PRISÃO CIVIL DEPÓSITO INFIEL INCONSTITUCIONALIDADE.
Por: ricardomoraess • 22/5/2017 • Trabalho acadêmico • 1.700 Palavras (7 Páginas) • 199 Visualizações
PARECER
EMENTA: PRISÃO CIVIL. DEPÓSITO INFIEL. INCONSTITUCIONALIDADE.
RELATÓRIO
Trata o expediente de discussão acerca da constitucionalidade, ou não, da prisão civil do depositário infiel, tendo em vista o regramento constitucional, infraconstitucional e internacional sobre o tema. Ademais, existe, aparentemente um conflito entre o regramento constitucional e internacional sobre o tema, devendo ser analisado o status que se dá aos tratados internacionais sobre direitos humanos ratificados pela República Federativa do Brasil para solucionar a questão.
MÉRITO
A Constituição da República Federativa do Brasil dispõe em seu artigo 5º, LXVII, que "não haverá prisão civil por dívida, salvo a do responsável pelo inadimplemento voluntário e inescusável de obrigação alimentícia e a do depositário infiel".
Ocorre que, o Brasil é signatário de vários tratados internacionais que repelem a prisão civil do depositário infiel, dentre eles: o Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos, a Declaração Americana dos Direitos da Pessoa Humana e, principalmente, o Pacto de São José da Costa Rica sobre Direitos Humanos, também chamado de Pacto Interamericano de Direitos Civis, sendo este último ratificado pelo Brasil em 1992.
A Convenção Americana de Direitos Humanos, dispõe em seu artigo 7.°, parágrafo 7.°, que "ninguém deve ser detido por dívidas. Este princípio não limita os mandados de autoridade judiciária competente expedidos em virtude de inadimplemento de obrigação alimentar".
Com base neste fato, uma questão vem à tona: Se a Constituição da República admite a prisão civil do deposito infiel, como a Convenção Americana de Direitos Humanos (Pacto de San Jose da Costa Rica) poderia invalidar as disposições infraconstitucionais sobre esta prisão (Código Civil, Código de Processo Civil, entre outros)? Ademais, tal tratado teria força para tornar inconstitucional o disposto no art. 5º, LXVII, da CF?
O cerne desta questão gira em torno em saber qual o status dos tratados internacionais que versem sobre os direitos humanos no ordenamento jurídico pátrio.
Sabemos que os tratados e convenções internacionais sobre direitos humanos que forem aprovados com quorum de emenda constitucional, se equivalem a esta, conforme disposto no §3º, do art. 5, da Constituição Federal.
Agora, para os tratados internacionais que não foram aprovados na forma do §3º, do art. 5, como é o caso da Convenção Americana de Direitos Humanos, a posição majoritária (defendida pelo STF) é a de que estes possuem status supralegal, ou seja, estão acima das leis e abaixo da Constituição.
Desta forma, com o posicionamento do STF, teremos que analisar validade das leis sobre um duplo aspecto, isto é, para que as leis nacionais sejam válidas, devem estar de acordo com a Constituição Federal e com os Tratados e Convenções Internacionais de Direitos Humanos. Outrossim, no caso especifico da prisão civil do depositário infiel, embora as leis (CC, CPC) estejam de acordo com a Constituição Federal, estão em desconformidade com o Pacto de San José da Costa Rica, que o repele. Portanto, as normas que tratam sobre prisão civil do depositário infiel, embora vigentes no ordenamento, são inválidas.
Sobre esta nova ótica dos tratados sobre direitos humanos, Luiz Flávio Gomes aduz que:
(...) do velho Estado de Direito (ED) estamos evoluindo para o Estado constitucional e humanitário de Direito (ECHD). Essa é a maior e mais significativa mudança de paradigma que estamos vivenciando (no plano jurídico) neste limiar do terceiro milênio
Desse modo, mesmo com a previsão da prisão do depositário infiel, o texto constitucional conflita com os seus fundamentos, isto é, com própria a essência do Estado Democrático de Direito. Ademais, Luiz Flávio Gomes resolve o conflito aparente entre o texto constitucional e o tratado internacional da seguinte forma:
De qualquer modo, em matéria de direitos humanos quando os tratados internacionais conflitam com a constituição brasileira (esse é o caso da prisão civil do depositário infiel) a solução não pode ser buscada no princípio da hierarquia. Não funciona (no conflito entre os tratados e a constituição) a hierarquia, sim, o princípio pro homine, que significa o seguinte: sempre prepondera a norma mais favorável ao ser humano. Não importa a hierarquia da norma, sim o seu conteúdo. O mais favorável prevalece. Não há que se falar em revogação da norma constitucional que conflita com o tratado. Todas as normas continuam vigentes. Mas no caso concreto será aplicada a mais favorável.
Com efeito, com fundamento no Informativo 531 do STF, podemos concatenar algumas considerações que levaram a impossibilidade da prisão civil do depositário infiel:
a) A norma constitucional que aborda a prisão do depositário infiel (5º, LXVII, da CF) precisa de complementação visando à própria eficácia do texto em questão;
b) O Estado brasileiro ratificou o Pacto de São José da Costa Rica, que limita a prisão civil por dívida ao descumprimento inescusável de prestação alimentar;
c) Com a introdução do referido Pacto no ordenamento jurídico brasileiro, com o status supra legal, as normas legais definidoras da detenção do depositário infiel restaram invalidadas;
d) Por fim, com a inexistência de leis regulamentadoras visando à eficácia do preceito do art. 5º, LXVII da CR/88, a norma torna-se inaplicável.
Cabe ressaltar que, recentemente o Supremo Tribunal Federal editou a Súmula Vinculante nº 25: “É ilícita a prisão civil de depositário infiel, qualquer que seja a modalidade do depósito”.
Desta modo, conclui-se que o Tratado Internacional de Direitos Humanos invalidou a prisão do depositário infiel. Porém, as normas referentes a matéria continuam com sua vigência, mas inaplicáveis. Com efeito, dentro da sistemática da Constituição Federal, nenhuma norma poderá ser declarada inconstitucional, somente perder a sua validade, podendo deixar de existir mediante emenda constitucional que derrogue sua normatividade.
Na edição desta Súmula Vinculante, foram citadas as seguintes referências legislativas:
a) a Constituição Federal (art. 5º, § 2º);
b) a Convenção Americana sobre Direitos Humanos (Pacto de San José da Costa Rica), art. 7º, § 7º; e
c) o Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos (art. 11).
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