertence ao Ministério Público, cabendo a vítima somente autorizar e avaliar o cabimento da ação penal. Existem 3 razões para o Estado oferecer essa opção de escolha da atividade penal ao ofendido: (i) baixa ofensividade ao bem jurídico, (ii) relação próxima pré existente entra vítima e acusado; (iii) proteger a vítima de novos danos que podem ser causados pela ação penal.

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