OS REFUGIADOS BRASILEIROS NO EXTERIOR: BREVE ANÁLISE JURÍDICA DA PROTEÇÃO AO SER HUMANO
Por: Letícia Marques • 20/3/2018 • Artigo • 5.614 Palavras (23 Páginas) • 418 Visualizações
REFUGIADOS BRASILEIROS NO EXTERIOR: BREVE ANÁLISE JURÍDICA DA PROTEÇÃO AO SER HUMANO
RESUMO: A pesquisa aborda, sob o aspecto jurídico, alguns casos de brasileiros que vivem na condição de refugiados em outros países. Nesse sentido, ao analisar diferentes casos de brasileiros refugiados no exterior, constata-se a violação aos Direitos Humanos consagrados no texto constitucional, nos acordos e nas convenções internacionais, pois parte-se da premissa de que o país de origem do refugiado, no caso o Brasil, não tenha condições de assegurar à proteção à pessoa humana dentro do seu território. Verifica-se, nesse contexto, que apesar de o Brasil ser um país democrático com significativo enfoque normativo aos direitos humanos, é possível averiguar inúmeros casos de brasileiros refugiados com fundado medo de perseguição, especialmente, por questões de gênero e por risco de vida, ao terem sido testemunhas de crimes envolvendo agentes da segurança pública, o que demonstra claro afastamento dos textos proclamados. O aprofundamento do presente estudo pautou-se em revisão bibliográfica, bem como se dedicou à análise de notícias publicadas em jornais nacionais, pautando-se numa análise qualitativa da percepção do refúgio em relação aos nacionais na perspectiva jurídica da dignidade da pessoa humana.
PALAVRAS CHAVE: Refugiados brasileiros no exterior. Direito Internacional dos refugiados. Dignidade da pessoa humana.
ABSTRACT: The study deals, under the juridical aspect, with some cases of Brazilians who live as refugees in other countries. In this sense, when analyzing different cases of Brazilian refugees abroad, there is a violation of human rights enshrined in the constitutional text, international agreements and conventions, since it is based on the premise that the country of origin of the refugee, in the case Brazil, is not able to ensure the protection of the human being within its territory. In this context, despite the fact that Brazil is a democratic country with a significant normative approach to human rights, it is possible to investigate numerous cases of Brazilian refugees with a serious fear of persecution, especially due to gender and life-threatening issues, having witnessed crimes involving public security agents, which demonstrates a clear departure from the proclaimed texts. The study's deepening was based on a bibliographical review, as well as the analysis of news published in national newspapers, based on a qualitative analysis of the perception of the refuge in relation to the natives in the legal perspective of the dignity of the human person.
KEY WORDS: Brazilian refugees abroad. International refugee law. Dignity of human person.
1. Introdução
A Constituição Federal de 1988 instituiu, no sistema jurídico brasileiro, o Estado Democrático de Direito, assegurando o exercício dos direitos sociais e individuais, proclamando a liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça como valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos.
No entanto, essa proclamação de sociedade considerada fraterna e sem preconceitos não condiz com a realidade vivenciada atualmente pelos cidadãos no Brasil. Tanto é, que, nos últimos anos, o número de refugiados brasileiros vem crescendo de forma significativa.
Partindo do fato de que o instituto do refugio prevê a perseguição e a violação maciça de direitos humanos como requisitos para a sua solicitação, bem como se sabe que o Brasil é um Estado que não passa por nenhum conflito bélico, pergunta-se: o que leva tantos nacionais a solicitarem refúgio em outras nações? O Brasil falhou na sua política de proteção dos Direitos Humanos?
Sendo o refúgio uma forma de migração resultante de fundado temor de perseguição por motivos de raça, religião, nacionalidade, grupo social, entre outros fatores, marcado pela expressa violação aos direitos humanos, verifica-se que a busca de tal instituto por brasileiros em outros Estados é incompatível com preceitos democráticos trazidos pela Carta Magna de 1988, uma vez que, para a busca de refúgio do exterior, pressupõe-se que o país de origem, no caso o Brasil, não tenha condições de assegurar a proteção daquela pessoa que está buscando o referido instituto em países estrangeiros.
Dessa forma, analisar a situação jurídica que motivou brasileiros a buscarem refúgio no exterior é aprofundar as discussões em torno da negação dos direitos aos nacionais. Apesar de positivado no ordenamento jurídico pátrio, o caminho para efetivá-lo ainda é extenso, necessitando do empenho da sociedade civil conjuntamente com os esforços dos Poderes Públicos, a fim de assegurar aos brasileiros a igualdade consagrada na Constituição Federal de 1988.
Salienta-se, ainda, que o estudo partiu de dados quantitativos de casos envolvendo emigrantes brasileiros refugiados no exterior, objetivando o estudo de casos concretos vivenciados por nacionais para que possa ser melhor compreendido as motivações que levaram à solicitação de refúgio em outros Estados, bem como para que possa haver a comparação da realidade descrita nos relatos e os preceitos assegurados no texto constitucional.
2. Direito do Refúgio e sua fundamentação jurídica
A proteção aos refugiados encontra-se positivada nos Tratados e Acordos internacionais, facultando aos países a assinatura de tais preceitos. Nesse sentido, ao ratificar essas normas internacionais, os países comprometem-se a zelar pela integridade física e social dos solicitantes do Refúgio.
É importante salientar, ainda, que o aperfeiçoamento da ordem jurídica em torno das questões do refúgio se operacionalizou nas últimas décadas, com a evolução jurídica da temática dos Direitos Humanos, bem como quanto ao fenômeno do refúgio adquirir dimensões globais, direcionando a cooperação entre os Estados para tornar viáveis as soluções duradouras em relação ao refúgio. Nesse sentido, ao tratar da importância da temática dos Direitos Humanos dos Refugiados, assevera Mazzuoli: "Trata-se de uma das primeiras preocupações do direito do pós-guerra a inspirar toda uma legislação protetiva após esse período[1]."
Pode ser apontada, dentro da regulação internacional do instituto do Refúgio, a Convenção de 1951, o Protocolo de 1967, a Convenção Relativa aos Aspectos Específicos dos Refugiados Africanos de 1969 e a Declaração de Cartegena de 1984, os quais podem ser considerados relevantes documentos internacionais responsáveis em aprofundar a proteção aos refugiados.
Nessa perspectiva, afirma Mazzuoli: "O assunto é regulado pelo direito internacional e, bem assim, pelo direito interno de vários Estados, não sendo diferente com o Brasil, que o disciplinou na Lei n.º 9.474, de 22 de julho de 1997"[2]. Dessa forma, os direitos dos refugiados inserem-se no contexto do Direito Internacional dos Direitos Humanos, bem como do Direito Internacional dos Refugiados, contribuindo para embasar juridicamente a rede de proteção aos refugiados no âmbito internacional.
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