Resenha do Documentário “A Liga- Trabalho Escravo”
Por: Ludmila Silvestre • 28/5/2023 • Trabalho acadêmico • 1.959 Palavras (8 Páginas) • 81 Visualizações
Resenha do Documentário “A Liga- Trabalho Escravo”
O direito do trabalho é resultado de uma conquista humana proveniente da luta por melhores condições trabalhistas, a fim de resguardar a dignidade da pessoa humana, o valor social do trabalho e a vedação à discriminação, bem como de buscar a igualdade substancial do hipossuficiente por meio de uma efetiva proteção. Poderíamos renunciar a legislação trabalhista em nome de um equilíbrio? Negociar com o empregador, ou é imprescindível que se tenha diretrizes básicas?
A Constituição Federal de 1988, em seu artigo 7º, caput, dispõe: “São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social”. Quando falamos que o direito do trabalho é um direito constitucional, onde há a necessidade de reequilibrar a situação de que o empregado é o hipossuficiente da relação, o vulnerável, dependente do seu empregador, prova o porquê o Estado deve fazer uma intervenção mínima, necessária, bem como a importância do art. 7º da CF, toda vez que temos uma relação de trabalho.
Se tenho um artigo na CF que está preocupado com a melhoria social, me parece lógico que o direito do trabalho é um direito que afeta toda a sociedade, seja direta ou indiretamente. A Constituição retira a legislação trabalhista da natureza jurídica privada pura para uma natureza jurídica privada social, pois se refletirmos, não temos a autonomia da vontade livre no direito do trabalho. Não posso contratar alguém que está há muito tempo sem trabalhar, mas deixá-lo três anos sem férias, por exemplo. O trabalhador poderia aceitar essa proposta, mas como empregadora exerceria uma ilegalidade. O direito do trabalho é norma de ordem pública e não pode ser negociado; tem proteção na lei.
Dignidade da pessoa humana, desenvolvimento nacional, o bem-estar de todos de forma equânime, erradicação da pobreza e direitos sociais como a educação, o trabalho, a previdência social, entre outros que visem a melhoria de sua condição social, são direitos defendidos por nossa CF/1988 nos artigos 1º ao 7º. No entanto, em um mundo capitalista como o nosso sabemos que as coisas não acontecem desta maneira, pelo menos não em todos os lugares ou não para todos. Quando temos artigos como esses citados e vemos um documentário como o apresentado “A Liga- Trabalho escravo”, é nítida a discrepância entre empregado e empregador, trazendo diversos episódios em que pessoas foram encontradas em trabalho análogos à escravidão (com base no art. 149 do CP), nos quais o trabalho era exaustivo e as pessoas viviam em situação degradante, inclusive na própria Capital de São Paulo, uma triste realidade ao nosso lado.
Há uma importância social usarmos um produto feito com a exploração do trabalho escravo. Mostra um desenvolvimento sem a intervenção do Estado, que deveria intervir para que existisse um equilíbrio. O artigo 1º, III, CF/88, nos fala sobre a dignidade da pessoa humana, um valor único e individual, o qual não pode ser sacrificado por interesses coletivos. Da mesma maneira, o inciso IV do mesmo artigo versa sobre os valores sociais do trabalho e da livre-iniciativa, o que significa dizer que a relação entre empregado e empregador deve ser harmoniosa a fim de criarem uma economia de mercado que seja saudável e estável.
Esta harmonia é desfeita quando, ao chegar no local de trabalho, o trabalhador se depara com condições inferiores, impossibilitando-o de realizar a tarefa para a qual foi designado, com qualidade e segurança. Isto se agrava ainda mais quando o trabalhador não tem a possibilidade de voltar para casa pois, antes mesmo de começar a trabalhar, contrai uma dívida a qual não consegue pagar, por conta da alimentação e equipamentos necessários para a realização do trabalho que são comprados e descontados antecipadamente do dinheiro que deveria receber. Conclusão, estão sempre devendo e o que ganham nunca é o suficiente para saldarem esta dívida e retornarem as suas casas.
Só a fiscalização não impede que o trabalhador em um estado de necessidade retorne ao trabalho escravo. Como exemplo do documentário, na carvoaria em Goianésia do Pará, vemos trabalhadores relatando que precisam trabalhar, mesmo que tenham que comprar suas ferramentas e equipamentos de proteção que deveriam ser fornecidas pelo empregador, e mesmo que o não uso das EPI’s coloque suas vidas em risco. O empregado aceita viver em condições sem o mínimo necessário muitas vezes pela necessidade excessiva que sempre enfrentou, vindo muitas vezes de famílias que já não possuíam o mínimo necessário, como condições básicas de higiene, alimentação e educação, e assim, quando são chamados a trabalhar em outras cidades, aceitam com a esperança de uma vida melhor e ao chegar e perceber que foram ludibriados aceitam mesmo assim, pois não conhecem uma oportunidade melhor e os direitos que possuem.
O trabalho escravo moderno tem relação direta com a dignidade da pessoa. Este empregado é transformado em objeto de trabalho em um ambiente degradante e jornadas exaustivas. Vemos a exploração na carvoaria, produção de gado bovino, na soja, no algodão, café, frutas, retirada de madeira, na construção civil, pequenas tecelagens, na exploração sexual, dentre outras atividades. Dentre os vários fatos demonstrados no documentário, constata-se o trabalho análogo ao de escravo na Empreiteira Irmãos Moura, que contratou 40 homens trazidos de Pernambuco para trabalhar na construção de uma escola estadual em Hortolâdia- SP; na Carvoaria em Goianésia do Pará e os vários endereços em SP das oficinas prestadoras de serviço para a Empresa Zara, com empregados bolivianos que fugiram da realidade miserável de seu País para viver a exploração no Brasil. Na época do documentário, foi dito que a Zara estava explorando a atividade fim. Na realidade não poderiam nem terceirizar essa atividade já que havia a Súmula 331 do TST, que fazia distinção entre a atividade meio e atividade fim para que se pudesse terceirizar o serviço. A Zara foi pega na terceirização e sofreu o efeito ricochete (“quarteirização”).
Esta Súmula vedava a atividade fim como atividade a ser terceirizada, e foi utilizada neste caso para responsabilizar aquele que diretamente era responsável pela prestação do serviço. Na busca pela não precarização da mão de obra, o TST decidiu que quando você transfere a mão de obra para terceiros, só poderia transferir a atividade meio e não a fim. A atividade meio é aquele que não é correlata diretamente com sua razão social. Se a Zara é indústria e comercio, ela não pode terceirizar a indústria (fabricação) e o comércio (parte de vendas). Sua atividade fim é fabricar e vender. Poderia terceirizar o transporte, a contabilidade, a limpeza, segurança.
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